A evolução humana esteve a trabalhar para que não houvesse duas caras iguais

Dinâmicas sociais interferiram na evolução da cara humana, aumentando a diversidade nas características faciais. Esta tendência iniciou-se antes da divergência dos neandertais e dos denisovanos.

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O aumento da variabilidade da cara é uma tendência antiga na evolução Navesh Chitrakar/Reuters
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Mas ao longo da evolução do Homo sapiens, estas dinâmicas sociais também promoveram o aumento da variabilidade das características faciais, defende uma equipa norte-americana que identificou uma grande diversidade nos traços da cara e nos genes associados à variabilidade destas características faciais. O estudo vem explicado num artigo publicado ontem na revista Nature Communications.

“Os humanos são fenomenalmente bons a reconhecer as caras, há uma parte do cérebro especializada nisso”, explicou Michael Sheehan, do Museu de Zoologia Comparativa e Biologia Integrada da Universidade da Califórnia, Estados Unidos, e autor do estudo juntamente com Michael Nachman, da mesma instituição. “O nosso estudo mostra agora que os humanos foram seleccionados para serem únicos e facilmente reconhecíveis. É claramente positivo para mim reconhecer as outras pessoas, mas também é benéfico para mim ser reconhecido. De outro modo seríamos todos parecidos”, acrescentou, citado num comunicado daquela universidade.

“Perguntámo-nos se os traços como a distância entre os dois olhos ou a largura do nariz são variáveis só porque sim, ou se houve uma selecção evolutiva para serem mais variáveis do que seriam de outro modo”, explicou o investigador.

Segundo os dois autores, a variabilidade da cara humana não é mais forte dentro do género feminino ou masculino, nem numa determinada faixa etária – as caras são diferentes ao longo de toda a vida. Por isso, os cientistas defendem que o que impulsionou este aumento da variabilidade não pode só ter sido as preferências de parceiros sexuais ao longo de centenas de milhares de anos. “Ser-se reconhecível é importante em todos os aspectos das nossas vidas e os benefícios não estão limitados em como isso influencia o facto de sermos mais atraentes”, disse Michael Sheehan ao PÚBLICO.

A equipa usou informação do exército dos Estados Unidos compilada em 1988. Com este material, os cientistas começaram por analisar a variabilidade facial de homens e mulheres de ascendência africana e europeia comparando características faciais, como a distância entre o queixo e a testa, ou a altura das orelhas, com outras características corporais, como o comprimento do antebraço ou a altura da cintura. Os resultados mostraram que os traços faciais eram mais variáveis em todos os grupos. “As características mais variáveis estão situadas dentro do triângulo dos olhos, a boca e o nariz”, lê-se no comunicado.

Há, no entanto, outras características corporais que são diferentes em todos humanos, a impressão digital é o exemplo clássico, mas que não nos ajudam a identificar e distinguir normalmente as outras pessoas. “Um problema da análise da morfologia é que a maior variabilidade que existe pode ser apenas o resultado de haver menos constrangimentos na morfologia facial do que na morfologia dos braços ou das pernas”, explicou-nos o investigador.

Para responder a esta questão, os cientistas usaram uma base de dados de um projecto alemão que sequenciou mais de 1000 genomas humanos e catalogou quase 40 milhões de variações genéticas. Analisando estas variações, a equipa concluiu que há mais diversidade genética associada às características do rosto humano do que as características que, aparentemente, não estão condicionadas evolutivamente, como as impressões digitais.

“A variação tende a ser podada pela selecção natural no caso das características essenciais para sobrevivermos”, defendeu Michael Nachman, no mesmo comunicado. “[Na face] é o oposto, a selecção está a manter esta variação. Tudo isto é consistente com a ideia de que tem havido uma selecção para haver variabilidade de modo a facilitar o reconhecimento dos indivíduos.”

A equipa ainda analisou a variabilidade genética das características faciais nos neandertais e denisovanos, duas espécies que divergiram há menos de um milhão de anos de nós. A equipa encontrou nestas espécies de humanos a mesma variabilidade das características faciais, mostrando que esta é uma tendência evolutiva antiga.

E no futuro, será que cada rosto humano irá ser cada vez mais único? “Não  é claro”, responde-nos Michael Sheehan. “Uma razão para a variabilidade continuar a aumentar é que temos sociedades maiores e mais complexas onde seria necessário um maior número de características faciais para que todas as pessoas sejam únicas. No entanto, uma razão para isso não acontecer é que hoje temos muitas outras formas de termos aparências únicas tal como os cortes de cabelo, os acessórios, as roupas, etc. Por isso, é possível que a originalidade das caras seja menos importante agora do que foi no passado.”

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