Sempre me perguntei por onde andavam os nossos legisladores aos 30 anos. Os mesmos que acabam de propor um novo programa de estágios para desempregados de longa duração com mais de 30 anos de idade. Porventura ocupados numa juventude partidária qualquer ou isolados do mundo real e das dificuldades económicas diárias. Digo isto porque não consigo encontrar nenhuma justificação plausível, a não ser o desfasamento completo da realidade, para oferecer 419 euros a alguém que seis meses depois estará na rua.
Todos sabemos que é isso que acontece sistematicamente. Os estágios não têm sido uma medida de estímulo à economia e à progressão da carreira, mas sim um tampão que serve para diminuir os números reais do desemprego através da contratação temporária e repetida, facilitando o acesso a trabalho barato e precário. Sai um, entra outro. É triste constatar que muitas empresas procuram estagiários não por falta de recursos ou funções temporárias, mas por ser mais barato do que celebrar um contrato com ou sem termo no qual não contam com o apoio financeiro do Estado.
A diferença deste novo programa é que permite o acesso a pessoas com mais de 30 anos que nunca tenham feito um estágio IEFP e que não tenham obtido uma nova qualificação nos últimos 3 anos. Trinta tenho eu e todos os que conheço da minha geração já fizeram um ou dois estágios profissionais. Normalmente um depois da licenciatura e outro depois do mestrado. A maioria não foi contratada em nenhum deles. Mais de metade dos anúncios de emprego exigem actualmente que o candidato seja elegível para estágio profissional e que tenha um a dois anos de experiência. A situação é sempre uma de duas: ou tivemos antes um contrato e somos agora obrigados a aceitar um estágio, ou somos excluídos por já termos feito um. Oferecer um estágio de seis meses a alguém com mais de 30 anos não é uma solução real. É tapar o sol com a peneira. É alargar a base de recrutamento, colocando o baixo custo do programa e do trabalho à frente do candidato e da sua experiência.
Uma nota positiva: segundo o Público, só poderá beneficiar da medida quem tiver contratado pelo menos um em quatro estagiários, algo que já deveria ter sido implementado mais cedo em todos os programas. A chave não é aumentar a idade limite dos estágios, mas sim averiguar as necessidades reais dos empregadores e o seu histórico de estagiários. Quando uma empresa recruta, três ou quatro vezes seguidas, estagiários com o mesmo perfil é porque tem necessidade desse posto de trabalho. Mas ao invés de contratar uma pessoa a título permanente, recorre à medida. A única forma de combater isso é limitar o aproveitamento controlando o rácio e a área das contratações.
É hoje difícil encontrar um cargo especializado onde se pague menos do que num estágio profissional: 419 euros são ofensivos. Desvalorizam o trabalho e as competências, sobretudo para quem, acima dos 30, certamente já tem experiência laboral. Quem aprova estes números alguma vez pagou casa e despesas ou teve comida e roupa lavada a vida toda?