A teoria do sapo e o Agosto do desgosto no Brasil
A teoria do sapo remonta às décadas de 1930, 1940. Reza a lenda que, depois de o Vasco da Gama, o clube mais português do Rio, golear um adversário por 12-0, um jogador da equipa derrotada enterrou um sapo no relvado do estádio de São Januário e rogou a praga de que o Vasco não venceria por 12 anos. Depois de várias temporadas de derrotas, o então presidente do clube, Ciro Aranha, mandou tractores vasculharem o relvado e retirarem toda a terra do campo em busca do sapo. Contratou um novo treinador, mudou a equipa e o Vasco livrou-se do efeito da maldição: foi campeão invicto do Rio de Janeiro em 1945 e 1949, além de conquistar outros títulos.
A tese do meu amigo é de que há um sapo enterrado no Brasil. O tal sapo justifica, entre outras coisas, a morte prematura de figuras públicas que, em teoria, desempenhariam um papel importante na política por muito tempo ou a morte de políticos em momentos cruciais da História do país. À lista do meu amigo, que "não reflecte qualquer julgamento político partidário ou de qualquer natureza sobre as pessoas mortas", acrescentei um ou outro nome ou facto político. Curiosamente alguns também aconteceram em Agosto.
No baptizado "Agosto do desgosto", o Presidente Getúlio Vargas suicidou-se, deixando a célebre carta-testamento “ Saio da vida para entrar para a História”. Em Agosto, o ex-Presidente Juscelino Kubischeck morreu num acidente de carro durante a ditadura militar. Até hoje muitos defendem a tese de assassinato. Jânio Quadros também renunciou em Agosto. Eduardo Campos morreu três dias depois de completar 49 anos e no mesmo dia da morte do avô, Miguel Arraes, um político histórico da resistência à ditadura militar, no dia 13 de Agosto, uma data para lá de simbólica para os mais supersticiosos.
Entre os mais jovens que prometiam uma carreira brilhante, poderíamos lembrar o Governador do Rio de Janeiro, Roberto Silveira, que morreu num acidente de helicóptero e era tido como sucessor de João Goulart na presidência do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), uma liderança em ascendência nacional no início da década de 1960. Tinha 37 anos. Luís Eduardo Magalhães, considerado o "príncipe dos deputados", filho do poderoso António Carlos Magalhães, morreu de um enfarte fulminante. Era tido como favorito na disputa para o Governo da Bahia e era um provável candidato à sucessão de Fernando Henrique Cardoso. Tinha 43 anos. Poderíamos acrescentar Celso Daniel, presidente da Câmara de Santo André, em São Paulo, do PT, que foi sequestrado e assassinado em 2002. A família acredita que foi um crime político, já que Daniel estava disposto a denunciar o esquema de desvio de verbas das câmaras para financiar campanhas eleitorais. Tinha 50 anos.
Não foi em Agosto nem as vítimas eram tão jovens, mas não dá para esquecer o acidente de helicóptero que matou Ulysses Guimarães, em 1992. Ulysses, com Tancredo Neves, avô do actual candidato Aécio Neves, foi um dos pais da Directas Já, a campanha de redemocratização do país. E não dá para esquecer o próprio Tancredo Neves, internado com diverticulite um dia antes de tomar posse como primeiro Presidente civil do Brasil em 1985. É dele a frase “Presidência é destino”. Morreria sem tomar posse.
Um dia depois da morte de Eduardo Campos, o país espera que Marina Silva, que foi até esta quarta-feira a sua "vice", anuncie a candidatura. O PSB está reunido em São Paulo para tomar uma decisão. Tem nove dias para anunciar o novo candidato.
O jornalista brasileiro Elio Gaspari lembra esta quinta-feira na sua coluna de O Globo a habilidade política e o conhecimento de História do avô do candidato Aécio Neves, Tancredo, que pode servir para olhar para o Brasil de hoje.
Tancredo foi o político que soube costurar “alianças consideradas impossíveis”, no início da década de 1980 com o próprio Miguel Arraes, avô de Eduardo Campos. Com a eleição indirecta de Tancredo acabaram juntos com a ditadura. Seguindo o exemplo, Elio Gaspari sugere que a candidata Marina Silva deveria tornar-se "vice" de Aécio Neves, se os partidos de oposição quiserem ter alguma possibilidade de tirar o PT do poder. “O Brasil tem jeito” foi a última frase de Campos na última entrevista, concedida na noite anterior ao acidente que o matou.
Enquanto o Brasil espera, o meu amigo, o da teoria do sapo, não está lá muito optimista. Acha que vai ser muito difícil desenterrar o sapo num território tão vasto, de mais de oito milhões de quilómetros quadrados. Eu, bem menos pessimista, terei que lembrá-lo de que até a sua excelente memória pode falhar. Afinal, o sapo nunca foi encontrado no relvado do Vasco da Gama.