Ambientalistas querem banir herbicida mais utilizado em Portugal
Glifosato foi considerado como “provável cancerígeno” por agência da Organização Mundial de Saúde.
Numa reavaliação de vários pesticidas divulgada na sexta-feira, a Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro (IARC, como é conhecida na sigla em francês) concluiu que o glifosato – lançado comercialmente nos anos 1970 sob a marca Roundup – é um “carcinogénico provável para o ser humano”. Isto significa que há provas científicas convincentes de que a substância provoca cancro em animais de laboratório e provas limitadas de que também o faz no ser humano.
A IARC cita a existência de estudos sobre a exposição humana ao glifosato, sobretudo em trabalhadores agrícolas, nos Estados Unidos, Canadá e Suécia, que sugerem uma associação entre o glifosato e linfomas não-Hodgkin, um grupo de cancros do sangue.
Um “provável carcinogénico” é a classificação mais próxima de um comprovado cancerígeno, na escala da IARC.
A agência da Organização Mundial de Saúde também classificou os insecticidas malatião e diazinão como provavelmente cancerígenos, e o tetrachlorvinphos e o paratião como “possíveis carcinogénicos” – ou seja, sobre os quais só há provas de associação a cancros apenas em animais de laboratório.
Os dois últimos estão proibidos na União Europeia e nos Estados Unidos. O diazinão é alvo de algumas restrições na UE e o malatião continua a ser utilizado.
Mas foi a classificação do glifosato que tem feito correr tinta, não só pela sua larga utilização na agricultura, como por estar associado à polémica sobre os organismos geneticamente modificados. Nos Estados Unidos, o uso do glifosato subiu em flecha desde a introdução, no final dos anos 1990, de milho e da soja transgénica. Estas variedades são resistentes ao herbicida, que assim pode ser aplicado sobre as culturas, eliminando outras plantas indesejáveis.
Em Portugal, apenas é plantada uma variedade de milho transgénico, em quantidades marginais – cerca de 5% da área total de culturas de milho. Mas o uso do glifosato também aumentou, de cerca de 700 toneladas em 2001 para pouco mais de 1100 toneladas em 2012, segundo dados da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária.
“A situação em Portugal é particularmente grave”, avalia, num comunicado, a Plataforma Transgénicos Fora, que reúne dez organizações não-governamentais portuguesas. O glifosato, segundo a Plataforma, também é utilizado nas plantas domésticas, na limpeza das ruas e passeios e em linhas de água.
O glifosato está na composição de 84 produtos fitofarmacêuticos com venda autorizada em Portugal, segundo a Direcção-Geral de Alimentos e Veterinária.
A classificação do produto como “provável cancerígeno” fez soar os alarmes entre os ambientalistas. “As implicações desta avaliação são profundas”, refere a Plataforma Transgénicos Fora. “Considerando que este ano o glifosato está em processo de reavaliação na União Europeia, impõe-se a coragem de proibir o seu uso antes que as consequências se agravem”.
Do lado da indústria, porém, a decisão provocou reacções de incredulidade – mesmo porque vai contra as classificações vigentes nalguns países. Nos Estados Unidos, a Agência de Protecção Ambiental considera o glifosato como não cancerígeno.
A multinacional Monsanto – que comercializa tanto o glifosato quanto as culturas transgénicas que a ele resistem – alega que a IARC baseou-se em estudos antigos e desconsiderou novas investigações sobre a toxicidade do produto.
Num comunicado, a Monsanto lembra que na mesma categoria em que a IARC agora classificou o glifosato estão “o café, os telefones celulares, o extracto de aloé vera e vegetais em conserva, bem como profissões como barbeiro”.
A Associação Nacional de Produtores de Milho dos Estados Unidos também reagiu dizendo que a decisão da IARC “cria um temor desnecessário e confusão sobre a comprovada segurança deste importante instrumento agrícola”.
A CropLife International, uma federação que reúne empresas e associações ligadas à biotecnologia e agricultura, alinha pelo mesmo diapasão. “Acreditamos que a IARC chegou às suas conclusões como resultado de uma revisão incompleta dos dados, na qual evidências centrais foram omitidas”, disse Howard Minigh, presidente da organização.