Encontro em Islamabad dá novo fôlego a negociações entre Afeganistão e taliban

Nunca os islamistas estiveram tão poderosos e controlaram tanto terreno no país desde a invasão americana de 2001. Plano de negociações será acertado dentro de uma semana.

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Polícia investiga local de um atentado taliban em Cabul. Farshad Usyan/AFP

Representantes do Afeganistão e três outros países começaram nesta segunda-feira um novo projecto de negociações de paz com os taliban, meio ano depois de o grupo insurgente islamista ter interrompido os encontros de cessar-fogo com Cabul. No final de um encontro em Islamabad em que participaram os governos do Paquistão, Estados Unidos e China, os quatro países anunciaram estarem de acordo com a “necessidade imediata de negociações directas entre o Governo do Afeganistão e representantes dos grupos taliban para um processo de paz que preserve a unidade do país”.

Os participantes agendaram um novo encontro para a próxima segunda-feira, onde será discutida uma agenda de negociações com os insurgentes. O avanço é simbólico, embora crucial num processo praticamente estagnado desde o seu início, em 2013. A última interrupção aconteceu em Julho. Os taliban anunciaram então a morte do seu fundador e guia espiritual, mullah Omar, entraram em disputas internas e afastaram-se do projecto de paz depois de um único encontro directo com o Governo afegão. 

O grupo está hoje mais forte do que em qualquer outro momento desde a invasão norte-americana de 2001. No último ano – grande parte das tropas da NATO saíram do país em 2014 –, conquistou vários territórios no Sul e ocupou por alguns dias a grande cidade de Kunduz, no Norte. O número de atentados e ataques em todo o país cresceu substancialmente, fazendo de 2015 o ano mais sangrento desde a ocupação estrangeira.  

Estados Unidos e China observaram negociações passadas. O seu papel é sobretudo o de fazer a ponte entre Afeganistão e Paquistão, os únicos com a chave de um possível cessar-fogo. Os dois vizinhos têm uma relação tumultuosa: os afegãos acusam os paquistaneses de não fazerem o suficiente para travar os islamistas e, do outro lado, Islamabad desconfia das crescentes ligações entre Cabul e a sua rival Índia. Representantes afegãos diziam antes do encontro desta segunda-feira que esperavam uma lista elaborada pelo Paquistão dos taliban dispostos a negociar.   

Acredita-se que os líderes do grupo vivem no Paquistão sob protecção do Governo, que há anos o tem usado como uma força satélite no seu confronto com a Índia. Islamabad nega-o, embora tenha persistentemente agido como interlocutor dos islamistas e usado a sua influência para conduzir negociações passadas.

Como explica o correspondente da BBC na capital paquistanesa, Mohammad Ilyas Khan: “A questão sobre se os taliban ficarão satisfeitos com o que Cabul tem para lhes oferecer pode depender em muito do quão satisfeito estará o Paquistão com o rumo das conversas”, escreve. E o que quer Islamabad? “Gostaria que os participantes reduzissem o impacto de elementos antipaquistaneses em Cabul e de persuadir o Governo afegão a ser menos entusiástico na sua relação com a Índia.”

Mas é mais fácil calcular os interesses velados dos paquistaneses do que antecipar a postura dos taliban. O grupo está fracturado desde que foi anunciada a morte do mullah Omar – figura unificadora que, na verdade, morreu dois anos antes de o grupo o ter revelado em Julho. A facção mais poderosa, comandada por Akhtar Mansour, fez saber na semana passada que está a ponderar aceitar negociações, mas o mesmo não acontece com o grupo de dissidentes taliban liderados por Mohammad Rasool. Estes exigem que um cessar-fogo seja apenas negociado entre afegãos, sem interferência de agentes estrangeiros.

Por enquanto, o Governo afegão diz ter abertura total para um cessar-fogo com os taliban. De acordo com as palavras do conselheiro do primeiro-ministro para os Negócios Estrangeiros, ao introduzir o encontro desta segunda-feira, o objectivo é para já trazer os guerrilheiros islamistas à mesa de negociações. “É por isso importante não se exigirem pré-condições no início do processo de negociações. Argumentamos que isso seria contra-produtivo”, afirmou Sartaj Aziz, citado pela Reuters.

As negociações de paz com os taliban sofreram altos e baixos ao longo dos anos, mesmo depois de a Administração de Barack Obama ter admitido que a guerra civil não poderia ser vencida militarmente e de ter apoiado um entendimento com os islamistas. A administração do Presidente Ashraf Ghani avançou mais do que a do seu antecessor, mas a quebra nas negociações durante o Verão fez o relógio andar para trás. O grupo insiste, entre outras coisas, em integrar um Governo de unidade nacional e em fazer uma reforma constitucional que designe a sharia como inspiração para as leis afegãs. 

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