Doou o sorriso ao mundo e perdeu o dele

É triste ler que Robin Williams morreu, por muito pouco próximo que ele nos seja. É transversalmente triste pensar que a vida lhe consumiu o sorriso que deixou nos outros, vezes sem conta

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Lucas Jackson/ Reuters

Tinha uma linha a desenhar-lhe a boca e, por muito que os olhos se rissem, aquela reta nunca desviava os cantos da boca nem para cima nem para baixo. Estamos separados do cinema por uma tela, por isso, cumprimos a nossa função de espectadores de expressões: vemos, reparamos, comentamos e, na leitura acomodada e humilde de quem só vê, a reta que lhe desenha a boca não é mais que um somar de esgares que não permitem tirar nem um pedaço das ilações daquilo que realmente preocupa os outros na vida. Espectadores que somos, saímos da sala, egoístas de felizes com um filme que nos deixou a rir, e seguimos a nossa vida, com ou sem esgares ao canto da boca.

Robin Williams tinha a capacidade de fazer rir os outros, moldava a cara em expressões de desenho animado, arrancava gargalhadas sem abrir a boca, fosse isso o dom de uma vida que tantas vezes consome a energia até ao vazio que é sugar o próprio até não ter nada. Tinha a versatilidade dos maiores e sabia transportar na voz a mais densa das mensagens, como se contasse, de todas as vezes, histórias para crianças. Robin Williams tinha o dom de representar como um "adulto que há de ser para sempre menino" e era precisamente isso que o tornava doce e bom, para lá daquela tela, em que continuava sem expressão ao canto da boca.

É triste ler que Robin Williams morreu, por muito pouco próximo que ele nos seja. É transversalmente triste pensar que a vida lhe consumiu o sorriso que deixou nos outros, vezes sem conta. É penoso sequer supor que a tristeza o tenha devorado de tal maneira até ficar sem encanto para se continuar a deixar impressionar pela vida.

Não gosto de pensar que o homem que nos conseguiu emocionar à medida que nos ensinava a viver o “carpe diem” perdeu a força para o continuar a cumprir. É estranho, isto de confundir a ficção com a realidade, mas é tão fácil querer confundi-las, hoje, é tão fácil achar que a única homenagem justa ao homem que doou o sorriso ao mundo e perdeu o dele é subirmos todos para o topo das nossas mesas e gritarmos “oh, captain my captain”, para não o deixarmos, nunca, sair daquela sala, que há de ser sempre a nossa memória.

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