Paris vai voltar a ter um arranha-céus entre muros
A Câmara de Paris aprovou esta semana a construção da Torre Triângulo, projecto dos arquitectos suíços Herzog & de Meuron para a Porta de Versalhes. Vai ser o terceiro edifício mais alto na cidade.
Passadas mais de quatro décadas, a capital francesa vai, no entanto, voltar a ter novos arranha-céus entre muros, dentro do perímetro definido pelo Périphérique. É que a Câmara de Paris votou, esta terça-feira, a autorização à mudança das disposições urbanísticas (equivalentes aos nossos PDM) que desde a Torre Montparnasse proíbem a construção de edifícios com mais de 37 metros de altura. O pretexto para a alteração legislativa é a anunciada construção da Torre Triângulo (também designada Torre Pirâmide), um projecto que os arquitectos suíços Herzog & de Meuron fizeram para um novo parque de exposições junto à Porta de Versalhes, a sudoeste da cidade, um empreendimento do consórcio Unibail.Rodamco orçado em mil milhões de euros.
Com uma altura anunciada de 180 metros, e meia centena de andares, o novo arranha-céus tem estado, desde 2008, ano em que foi anunciado, no centro de uma polémica que nos últimos tempos ganhou relevantes contornos políticos.
É verdade que Paris está já rodeada de vários arranha-céus fora do anel do Périphérique — e não falamos aqui de La Défense, a cidade futurista construída a oeste da cidade no prolongamento da Avenida dos Campos Elísios, e cuja torre mais alta, designada First, atinge os 231 metros. Mas não deixa de ser surpreendente que uma grande capital mundial tivesse resistido durante tanto tempo ao apelo da construção em altura e aos projectos, tanto dos investidores como dos próprios arquitectos.
Em Novembro do ano passado, quando esteve no Porto, o arquitecto francês Jean Nouvel (Prémio Pritzker 2008, autor do Instituto do Mundo Árabe e do Museu Quai Branly, e que actualmente tem também um projecto para dois arranha-céus dentro de Paris) criticava esta uniformização arquitectónica. “Em França, porque se gosta muito da guilhotina, cortam-se os edifícios todos pela mesma altura”, gracejou na altura, em entrevista ao PÚBLICO.
No caso de Paris, a “guilhotina” actuava aos 37 metros de altura. Vai deixar de ser assim, e, para além da Torre Triângulo, há já mais meia dúzia de outros arranha-céus projectados para a cidade. Mas a decisão da câmara não foi isenta de polémica, e as ondas de choque ainda se irão fazer sentir durante algum tempo, também no plano político.
É que a votação desta terça-feira veio contradizer aquela que, sobre o mesmo dossier, fora feita há bem pouco tempo, em Novembro do ano passado. Então, a líder da oposição na autarquia, Nathalie Kozsciusko-Morizet — que em Março de 2014 tinha perdido as eleições para a Câmara de Paris para a socialista Anne Hidalgo —, tinha feito da votação do projecto uma causa política e também pessoal. E na votação realizada a 17 de Novembro, o "Não" venceu por uma diferença de cinco votos.
Na passada terça-feira, a líder d’Os Republicanos (o novo nome que Nicolas Sarkozy deu à antiga UMP – União para um Movimento Popular) viu inverter-se a situação: o "Sim" venceu com um vantagem de 13 votos, e entre os deputados do Conselho que mudaram de opinião, seis são do seu partido — entre eles estando figuras com o peso político de Rachida Dati, por exemplo, que foi ministra da Justiça no Governo de François Fillon.
Defensora do projecto desde os tempos em que era vereadora do Urbanismo e Arquitectura no consulado de Bertrand Delanoë, a actual presidente, Anne Hidalgo, classificou a decisão como “o epílogo feliz do que é um grande projecto para Paris”.
Mas a polémica em volta da construção do projecto de Herzog & de Meuron vai certamente continuar. Em comunicado difundido no próprio dia da votação, o designado Colectivo Contra a Torre Triângulo lamenta e critica a decisão do Conselho de Paris. “A seis meses da Conferência sobre o Clima COP21, que terá lugar em Paris, é um sinal nefasto, que mostra que o executivo não pensa no futuro da cidade”. “A Paris do futuro não pode ser construída usando as receitas do passado. Tem de inovar e inventar novas formas urbanas para o século XXI e não insistir em projectos inúteis”, acrescenta o movimento, prometendo contestar a autorização de construção não só pela via administrativa como junto da Comissão Europeia.
No meio desta polémica toda, o projecto dos dois arquitectos suíços (prémios Pritzker 2001 e autores de obras tão notórias como os estádios Allianz Arena, em Munique, e Ninho de Pássaro, em Pequim, ou a renovação da Tate Modern, em Londres) parece ser o que está menos em causa. É verdade que no debate que precedeu as duas votações no Conselho de Paris — como no debate público que tem acompanhado o processo — houve quem agitasse as consequências ambientais e o impacte no quotidiano dos habitantes do 15.º bairro. E houve quem, simplesmente, não gostasse de ver esse “naco de queijo” — uma referência ao edifício de forma triangular desenhado por Herzog & de Meuron — a ensombrar “uma das rara cidades horizontais preservadas no mundo”, como a certa altura criticou mesmo o subdirector-geral da Unesco, Francesco Bandarin.
Mas os arquitectos e os promotores, que no decorrer do processo procederam a várias alterações no projecto em respostas às questões e críticas que iam sendo apresentadas, garantem que a sua forma e a utilização maioritária do vidro irão não só ter um impacto diminuto — por exemplo, ao nível da sombra — no lugar, como ajudar a revitalizar uma área que, para além de novos escritórios, salas de congressos, lojas comerciais, restaurantes e terraços, também passará a ter um jardim público com cerca de 8000 m2.
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