Sem omissões nem histerias

A quebra demográfica é uma realidade e por isso mesmo está na agenda da campanha eleitoral.

As razões da diminuição demográfica têm factores múltiplos. Destacam-se a diminuição da natalidade, a diminuição da imigração e o aumento da emigração. De acordo com os mesmos dados do INE, a quebra na população em 2014 foi de 0,5%, fruto de dois saldos negativos: o saldo natural, que se traduz em mais 22.423 mortes do que nascimentos, e o saldo migratório, que aponta para mais 30.056 emigrantes do que imigrantes, e que é negativo pelo quarto ano consecutivo.

Em declarações ao PÚBLICO, a presidente da Associação Portuguesa da Demografia, alertava para a “rapidez” do fenómeno: “São valores muito significativos numa população de 10 milhões de pessoas. É muitíssimo, num período tão curto e para uma população tão pequena.” A mesma especialista salientava que “a crise económica e financeira acelerou” a quebra demográfica precisamente pela baixa da natalidade, “que desde 2010 foi muito acentuada”, mas também pela “incapacidade de Portugal captar mais imigrantes” e parar a saída de emigrantes. E confessava ao PÚBLICO: "Não tínhamos projectado uma redução tão grande.”

De acordo com as projecções feitas pelo INE em 2013, no ano de 2060 a redução da população pode oscilar entre 6,3 milhões de pessoas — com a estimativa de que para 100 jovens haverá 464 idosos e uma população de 8,6 milhões, no caso da natalidade e da imigração recuperarem.

A quebra demográfica é uma realidade e por isso mesmo está na agenda da campanha eleitoral. O PSD tem, aliás, transformado este tema num dos pontos centrais da sua propaganda. Insistindo na aposta de medidas para incentivar a natalidade, tem apostado na vertente desta questão que obedece a um movimento de mais longa duração. Ou seja, a aposta no crescimento populacional só trará resultados anos depois.

É uma aposta geracional. A quebra populacional por baixa natalidade cria erosão na geração afectada, bem como acaba por repercutir-se de forma geométrica na reposição geracional. Daí que, por mais méritos e por mais positivo que possa ser a aposta no crescimento demográfico, através de medidas que supostamente tendem a incentivar a natalidade, o seu resultado nunca surgirá no curto prazo, logo não é comprovável no tempo político de uma legislatura.

O PS também não omite o assunto no seu programa eleitoral. Mas além da aposta de longo prazo na natalidade, os socialistas elegem os dois outros factores demográficos: a emigração e a imigração. Assim, apresenta medidas de enquadramento legal e de apoio à entrada de imigrantes no país, como componente necessária ao desenvolvimento económico. Mas elegeu como bandeira principal, neste domínio, o aumento da emigração em Portugal nos últimos quatro anos em função da crise.

É verdade que a emigração não é um facto novo. Historicamente, os portugueses são um povo de emigrantes. E na história portuguesa há grandes picos de emigração, dos Descobrimentos ao Brasil no século XIX e XX, passando por todo o movimento de colonização do Brasil e a construção do Império na Ásia e em África. Sem esquecer a emigração para a Europa no século XX. O peso da emigração em Portugal é tal que existiam 2,3 milhões de portugueses fora do território nacional. E de acordo com os dados do Observatório da Emigração, em 2013, emigraram 110 mil portugueses e 95 mil em 2012 (PÚBLICO 13/11/2014).

Apesar do histórico de Portugal em relação à emigração como válvula de escape de um país que não encontra espaço e saídas de vida para a sua população, é certo que garantir que os seus habitantes têm lugar para construir um projecto de vida é um objectivo que faz sentido e que deve ser discutido sem omissões nem histerias. Mas é importante também que não se estigmatize a emigração. Até porque é um facto indesmentível que os portugueses que se têm espalhado pela Europa são uma forma actual e possível de inserção de Portugal na Europa e no mundo e contribuem para um intercâmbio que, como noutros momentos do passado, pode ajudar a modernizar o país.

Jornalista

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