Mundial no Qatar em 2022 ensombrado pela corrupção

Atribuição dos Mundiais de futebol de 2018 e 2022 à Rússia e ao Qatar continua sob investigação. Condições de trabalho dos imigrantes e temperaturas elevadas no Verão também alimentam polémica.

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Joseph Blatter assume que escolha do Qatar para o Mundial de 2022 foi um erro Fabrice Coffrini/AFP

“Sim, foi um erro, mas, na vida, cometem-se muitos erros.” Foi o próprio Joseph Blatter, presidente da FIFA, que, em Maio passado, classificou desta forma a decisão de atribuir o Mundial 2022 ao Qatar, anunciada a 2 de Dezembro de 2010, no mesmo dia em que a Rússia ganhou a votação para 2018. “O relatório técnico sobre a candidatura do Qatar dizia claramente que [o clima] era demasiado quente, mas o comité executivo, por larga maioria, decidiu que ia ser no Qatar”, prosseguiu o líder da FIFA na mesma entrevista.

Quase quatro anos depois da decisão, o Mundial 2022 está a sofrer um escrutínio público à escala global, com acusações de corrupção no processo de votação e de violações dos direitos humanos no Qatar quanto às condições laborais de quem está a trabalhar na construção das infra-estruturas. Basicamente, o que seria uma estratégia de propaganda para dar boa imagem internacional do país está a transformar-se num pesadelo de relações públicas.

“Acho que, nesta altura, o Qatar quase que desejaria devolver o Mundial, porque ficou com o que não queria. Em vez de prestígio internacional, o mundo está a olhar para o país como um regime autocrático com más leis laborais”, diz ao PÚBLICO Jonathan Grix, investigador britânico da Universidade de Birmingham. A imprensa internacional tem referido casos de exploração de imigrantes, nas construções com vista ao torneio, submetidos a condições de trabalho desumanas, com longas horas de trabalho ao sol – que terão resultado, segundo dados revelados pela imprensa britânica, na morte de 1200 destes operários nos últimos quatro anos.

A própria FIFA está sob escrutínio devido às acusações de corrupção que envolvem vários dirigentes do futebol internacional e o qatari Mohamed bin Hammam, antigo presidente da Confederação Asiática de Futebol (e antigo adversário de Blatter nas eleições para a presidência da FIFA em 2011, não tendo chegado a ir a votos), e que também inclui uma troca de favores com a Rússia para o Mundial 2018. A FIFA já lançou uma investigação sobre estas alegações e, pela voz de Jim Boyce, um dos seus vice-presidentes, até admitiu que poder haver uma nova votação para o torneio de 2022, se ficar provado que houve compra de votos. “Seria um enorme golpe para a FIFA se isto acontecesse, mas, de um ponto de vista profissional, considero que uma nova votação seria uma solução justa neste caso”, refere Kenneth Cortsen, da Universidade de Aarhus.

Não são apenas as violações dos direitos humanos e as alegações de corrupção que fazem sombra ao que poderá ser, daqui a oito anos, o primeiro Mundial de futebol no Médio Oriente. A própria geografia do país faz com que no Verão (altura em que os Mundiais de futebol se disputam) se atinjam temperaturas a rondar os 50 graus. A solução apresentada pela organização são estádios fechados com ar condicionado, enquanto a FIFA está ainda a estudar a possibilidade de mudar o torneio para Novembro ou Dezembro, o que implicaria uma reorganização dos calendários internacionais.

Pode o Qatar perder a organização do Mundial? “Tanto quanto sei, legalmente seria muito difícil de o fazer”, refere Jonathan Grix. Mas a FIFA pode ter muito mais a perder ao manter o torneio no Qatar, a julgar pelas posições públicas tomadas pelos seus patrocinadores. “Isto não é bom, nem para o futebol, nem para a FIFA, nem para os seus parceiros”, disse recentemente a marca de equipamentos desportivos Adidas, parceiro de longa data da federação internacional, com quem tem um acordo até 2030. Na imprensa internacional surgiram rumores de que a FIFA teria pedido aos EUA para estarem preparados para receber o torneio (que já receberam em 1994), mas tanto o organismo liderado por Joseph Blatter como a federação norte-americana negaram que tal fosse verdade.

Numa entrevista recente à Al-Jazeera, Nasser Al Khater, director de comunicações do Comité Organizador do Mundial 2022, disse que a organização do torneio não tem nada a esconder. “O que está a decorrer é uma investigação a 2018 e a 2022. O Qatar faz parte e a Rússia também. Estamos confiantes e temos confiança na forma como nos comportámos”, declarou Al Khater, distanciando-se de Bin Hamman – “nunca fez parte da nossa candidatura” - e garantindo que o comité está atento às alegações de violação dos direitos humanos dos operários estrangeiros que estão no país. Quanto a uma eventual mudança de datas por causa do calor, Al Khater diz que a organização está preparada para tudo: “Vamos receber o Mundial de 2022, seja no Inverno ou no Verão.”

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