O criminoso foi obviamente o mordomo
Nesta outra telenovela a que ontem assistimos a trama é muito mais densa. Começando pelos protagonistas, temos um banqueiro que “se considera um verdadeiro trabalhador”, apesar de “erros de julgamento” como nos submarinos, que só deram um milhão a cada ramo da “família” e um mar de arrelias, temos um Presidente Cavaco Silva atento às recomendações do banqueiro quanto à diplomacia com Angola, temos um Presidente Dos Santos que emite garantias que valem o ouro da sua palavra, temos um Durão Barroso que “dava conselhos” mas “por um montante nada significativo”.
Depois, temos os prejudicados, os “potenciais investidores” que se acotovelavam na antecâmara do governador para mostrarem a cor do dinheiro que queriam pôr no BES, e a PT que “foi uma tristeza”.
Chegamos aos culpados, um administrador angolano que muito “incomodou” os generais accionistas, um contabilista de Miami que terá sido o responsável por gerir a holding e criar o buraco de biliões de euros, que andará por parte incerta, um primo que andaria na solicitação de “contrapartidas”, um governador do Banco de Portugal que não facilitou o empréstimo salvífico. Com todos estes aborrecimentos, “o banco não faliu”, faliram-no. Mesmo assim, com toda a cabala, Ricardo Salgado, ele próprio, num gesto magnânimo e desprendido, devolveu Portugal aos seus donos, todos nós, encerrando o episódio com a grandeza dos aristocratas.
O governador, irritado, reagiu na hora divulgando as cartas que podia ter entregue à Comissão Parlamentar há uma semana, como se tivesse preferido guardá-las a manter-se o verniz. Na verdade, sabedor desde Novembro de 2013 da falsificação das contas, as cartas que indicam que negociou a saída de Salgado demonstram também o tempo pusilânime do regulador.
Quer então saber quem é o Mundinho e quem é o Coronel nesta história? Não interessa. Se houve crime, e não me citem como sugerindo que houve tal, é só para supormos, se houve crime, o culpado, como não podia deixar de ser, foi o mordomo.