Concessionar à pressa e antes das eleições
O Governo quer apresentar a subconcessão da STCP e do Metro como um facto consumado
O Governo resolveu entregar aos privados a exploração dos transportes públicos nas duas maiores cidades do país e, como tal, lançou concursos internacionais. Em Lisboa, a Carris e o Metro foram para o grupo espanhol Avanza, e no Porto o feliz contemplado foi um consórcio catalão. Só que, no Norte, o processo nasceu torto e mais torto vai terminar. Depois de quatro meses de concurso, e de modificações substanciais no caderno de encargos para dar resposta a críticas de interessados, apenas dois candidatos entregaram propostas para ficar com a gestão da STCP e Metro do Porto. No entanto, um deles acabou por ser excluído por entregar a proposta fora do prazo, e o outro andou meses e meses a negociar e não entregou uma das garantias bancárias a que estava obrigado, levando ao cancelamento de toda a operação, já este mês.
Nessa altura, o secretário de Estado dos transportes garantia que, se os contratos não fossem assinados, teria "de ser lançado novo concurso público”. A surpresa aconteceu quando o Governo, em vez de um novo concurso público, resolveu avançar com um ajuste directo para entregar as duas empresas a privados. Sérgio Monteiro veio assim justificar a opção pelo ajuste directo: “Estamos a falar de um procedimento que é igual ao concurso público internacional em tudo, excepto no prazo para apresentação de propostas, que é de 12 dias.”
A ver se nos entendemos: o Governo vai fazer um concurso igual ao primeiro, que foi um fracasso total, só que, desta vez, em vez de 50 dias, o concurso (que não é concurso) durará pouco mais do que uma semana?
Esta opção do Governo levanta várias dúvidas. Ao acelerar o calendário percebe-se que o objectivo é apresentar ao próximo governo as concessões como um facto consumado. A mesma táctica de resto usada na privatização da TAP. E é bom lembrar que estamos a um mês das eleições. A opção pelo ajuste directo é menos transparente. Como dizia o presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia, “ninguém compreende que para um restaurante de praia tenha de ser lançado um concurso público internacional e para a concessão de duas empresas desta dimensão e importância se faça um ajuste directo em 12 dias”.
O Governo argumenta que este novo concurso (que não é concurso) vai correr melhor do que o primeiro, já que as concessões de Lisboa já foram adjudicadas, o que fará com que mais candidatos possam apresentar uma proposta firme. Mas é bom não esquecer que mesmo em Lisboa, além da Avanza, só quatro foram a jogo. E o argumento de que a concessão tem de avançar a qualquer custo porque é um compromisso assumido com a troika não tem cabimento. Primeiro, porque há muita coisa que foi combinada com a troika que ficou por fazer e que não está a preocupar minimamente o Governo (extinção de autarquias, fim do IMT, etc.). Depois, a troika não vai querer, com certeza, que se faça uma concessão à pressa, com o risco de não acautelar devidamente o interesse público, só porque o mandato do Governo está a chegar ao fim.