Fazer pior era mais difícil do que criar uma semântica rebuscada à volta de um ponto. Um ponto servido com manual de instruções.
Em boa hora Rui Moreira e a sua equipa perceberam a necessidade de traduzir visualmente a marca identitária do Porto. A vitalidade de uma cidade como a nossa merece e carece de uma imagem contemporânea, de uma imagem que traduza as suas potencialidades, as suas virtudes e as suas contradições.
Muito acertadamente, a autarquia apresentou um novo conceito para a cidade, conseguindo resistir à tentação banal de encomendar um logótipo para a edilidade. Sem grandes hesitações, perseguiu o objectivo máximo do que deve ser o cumprimento da sua função: servir o Porto e servi-lo bem; entender as suas gentes, as suas práticas, as suas obras e tudo aquilo que faz com que esta cidade seja um lugar único e um motivo de orgulho e paixões várias.
Mais do que um elemento gráfico, mais do que uma marca, a equipa de Eduardo Aires, designer em terra de grandes designers, criou um conceito novo para a cidade. Um conceito que tem por base um sistema de representações icónicas da pluralidade que se vive cada vez mais no Porto. Um sistema evolutivo e participativo, rezam as crónicas, já que aberto às novas ideias do cidadão que engrandecerão a representação visual deste lugar especial.
Está assim descoberta a função deste difícil trabalho de síntese numa cidade como o Porto. Tudo parece contribuir para que o sistema se desenvolva como a cidade: organicamente, com naturalidade e dinamismo. Um sistema simples, tão eclético quanto rico em significado.
Até que nasceu o Ponto. Um ponto final depois da um nome próprio: Porto. Um ponto retrospectivo em vez de prospectivo. Um ponto conservador em vez de liberal. Um ponto estático em vez de dinâmico. Não é um ‘ponto de encontro’ que suscite sentimentos de pertença. Nem sequer um ‘ponto de referência’ como um farol da nossa costa.
Confesso que quando vi a marca, não vi o dito Ponto. Por distracção ou simplesmente porque a carga semântica que mais tarde me venderam não existe naquele contexto. Veio depois a explicação, de preferência verbalizada: é o Porto, Ponto. Aquele e mais nenhum. Ponto. Um Ponto especial, mas com manual de instruções.
Comparar o significado desta subtileza a marcas como I Amsterdam é um exercício da mais refinada imaginação. Transformar o dito Ponto num claim para a cidade, é uma violência conceptual. O enigmático Ponto que agora se juntou ao Porto não funciona sequer como metáfora. Não cumpre assim a sua função, logo não é bom Design, apenas talvez decoração.
O Porto não vai ver o Ponto. O Porto não vai perceber o discurso retorcido do Ponto. O Ponto não vai cair, mas vai ser apenas... um ponto.
Sem dúvida que todos nós, gente do Porto, ficamos a ganhar com a empreitada. Bem concebida, bem elaborada e, espera-se, bem implementada. Mas, em qualquer obra de Design como em tantas outras áreas criativas, a simplicidade não se explica, apenas... existe. A ideia do “Porto. Ponto” deve constar de manuais de instruções a oferecer, pelo menos, aos milhares de visitantes que periodicamente visitam a nossa cidade com prazer. E explicada com calma, em vários idiomas, para que tudo fique bem claro. Ou não, deixa-se ficar lá o ponto para não retirar o prazer da visita.