Doença mental: um desafio e uma esperança
Quando os comportamentos são mais bizarros, as opiniões irracionais, o humor demasiado depressivo ou há alucinações e explosões afectivas violentas, logo se instala o popular diagnóstico de maluco, tolo, alienado, doido. Os médicos usam outro vocabulário e classificam a doença como depressão, psicose maníaco-depressiva ou doença bipolar, esquizofrenia, demência, etc.
Mas o que há de comum a estes doentes é o facto de, havendo dificuldade de comunicação e compreensão, serem sujeitos a exclusão e marginalização, por causarem desconforto, rejeição ou até repulsa às pessoas sãs. Em outros tempos foram encarcerados e tratados como criminosos ou animais perigosos; mais recentemente, foram relegados para manicómios ou hospitais psiquiátricos. A sua sorte melhorou imenso com a descoberta de medicamentos que alteram as funções cerebrais, os chamados psicofármacos, capazes de actuar sobre a depressão, a mania ou agitação, as alucinações, os processos cognitivos alterados (desde 1950).
Graças a estas novas terapias, foi igualmente possível reforçar a intervenção psicoterapêutica e de reabilitação; a doença mental deixou, em muitas situações, de ser vista como uma maldição irreversível e passou a ser considerada como um padecimento que pode atingir qualquer um e que tem tratamento. Este importante passo no sentido da humanização da doença é, todavia, ainda muito incompleto e o estigma, a exclusão e a desconfiança persistem na opinião pública em percentagem ainda demasiado elevada.
Torna-se por isso premente informar-se e reflectir-se sobre estas doenças e os sofrimentos que acarretam. Um forte estímulo a esta reflexão é o documentário “Doença mental, olhares que fazem a diferença”, realizado por Diogo Morais, sobre guião de Susana Magalhães e produção de António Jácomo (Instituto de Bioética da Universidade Católica Portuguesa e pelo Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes CITAR). Nela depõem vários especialistas, não apenas de Psiquiatria, mas também da Psicologia, da Acção Social, do Direito e da Bioética.
É de facto necessária uma abordagem pluridisciplinar e uma exposição em linguagem simples (embora com base científica) para facultar à sociedade civil uma interpretação da situação e a deliberação que fundamente uma intervenção coerente e respeitadora de direitos humanos inalienáveis, que os doentes mentais também possuem. Questões como a autonomia e a felicidade dos doentes, o seu regime de vida e a institucionalização ou o tratamento ambulatório são abordadas e discutidas neste vídeo, que foi apresentado por Mésicles Helin, Vítor Cotovio e Margarida Cordo no Auditório da Fundação EDP (junto à Casa da Música), no dia 29 de Maio, às 17h. Proponho-lhe que veja, para que ajude no sentido de reconhecermos dignidade a estes doentes e de lhes darmos finalmente os cuidados de saúde que ainda tão incompletamente lhes vão sendo dispensados.
Instituto de Bioética da Universidade Católica Portuguesa, no Porto, e Professor Emérito de Farmacologia e Terapêutica na Faculdade de Medicina. O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico.