Paulo Morais documenta denúncias sobre o BES citando-se a si mesmo
A lista de alegados beneficiários dos empréstimos concedidos pelo BESA, que provocaram um rombo de 3 mil milhões no BES, chegou ao Parlamento. Com um problema: os documentos que a suportam são crónicas televisivas e de jornal.
“Junto, como solicitado, documentação relativa aos beneficiários de empréstimos por parte do Banco Espírito Santo – Angola (BESA)”, diz a folha de rosto endereçada a Fernando Negrão, o presidente da comissão de inquérito. Um pouco abaixo da assinatura de Paulo Morais surge a descrição dos “anexos”: “Anexo 1 (lista de documentos), anexo 2 (lista de beneficiários), anexo 3 (USB drive)”.
Na página seguinte, surgem, numerados, os “documentos”: “Jornal Folha 8 17/5/2014”, por exemplo, ou “Programa CMTV Fogo Contra Fogo 5/3/2015”. São oito, no total. Quatro edições do Folha 8, um jornal dirigido por William Tonet, jornalista, advogado e militante da Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE). Três programas da CMTV, Fogo Contra Fogo, em que Paulo Morais debate a actualidade com Marinho e Pinto. E uma crónica de Paulo Morais no Correio da Manhã.
São estes os únicos “documentos” que Paulo Morais entregou à comissão. O citado “anexo 3 (USB drive)” contém, de novo, os mesmos documentos, em versão integral. Mesmo que isso tenha poupado aos deputados o trabalho de pesquisarem em arquivos e hemerotecas o que estaria dito e escrito nos media citados, não parece haver, em São Bento, grandes motivos para agradecimentos.
É que a lista de nomes fornecida, de 15 pessoas (uma das quais faleceu em Janeiro de 2013), é apenas suportada pelas próprias denúncias de Morais e Tonet, amplamente conhecidas (até porque estavam divulgadas nos meios de comunicação social agora apresentados como suporte). Não é fornecido um único documento que sirva de fonte primária ou que permita perceber como o jornal Folha 8, e o vice-presidente da Transparência e Integridade, chegaram àqueles nomes e não a outros.
Depois das declarações, evasivas, de responsáveis do banco, como Rui Guerra e Álvaro Sobrinho, que negaram aos deputados a lista de beneficiários dos créditos, Paulo Morais garantiu, em declarações à Rádio Renascença, que “não é difícil perceber quem são os destinatários dos empréstimos concedidos pelo BES Angola e a que o banco alegadamente perdeu o rasto”.
Nessa mesma ocasião, Morais disse ter documentos que provariam o destino desses créditos. “O que é incompreensível é como o Estado português não faz exercer os seus direitos, desde logo confiscando as propriedades compradas com este tipo de empréstimos. Relativamente aos empréstimos utilizados em território angolano, é evidente que a situação é mais difícil, mas dadas as óptimas relações que existem entre os dois Governos, teria de haver uma manobra diplomática para recuperar esses milhares de milhões de euros, que neste momento representam um prejuízo no BES e no Novo Banco, e que teriam de ser recuperados”.
A comissão decidiu, por unanimidade, pedir esses documentos e a lista de devedores, com o objectivo de os fazer chegar ao Ministério Público, que investiga a ruína do BES. O que recebeu não são provas, são outras versões (em papel e em vídeo) das mesmas denúncias que tinham sido feitas pela rádio.