Grupo mexicano só compra a ES Saúde se garantir o domínio da empresa
Grupo Ángeles lançou OPA onde oferece prémio de 9%. Negócio avalia a ES Saúde em 410 milhões mas precisa do aval da Rioforte, que pediu gestão controlada no Luxemburgo.
O grupo mexicano coloca várias condições para avançar com o negócio. Para já, apenas aceita ser accionista maioritário, colocando o patamar mínimo nos 50,01%. Ao mesmo tempo, só admite novo passo se com esta operação ficar com mais de 90% das acções. Nessa altura, decidirá se avança com uma oferta potestativa sobre o resto do capital, e se tira a empresa de bolsa.
Apenas 49% do capital estão dispersos em bolsa, sendo o grupo presidido por Isabel Vaz controlado em 51% do capital pela Espírito Santo Health Care Investments (ESHCI). Esta, por sua vez, é detida em 55% pela Rioforte e em 18% pela Espírito Santo Financial Group. Já os restantes 27% estão nas mãos do Novo Banco (gerido por Vítor Bento e que ficou com os activos bons do ex-BES).
A Rioforte, que domina a ESHCI, entregou um pedido de gestão controlada no Tribunal Comercial de Luxemburgo, que foi aceite. Agora, as autoridades deste país terão de se pronunciar sobre o negócio.
Outra condição imposta pelo grupo Ángeles é a garantia de que o Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, faz parte do pacote aquisição, “sem condições”. Esta unidade é do Estado, mas gerida no âmbito de uma Parceria Público-Privada (PPP), e teve um peso de 22% nas receitas operacionais da ES Saúde no ano passado.
Esta medida faz com que o negócio ganhe um vertente política, obrigando a uma tomada de posição por parte do Ministério da Saúde. Há, no entanto um precedente a favor do negócio, já que também a HPP, vendida pela Caixa Geral de Depósitos (CGD) no início de 2013 à Amil, detinha no seu portfólio um hospital em regime de PPP (Cascais) e isso não impediu a alienação (por 85,6 milhões). Logo depois, a Amil foi alvo de uma OPA da norte-americana UnitedHealth.
No prospecto publicado na CMVM na noite desta terça-feira, há também várias questões ligadas à queda do grupo GES, destacando-se o facto de a empresa exigir que sejam transferidas para o Novo Banco “todas as posições activas e passivas” da ES Saúde e suas subsidiárias, como os depósitos bancários e aplicações de tesouraria, que estavam no BES.
A ES Saúde, criada em 2000, tem uma rede de 18 unidades: o Hospital da Luz, em Lisboa, o Hospital Beatriz Ângelo (PPP), em Loures, outros sete hospitais privados, sete clínicas a operar em regime de ambulatório e duas “residências sénior”.
Para o grupo mexicano, que tem apostado no turismo de saúde, esta é uma oportunidade de entrar no mercado europeu, crescendo por aquisição ao comprar uma empresa que tem vindo a expandir-se. Nos planos da ES Saúde está, por exemplo, a entrada no mercado angolano.
No primeiro trimestre, período em que se concretizou a entrada em bolsa, o lucro da ES Saúde duplicou, para 4,6 milhões de euros (contra 2,3 milhões no mesmo período do ano passado), com o resultado a beneficiar do aumento da actividade nas unidades privadas e ainda “no segmento de cuidados de saúde públicos” do Hospital Beatriz Ângelo.
Este hospital gerido em regime de PPP teve um crescimento homólogo de 13,9% nos rendimentos operacionais, para 23,1 milhões de euros, o que lhe permitiu passar de um EBITDA negativo de 0,1 milhões de euros para um resultado positivo de 0,6 milhões no primeiro trimestre.
A notícia da OPA sobre a dona dos hospitais da Luz e de Loures acontece ao fim de apenas 52 semanas de presença da empresa em bolsa. As acções da ES Saúde estavam nesta terça-feira a apresentar um crescimento muito ligeiro, de 0,08%, quando foram suspensas, valorizando-se para 3,943 euros, mais 23,13% do que valiam no arranque da negociação em bolsa, a 12 de Fevereiro.
O interesse mexicano
O grupo Ángeles, além da saúde, está sectores como a hotelaria, banca e comunicação social. Embora o Grupo Empresarial Ángeles (GEA) só tenha sido formalmente constituído em 1998, as origens remontam aos primeiros investimentos numa unidade hospitalar pela mão de Olegario Vázquez Raña, fundador, de origem galega, e actual presidente do conselho de administração.
A expansão dentro de portas, mas também para a Europa, é identificada pelo director-geral, Olegario Vázquez Aldir (filho de Raña), como estratégica para a empresa mexicana. O grupo “ampliará a rede de hospitais no México e, no médio prazo, atravessaremos as fronteiras, para o Centro e Sul da América e para a Europa”, afirmou, citado há dias pela revista Líderes Mexicanos. O seu concorrente directo no México é o Grupo Star Medica, onde o milionário Carlos Slim é accionista de referência.
Mudanças no sector
Em Portugal, o sector da saúde conheceu uma transformação no início do ano passado, quando, em Março, a CGD fechou a venda da HPP aos brasileiros da Amil. O negócio rendeu uma receita de 85,6 milhões de euros ao banco público (no seu processo de venda de activos não estratégicos para reforçar o balanço), valor que poderá acrescer mais seis milhões caso fosse atingidos determinados objectivos, que não foram especificados.
A HPP Saúde, para além de responsável pela gestão do Hospital de Cascais, em regime de PPP, é composta por seis hospitais em todo o país e pela Clínica Fórum Algarve.
Um outro operador de peso no sector da saúde privada em Portugal é a José de Mello Saúde, onde a Associação Nacional de Farmácias detém 30% do capital, e que gere dois hospitais públicos, três hospitais privados (como a CUF Descobertas), seis clínicas e um instituto. Além disso, está também presente no negócio de residências e apoios para a terceira idade. No ano passado, a José de Mello Saúde teve uma receita de 482,4 milhões de euros e um resultado líquido de 12,6 milhões.