Macário Correia acusado de prevaricação de titular de cargo político
Em causa está licenciamento ilegal de moradia em reserva ecológica contra pareceres de responsáveis técnicos da Câmara de Tavira. O social-democrata justificou com a existência de ruínas no terreno que afinal eram só entulho.
Afinal, as ruínas não passavam de entulho e o autarca social-democrata autorizou a construção contra os pareceres desfavoráveis de responsáveis técnicos e urbanísticos do município. Macário Correia, que também não pediu o parecer prévio da Comissão de Coordenação Regional, está acusado de prevaricação de titular de cargo político.
O DIAP considera que concedeu vantagens patrimoniais ao requerente do projecto, em concreto violando “os seus deveres enquanto responsável pelas operações urbanísticas e licenciamento de obras particulares no concelho de Tavira”. Contacto pelo PÚBLICO, o antigo autarca, que arrisca uma pena que varia entre os dois e os oito anos de prisão, recusou comentar.
O social-democrata, que foi presidente da autarquia de Tavira de 1998 a 2009, ano em que venceu as eleições em Faro, violou ainda "o Plano Director Municipal, o Regime Jurídico da REN e o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação”, diz o Ministério Público (MP). O inquérito foi levado a cabo pela 2.ª secção do DIAP de Évora e investigado pela PJ de Faro.
Em causa está a construção de uma “moradia unifamiliar” na freguesia de Conceição, Tavira, num local que se encontra “integralmente na zona de REN”, salienta o DIAP. “Sendo observadas no local ruínas que impermeabilizam o solo, logo não integra REN, pelo que se aprova as razões ponderosas”, escreveu, contudo, Macário Correia no despacho de autorização. O MP é, porém, bem claro quando desmente o ex-autarca: “No local apenas existiam, e eram visíveis, alguns montes de entulho, compostos de pedaços de azulejos, mármores, blocos de alcatrão e terra misturada com pedras, bem como, noutro ponto do terreno, uma fila de pedras identificáveis como restos de um muro de delimitação”.
Tratava-se de “terra de cultura e pastagem” no lugar de Vale da Mó cujo dono é o marido da mulher que requereu o licenciamento. A construção da casa começou, pelo menos, com a colocação de fundações e a abertura do caminho de acesso à obra.
Na acusação, o procurador, que salienta que o arguido beneficiou assim quem requereu o licenciamento com vantagens patrimoniais “decorrentes de o poder fazer sem observância das normas legais”, faz ainda questão de destacar que nunca foi dada a indicação da existência no terreno de ruínas a Macário Correia. Nem tal aconteceu “informalmente por parte da junta de freguesia de Conceição de Tavira”.
Aliás, Macário Correia foi alertado do contrário. A arquitecta chefe da Divisão de Obras Particulares na câmara alertou que “se tratava de uma intervenção urbanística, visando construção nova em solo inserido em área REN”, refere a acusação.
Também a directora do Departamento de Urbanismo, Planeamento e Reabilitação Urbana da autarquia deu “parecer desfavorável”. Porém, no mesmo dia em que recebeu a posição negativa dos responsáveis municipais urbanísticos, Macário Correia “deferiu o projecto de arquitectura, viabilizando a operação urbanística e consequentemente a emissão do respectivo alvará de obras de construção”.
Como presidente, Macário Correia concentrava então, por delegação de poderes, “competências decisórias em matéria de planeamento de urbanismo, incluindo a concessão de licenças de operações urbanísticas no respectivo concelho”, aponta o DIAP de Évora.
O ex-autarca, engenheiro agrónomo, foi também presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve-Amal e presidiu à autarquia de Faro até ao final do mandato, em Outubro de 2013. Apesar de o Supremo Tribunal Administrativo (STA) o ter condenado em 2012 à perda do mandato em Faro, a decisão final no processo aconteceu então quando já tinha saído daquela câmara. Macário Correia interpôs recursos e manteve-se em funções. Em Abril desse ano, o STA suspendeu o acórdão que o condenava à perda de mandato, mas, posteriormente, os juízes acabaram por produzir um novo acórdão a confirmar a decisão.
Estavam em causa violações dos mecanismos de ordenamento do território no licenciamento de obras particulares durante o seu último mandato em Tavira, em 2006.
Não é a primeira vez que o agora administrador delegado da Algar, empresa do grupo EGF que trata os resíduos sólidos urbanos do Algarve, é acusado de licenciar obras contra pareceres técnicos. Há cerca de um ano, o MP ordenou à Câmara de Tavira a demolição de duas piscinas, uma habitação e um estábulo. Na semana passada, a autarquia foi notificada da possibilidade de licenciamento, mas apenas de uma das piscinas. O presidente da Câmara de Tavira, Jorge Botelho, contactado pelo PÚBLICO, recusou-se a fazer qualquer comentário. com Idálio Revez