PSD, CDS e PS apertam regime de acesso a dados de comunicações pelas "secretas"
Quanto ao registo de interesses de dirigentes das "secretas", acordo entre maioria e socialistas prevê que directores do SIS, do SIED, secretário-geral do SIRP e seu adjunto passem a entregar o registo de interesses na Comissão de Fiscalização do SIRP, como previa diploma do PS.
Esta posição comum às três maiores bancadas foi apresentada em detalhe pelo deputado socialista Jorge Lacão em reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, depois de a proposta do Governo ter merecido pareceres negativos da Comissão Nacional de Protecção de Dados e do Conselho Superior de Magistratura por eventual violação de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Apesar das alterações acordadas, Jorge Lacão mostrou-se favorável a que, após a aprovação do diploma do Governo em votação final global no parlamento, em última instância seja o Tribunal Constitucional a dirimir a questão. Em causa está o respeito pela Constituição da República no que toca à possibilidade de os serviços de informações acederam a dados de tráfego ou de localização de cidadãos suspeitos de envolvimento em terrorismo, crimes de segurança contra o Estado ou alta criminalidade organizada.
O presidente do Grupo Parlamentar do PCP, João Oliveira, manifestou-se frontalmente contra o diploma, considerando que ficara provado que "os acordos PSD, PS e CDS fazem muito mal à democracia portuguesa".
João Oliveira disse que os serviços de informações, caso a proposta do Governo passe no crivo da constitucionalidade – que se espera que venha a ser suscitada pelo Presidente da República – permitirá aos agentes das "secretas" aquilo que ainda se nega à investigação criminal.
O presidente da bancada comunista acusou ainda o PS de desrespeitar a sua posição histórica contrária "à devassa" da vida dos cidadãos por parte de serviços de informações, o que motivou uma dura reacção de Jorge Lacão contra as palavras de João Oliveira.
Na reunião, o ex-ministro socialista enunciou um conjunto de alterações agora acordadas com a maioria PSD/CDS em relação à proposta do Governo, tendo em vista "reforçar as garantias" de respeito pelos direitos e liberdades dos cidadãos.
Assim, nas alterações agora aprovadas, a proposta de lei "baliza" e "especifica objectivamente" que o acesso a dados de tráfego das comunicações ou de localização pelas "secretas" só pode acontecer em matérias relacionadas com terrorismo ou segurança do Estado.
Outros "aperfeiçoamentos", segundo Jorge Lacão, passam pelo facto de a comissão de controlo prévio para possível acesso a dados de comunicações, ou de localização de suspeitos, ser constituída por três juízes do Supremo Tribunal de Justiça.
"Propomos que o acesso só se possa fazer a metadados de pessoas efectivamente envolvidas no âmbito do pedido", ou seja, suspeitas de terrorismo, e nunca em relação a terceiros que com elas eventualmente contactem, frisou o ex-ministro socialista.
Na sua intervenção, Jorge Lacão referiu-se ainda a uma outra alteração no sentido de impedir que haja qualquer prorrogação do prazo de acesso a metadados sem qualquer autorização por parte da comissão de controlo prévio constituída pelos três juízes do Supremo Tribunal de Justiça.
"Os três juízes podem também solicitar à Comissão de Fiscalização de Dados a destruição de dados considerados não justificados. No acesso a metadados, os serviços de informação serão fiscalizados pela comissão de controlo prévio, pelo Conselho de Fiscalização de Dados (com três magistrados do Ministério Público) e pelo Conselho de Fiscalização do SIRP", frisou o ex-ministro dos Assuntos Parlamentares.
Obediências maçónicas
Quanto ao registo de interesses dos dirigentes das "secretas", PSD, PS e CDS chegam a acordo, tendo prevalecido a linha mais reservada defendida pelos socialistas e pelo secretário-geral do Sistema de Informação República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira.
A posição comum foi transmitida pelo deputado do PS Jorge Lacão na mesma reunião e mereceu aberta discordância do líder parlamentar do PCP, João Oliveira.
Na sequência do acordo, os directores do Serviço de Informação e Segurança (SIS), do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), o secretário-geral do SIRP e o seu adjunto passam a entregar o seu registo de interesses na Comissão de Fiscalização do SIRP, tal como estava previsto no diploma dos socialistas.
O projecto da maioria PSD/CDS, pelo contrário, previa que o registo de interesses dos dirigentes máximos das "secretas" pudesse ter um carácter público.
A vice-presidente do PSD Teresa Leal Coelho referiu que, em nome do consenso numa matéria de soberania, a maioria que suporta o Governo aceitou limitar o acesso aos registos de interesses aos membros do Conselho de Fiscalização do SIRP.
No registo de interesses, os dirigentes dos serviços de informações são obrigados a esclarecer a que entidades se encontram ligados, designadamente obediências maçónicas.
Em relação a este tema, a maioria PSD/CDS não cedeu ao PS na possibilidade de o registo de interesses dos membros do Conselho de Fiscalização do SIRP (órgão eleito pela Assembleia da República) ficarem depositados com reserva no parlamento, tendo antes prevalecido a tese de que são tão públicos como os dos titulares de cargos políticos.
Apesar disso, Jorge Lacão fez questão de frisar que, mesmo assim, em votação final global, o PS votará a favor do diploma sobre registo de interesses.
Jorge Lacão preferiu antes salientar que, na sequência do acordo com a maioria PSD/CDS, fica consagrado um regime que "garante a protecção dos dirigentes dos serviços de informações, não os fragilizando no exercício das suas funções".
Neste ponto, o secretário-geral do SIRP enviara um parecer à Comissão de Assuntos Constitucionais em que manifestava preocupação face à possibilidade de o registo de interesses dos dirigentes das "secretas" ter um carácter público, tal como previa inicialmente o diploma da maioria PSD/CDS.
Júlio Pereira invocou mesmo riscos de segurança caso a carreira profissional de um dirigente de um serviço de informação fosse detalhada e de acesso generalizado. Mas a solução agora consensualizada entre a maioria PSD/CDS e PS parece dar resposta às suas preocupações.