À procura de 9000 agulhas no palheiro do CERN
Uma equipa de 60 engenheiros tem pela frente quatro anos de trabalho para identificar e remover 9000 cabos obsoletos que põem em risco o maior e mais importante acelerador de partículas do mundo, o LHC.
Imagine uma mochila com um emaranhado de fios de carregadores de telemóvel e fios de auscultadores. Uma auto-estrada de cabos de computador e de periféricos debaixo de uma secretária. Um móvel na sala que esconde uma montanha russa de fios da televisão, da box do cabo, do router, do leitor de DVDs e do que mais houver. Instantes da vida contemporânea. Agora imagine ter não dez, mas 9000 cabos entrelaçados entre outros tantos milhares, e ter de os identificar, desconectar e remover um a um. Tornemos o desafio mais interessante: remover o cabo errado não desligará a impressora ou o candeeiro, mas poderá danificar aquilo que é simultaneamente a maior máquina do mundo e um dos mais caros aparelhos científicos alguma vez construídos.
Este não é um desafio teórico. Durante os próximos quatro anos, no subsolo da fronteira franco-suíça, nos arredores de Genebra, 60 pessoas estarão a trabalhar para resolver este quebra-cabeças. Segundo noticia a Vice, uma equipa de engenheiros está a fazer o levantamento de todos os cabos obsoletos que há anos repousam no interior do Large Hadron Collider (LHC), o gigantesco acelerador do Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN). Esta máquina, recorde-se, serve para testar diferentes teorias no campo da Física, possibilitando descobertas com uma grande amplitude de aplicações.
Em causa estão então cerca de 9000 cabos, cada um medindo em média 50 metros de comprimento, num total de 450 quilómetros. Na origem do problema, algum desleixo. Nas sucessivas intervenções técnicas de que o LHC foi objecto ao longo dos anos, os fios inutilizados não foram sendo removidos. A estes juntaram-se cada vez mais novos cabos. A questão é que já não sobra espaço para introduzir novos fios, o que impossibilita futuras e incontornáveis actualizações do sistema.
“É claro que, num mundo ideal, teríamos removido os cabos velhos e obsoletos antes de instalar os novos. Mas não foi isso que aconteceu”, contou à Vice Sébastien Evrard, o engenheiro-chefe do projecto. Agora, perante o diabólico emaranhado, os técnicos terão de identificar cada cabo, desactivar os obsoletos e removê-los cuidadosamente.
“Qualquer erro pode gerar problemas graves ao reiniciar o acelerador”, adverte Evrard. Remover um cabo incorrecto comportaria consequências desde a perda de dados até à completa paralisação do acelerador de partículas. Para tal, a equipa vai ter de cruzar uma base de dados, que teoricamente identifica cada cabo mas na qual já foram detectadas lacunas, com observações no local.
Se quatro anos parece ser tempo suficiente para a tarefa, a verdade é que o trabalho terá de ser feito em poucos meses. Neste momento, a equipa opera nos túneis do LHC enquanto o acelerador de partículas se encontra na sua pausa técnica anual, que ocorre durante cerca de dois meses a cada Inverno. Até ao momento, foram identificados 3000 dos 9000 cabos e desactivados 2700 destes. A efectiva remoção só poderá ser iniciada no próximo Inverno. O prazo da empreitada é 2020, altura em que o LHC reiniciará após uma suspensão mais longa.
O trabalho é então difícil, demorado e “nada sexy”, como admitiu Evrard à Vice, a quem revelou que um dos principais desafios é manter a equipa motivada.