Morreu Hilla Becher, o olhar mais intransigente e doce da fotografia

Hilla morreu oito anos após o marido, com quem trabalhou ao longo de 50 anos.

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A artista em frente às fotografias que tirou com o seu marido AFP/HENNING KAISER

Com o marido, Berndt, com quem trabalhava em dupla, tornou-se numa referência maior da arte e da fotografia contemporânea internacional, gigantes que cunharam um estilo: a “escola Becher”. Hilla Becher (1934-2015) morreu no sábado aos 81 anos, confirmou esta terça-feira a sua editora, a Schirmer/Mosel.  

Depósitos de água, tanques de gás, passadeiras de areia, altos-fornos, moinhos, armazéns, fábricas, elevadores e torres de carvão, silos, refeitórios, fornos de cal, tudo quase sempre fotografado a preto-e-branco nas perspectivas frontais através das quais acreditavam que se revelava a verdade maior de um sujeito: ao longo de 50 anos Bernd e Hilla Becher fotografaram juntos – desde que em 1957 se conheceram como estudantes de arte.

Juntos, escolheram uma vida seminómada sempre em busca de formas, materiais e construções condenados à extinção, primeiro na Alemanha e em vários países da Europa Central, e, depois, nos Estados Unidos.

Precisamente, foi depois de começarem a trabalhar nos Estados Unidos, e de no arranque da década de 1970 lá terem lançado livro Anonyme Skulpturen, que afirmaram o seu nome e uma linguagem que nomes como Candida Höfer, Thomas Ruff, Thomas Struth e Andreas Gursky reinterpretariam, dando continuidade.

Bernd explicaria que desenvolveram “uma espécie de ideologia sem nunca a formular como tal”: “O que fizemos foi documentar as construções sagradas do calvinismo. O calvinismo rejeita todas as formas de arte e, por isso, nunca desenvolveu a sua própria arquitectura. Os edifícios que fotografamos estão directamente ligados a este pensamento puramente económico."

Sem assinatura individual, o casal cumpriu um grande programa de arqueologia visual industrial. Minimalista e conceptual, inspirado nos trabalhos de aproximação sistemática e pseudocientífica dos anos 1920 e 1930 de Karl Blossfeldt, Albert Renger-Patzsch e Angust Sander, um movimento que ficou conhecido como Novo Objectivismo, Bernd e Hilla Becher fizeram cerca de 16 mil fotografias que foram apresentando normalmente em grupos de 6, 9 ou 12 imagens. Sempre o mesmo protocolo: dias cinzentos, vistas frontais, sujeito ao centro do campo, preto-e-branco neutro.

“Hilla Becher era uma pessoa notavelmente incorruptível”, disse Thomas Struth à Time. Acrescentando: “Eu adorava a sua atitude intransigente mas aberta e delicada, sempre curiosa, não sentimental, mas amorosa. A sua morte é uma grande perda.”

Em 2002 Hilla Becher ganhou o Prémio Erasmus pelo seu papel fundamental na criação do departamento de Fotografia da Kunstakademia de Dusseldorf, onde deu aulas com o marido. Em 2014, sete anos após a morte de Bernd, ganhou também o Grande Prémio da fundação Sparkasse. Os Becher participaram nas Documenta 5, 6, 7 e 11, e tiveram grande exposições e estão representados nas colecções dos mais importantes museus dos mundo, entre os quais o Institute of Contemporary Arts, em Londres, o Stedelijk Museum, em Eindhoven, o Pompidou, em Paris, e o MoMA, o Metropolitan e o Guggenheim, em Nova Iorque, entre muitos outros.

Em Portugal, Bernd e Hilla Becher estão representados na colecção do Museu de Serralves, na Colecção Berardo e em duas grandes colecções hoje com destinos incertos: a colecção de fotografia do Banco Espírito Santo e na colecção de arte da Fundação Ellipse. 

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