Juízes dizem que Ministra da Justiça fez afirmações falsas no Parlamento
Em causa estão declarações feitas sobre o Estatuto dos Juízes e que são consideradas como uma "grave ofensa e desconsideração institucional" para com os magistrados.
Numa carta aberta enviada a Paula Teixeira da Cruz, a que a Lusa teve acesso, a ASJP refere que, na comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, na passada quarta-feira, a ministra procurou "justificar o incumprimento do programa do Governo para 2015, na parte referente ao Estatuto dos Magistrados, atribuindo aos juízes uma proposta remuneratória absolutamente desenquadrada da realidade do nosso país".
"É falso", acrescenta a associação. "O que disse, como o disse e onde o disse, constitui uma grave ofensa aos juízes, uma desconsideração institucional dos juízes em geral e dos titulares dos órgãos mais elevados do sistema judicial", sublinha. Na quarta-feira, a ministra afirmou que "tudo fará" para concluir o processo relativo aos Estatutos das Magistraturas, mas advertiu que é preciso baixar o patamar das "exigências" salariais.
"Farei tudo para concluir o processo, mas não posso concluir o processo se as exigências continuarem nestes patamares. Nem o país perceberia isto", disse Paula Teixeira da Cruz na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Durante a audição, Paula Teixeira da Cruz reconheceu a existência de dificuldades na aprovação dos Estatutos, revelando que na proposta que lhe foi apresentada havia subidas salariais de 3000 para mais de 4000 euros e nalguns casos de 7000 para 9000 euros, sem contar com os diversos subsídios, incluindo de transporte.
Na carta aberta e para "repor" a verdade dos factos, a ASJP acusa a ministra de ter posto em prática a reforma da organização judiciária "antes do tempo", já que "muitos tribunais não tinham, nem têm instalações adequadas e suficientes. A estes problemas, referem, acresce o facto de o sistema informático não estar preparado para a reforma operada, não haver funcionários de justiça suficientes, nem estar aprovada a legislação necessária para que a reforma entrasse em vigor na plenitude.
Ao referir que os juízes assumiram uma postura de colaboração na execução da reforma, a Associação Sindical sublinha que a aprovação do Estatuto dos Magistrados é "indispensável à implementação da reforma". A ASJP lembra que foi criado um grupo de trabalho para a revisão do Estatuto dos Magistrados, que integrou várias personalidades, incluindo o secretário de Estado da Justiça, que iniciou funções a 7 de Maio de 2014 e que entregou o projecto de estatuto a 11 de Dezembro de 2014.
"O alegado atraso na apresentação do projecto, a ter existido, só ao senhor secretário de Estado, que liderava o grupo (...), pode ser imputável, pois, naturalmente, cabia-lhe diligenciar pelo andamento célere dos trabalhos", lê-se na carta enviada à ministra. Acrescenta a associação que o projecto entregue pelo grupo de trabalho não é um projecto de revisão do estatuto remuneratório dos juízes, mas um projecto de revisão global do Estatuto dos Juízes, com modificações profundas "que visam compatibilizá-lo com a nova Lei Orgânica do Sistema Judiciário".
O projecto "reflectia essencialmente a preocupação de reforçar a independência dos juízes" e a "independência judicial (...) tem, também, uma componente remuneratória", acrescenta a carta. Na missiva, a ASJP sublinha ainda desconhecer qual a fonte dos valores apresentados pela ministra na comissão parlamentar, garantindo não serem do projecto apresentado pelo grupo de trabalho integrado pelos juízes.
Para a ASJP, a estrutura remuneratória dos juízes é "anacrónica e incompatível com princípios básicos aplicáveis a qualquer estrutura da carreira pública", além de que a "promoção dos juízes aos tribunais superiores praticamente não tem reflexo na sua remuneração". A Associação desafia, assim, a ministra a divulgar o projecto de proposta de lei do Governo relativa ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, colocando-o em "verdadeira discussão pública, ouvindo os Conselhos Superiores da Magistratura e dos Tribunais Administrativos e Fiscais, a ASJP e os grupos parlamentares".
Desafia ainda a ministra a diligenciar pela aprovação do Estatuto em Conselho de Ministros e a agendar a respectiva proposta de lei para discussão no Parlamento.