O Porto é o companheiro de uma vida. É charmoso, elegante, delicado e tem a base das relações para a vida: é profundamente acolhedor. Gostar de alguém deposita-nos o peso da incondicionalidade: não dá para admitir o desdém do que, na alma, é terrivelmente nosso e indiscutivelmente bom. Quem é do Porto defende a cidade com unhas e dentes porque nascer tripeiro significa ter orgulho num sotaque que não se quer perder, e isso é só um pedaço visível de tantos sentimentos menos óbvios. Defender o Porto significa levantar a bandeira da simpatia que não há noutros sítios e gostar de chamar as coisas pelos nomes: um fino nunca foi uma imperial, não há cruzeta que venha a ser cabide, nem há estrugido que possa ser tratado por refogado.
O Porto tem a melancolia dos amores que são para sempre: parece desenhado, melancólico e projeta sombras incríveis que — tenho a convicção — o sol só lhe dá a ele.
O amor traz destas cegueiras que nos permitem apreciar defeitos. É por isso que o mar pode vir gelado e ser um puzzle de rochas difíceis de desencaixar, o vento até pode vir de Norte e ser preciso travá-lo, mas não há cheiro a sargaço como aquele.
Ser do Porto e não viver no Porto converge na simbiose que é encontrar alguém que tem a mesma base. Bastam minutos de conversa para saber que o código geográfico é comum e que o ADN não se vinca só no sotaque, já que o mais bonito transborda na maneira de estar.
A saudade é uma palavra tão repetida que até já soa vulgar, por isso, enquanto me contorço de dores por não lhe encontrar sinónimo, a verdade é que a falta que as pessoas nos fazem pode ser traduzida em lugares, se eles nos encherem de sensações.
Ser do Porto é sentir a cidade como uma tatuagem que nunca precisou de estar desenhada. Confesso que não encontro esta necessidade de proteger este pintainho debaixo da asa (sem nunca ninguém nos pedir para isso) nas pessoas que nascem noutros lugares. Confesso que amigos de cidades tão diferentes não as defendem com metade da convicção que carrega esta pronúncia do Norte a que os “tontos chamam de torpe”.
Vão e vêm: são assim os estudos com dados estatísticos sobre a vida, como se ela pudesse ser tratada em gráficos. Esta semana, surgiu mais um: o Porto é a cidade mais amada pelos seus habitantes. Fica no topo da lista, adianta-se a Hamburgo, passa Colónia, finta Munique e ganha a Barcelona. Qualquer sentimento semelhante a este é mais bonito em imagens do que em todas estas palavras. E não é preciso nenhum gráfico para medir.