Maioria PSD/CDS decide manter exposição de bustos presidenciais na AR
Nos corredores do Parlamento, os deputados comentavam a falta de semelhanças dos bustos com as figuras retratadas ou criticam exibição de imagens dos chefes de Estado da ditadura.
A exposição “Cem anos de Presidência” é uma iniciativa da Câmara Municipal de Barcelos (liderada pelo PS) que foi autorizada, em Junho passado, pela comissão de Educação, Ciência e Cultura, sem que ninguém levantasse obstáculos. Depois obteve luz verde da Presidente da Assembleia da República. Esta quarta-feira de manhã começou a ser instalada nos corredores do andar nobre do Parlamento, entre as salas do grupo parlamentar do PSD e do CDS.
Ao lado dos bustos (em barro) dos Presidentes da era democrática figuram outros do tempo do Estado Novo, como Américo Tomás ou Craveiro Lopes. O deputado António Filipe, do PCP, não gostou do que viu. “É um enxovalho para a democracia”, protestou, logo de manhã, na Comissão de Assuntos Constitucionais. Foi acompanhado por PS e BE. Na maioria, os deputados tentaram sempre desvalorizar a polémica e consideram que a esquerda estava a fazer censura.
No arranque do plenário, ao início da tarde, a bancada comunista levou o caso ao plenário através de uma interpelação à mesa. Comunistas e bloquistas queriam suspender a exposição cuja inauguração está prevista para esta quinta-feira às 14h30.
“A mera referência cronológica [aos presidentes no tempo do Estado Novo] é contribuir para o branqueamento do fascismo e aqueles que a defendem contribuem para esse branqueamento”, afirmou João Oliveira, líder da bancada do PCP, apesar de reconhecer que “não se pode apagar a História nem o que significou o fascismo e o papel dos seus dirigentes”.
Na mesma linha, o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares sustentou que a exposição “não está à altura da História nem da casa da democracia do século XXI”. O bloquista defendeu que “se retire a exposição neste momento, se suspenda a inauguração de amanhã e se convoque uma conferência de líderes e que se impeça que uma lavagem da ditadura vá por diante”.
A bancada do PSD contestou esta leitura. “Não se trata de nenhuma exaltação, de nenhum branqueamento, mas apenas de uma exposição histórica”, desvalorizou o deputado social-democrata Carlos Abreu Amorim. E lembrou que, na recente exposição dos 40 anos do 25 de Abril, com cartazes do pós-revolução, um dos slogans “exigia a execução pública dos fascistas”.
Nuno Magalhães, líder da bancada do CDS, sublinhou que a exposição “visa assinalar os 100 anos da República”, numa iniciativa que “todos sabiam” e à qual “ninguém, se opôs”. E deu um exemplo de outros símbolos que se mantêm no Parlamento: “Não é por termos figuras da monarquia, na sala do Senado, que o Estado português se torna numa monarquia”.
A Presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, está em viagem oficial ao estrangeiro, mas em contacto telefónico com Guilherme Silva, que presidiu ao plenário, transmitiu a ideia de que seria delicado desautorizar a comissão de Educação. Esta comissão reuniu, por isso, de emergência, após o plenário.
O PCP propôs a suspensão da inauguração da exposição, o que foi chumbado pela maioria. O BE queria que pedir à Presidente que “repondere” a exposição. Foi também chumbado pelo PSD/CDS. Voltou-se ao ponto de partida. Como resumiu o presidente da comissão, Abel Baptista (CDS), “a comissão fez um parecer a anuir a exposição e a senhora Presidente despachou 'sim'.”
Com ou sem aval dos partidos da esquerda, os bustos do artista Joaquim Esteves mantêm-se nos corredores, atraindo a curiosidade de todos. Os deputados têm comentado, sobretudo, a falta de semelhança que existe entre alguns dos bustos presidenciais e as figuras que pretendiam retratar. Outros indignam-se com a exibição dos antigos presidentes do Estado Novo. Outros ainda acham feias as figuras esculpidas em barro. Os bustos ocuparam algumas horas de trabalho parlamentar desta quarta-feira e deveriam ficar em exibição até ao final do mês. Resistirão?