A estranha forma como convidaram Rita Barosa para o topo

Antiga assessora da administração do BES foi ouvida nesta quarta-feira no Parlamento.

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Nuno Ferreira Santos
No início de Junho passado, Rita Barosa, foi chamada a uma reunião de alto nível no BES. Um fundo venezuelano, que detinha 267 milhões de euros em dívida da Espírito Santo Internacional (ESI) - uma empresa falida, com mais de 1,3 mil milhões de euros de passivo escondido - pretendia recuperar o seu dinheiro. O BES estudava uma forma de salvar “o cliente” sem pôr em causa a empresa do grupo, que obviamente não podia dispor de liquidez para pagar.

A assessora da administração, que regressara ao banco depois de dois meses no Governo, como secretária de Estado da Administração Local na equipa de Miguel Relvas, deveria ajudar os executivos do BES a perceber se seria possível encontrar um outro banco disponível para avançar o dinheiro aos venezuelanos, aceitando como garantia a dívida da ESI. Impossível, assegurou Rita Barosa. Nenhum banco o faria. De seguida, Ricardo Salgado accionou o plano B. Cartas-conforto, em nome do BES, garantindo o dinheiro.

Rita Barosa afirmou no Parlamento, nesta quarta-feira, que se opôs. Ou melhor, que tentou dissuadir a administração. “Era uma imprudência. Não fazia sentido nenhum o banco emitir aquele tipo de cartas. Se eu fosse um investidor institucional aquela carta não me serviria como garantia. Os termos financeiros pareceram-me muito básicos”, respondeu, perante as perguntas do deputado Pedro Alves, do PSD.

O assunto percorreu a maioria das perguntas daí para a frente. Filipe Neto Brandão, do PS, apontou um problema: essas cartas violavam o ring fencing - ou seja, a tentativa do Banco de Portugal de impor uma redução dos empréstimos do BES às empresas deficitárias do Grupo Espírito Santo - porque com essa garantia expressa o BES acabava por assumir prejuízos do GES.

Rita Barosa foi administradora de várias empresas do GES, na área financeira. Dirigiu departamentos. E chegou a ser proposta para a administração, em Junho de 2014, na célebre - e malograda - lista liderada por Amílcar Morais Pires. Cecília Meireles, do CDS, fez a pergunta que ainda estava por fazer: Quem a convidou? A resposta não poderia ter sido mais desconcertante: “Soube pelo departamento jurídico.” Como?… Recebeu uma chamada telefónica de um advogado do BES que lhe pediu o “curriculum”. “Perguntei qual era a razão e ele explicou-me.” 

Miguel Tiago, do PCP, que tomou a palavra na vez seguinte, resolveu esclarecer melhor o convite feito a Rita Barosa para o Governo. A testemunha já explicara que o desafio político fora “uma surpresa” e que “nunca, sequer do ponto de vista social”, se tinha cruzado, antes, com Miguel Relvas. A razão, explicou ao deputado comunista, foi-lhe explicada pelo próprio Relvas: “Três ou quatro pessoas da área financeira” aconselharam-na para a pasta da Administração Local, precisamente pela sua experiência profissional (securitização e derivados). 

A experiência seria efémera, contudo. Dois meses depois de tomar posse, no início de 2013, o ministro apresentou a demissão e, com ele, Rita saiu. Voltou ao BES, liderando um “gabinete de reorganização estratégica” cuja principal função era, como adiantou à deputada Mariana Mortágua, do BE, preparar uma redução de pessoal. Os acontecimentos precipitaram-se. E, mesmo passando pelas administrações de Vítor Bento e Stock da Cunha, acabou por se demitir do BES em Setembro.

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