Bestial

Segundo volume da “anti-enciclopédia” de Rui Eduardo Paes, compilação de reflexões sobre músicas e músicos

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Rui Eduardo Paes atira-se mais ao jazz e à música improvisada mas há outras visitas neste livro: Lady Gaga, por exemplo ALEX DOMANSKI/REUTERS

Com uma grande actividade na escrita sobre música ao longo dos últimos 30 anos, entre o jornalismo, a crítica e a reflexão ensaística, Rui Eduardo Paes voltou recentemente a publicar com regularidade. Bestiário Ilustríssimo (2012) marcou o regresso do seu nome aos escaparates livreiros, regresso esse continuado com a publicação de A Maiúsculo com Círculo à Volta (2013).

Este novo Bestiário Ilustríssimo II funciona como continuação ao primeiro volume e, tal como o primeiro, volta a reunir textos que reflectem sobre músicas diversas a partir de perspectivas originais, como uma “anti-enciclopédia” (assim o autor classifica o seu livro). Embora espalhada de forma algo livre e desarrumada, a informação está lá e o livro, ainda de forma anárquica, acaba por assumir a tal função enciclopédica — nomeadamente para alguns músicos das franjas menos expostas, que poucas vezes terão sido analisados de forma tão esmiuçada.

Eduardo Paes reflecte sobre as músicas, os músicos e os estilos musicais, fazendo múltiplas ligações e cruzando disciplinas, ao longo de 50 capítulos. Contudo, o capítulo final, Bala, não é apenas o último e o maior; funciona como livro autónomo, com vida própria, onde se incluem 50 micro-textos.

Sem fechar portas a géneros, numa vasta amplitude estilística, Paes acaba por dar grande destaque às músicas improvisadas e no jazz contemporâneo. Os músicos e os géneros abordados são, de forma geral, muito diversos, mas há alguns com maior destaque: os novos pianistas da cena jazz contemporânea (Jason Moran, Vijay Iyer, Craig Taborn); o (ainda pouco conhecido) jazz galego; e a inevitável ênfase em alguns músicos portugueses. Apesar dessa maior atenção ao jazz e à improvisação, o livro abre-se a outros mundos sonoros: há um surpreendente texto sobre Lady Gaga e um capítulo denominado Stoner rock: guia prático para janados (título auto-explicativo).

A escrita de Rui Eduardo Paes poderá parecer difícil, por ser profícua em referências e ligações. Na verdade é de absorção fácil, pela forma simples como o autor sabe transmitir as ideias, explanando-as de forma directa, sem se deslumbrar com artifícios literários. Não há artimanhas de estilo, a essência está nas ideias, é aí que vale a sua grandeza. A escrita complementa-se com as ilustrações ricas de Joana Pires (no Bestiário) e David de Campos (em Bala).

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