Cessar-fogo no Leste da Ucrânia é teórico, frágil e ameaçado a toda a hora

Depois do derrube de um helicóptero, Poroshenko admitiu pôr fim à trégua. Exército diz que ataques se sucedem. Separatistas devolvem acusações às forças ucranianas.

Foto
Efeitos dos bombardeamentos em Slaviank, na região de Donetsk JOHN MACDOUGALL/AFP

O derrube de um helicóptero militar ucraniano que causou a morte de nove soldados, na terça-feira, levou o Presidente, Petro Poroshenko, a admitir pôr fim mais cedo do que o previsto à trégua anunciada como o primeiro passo de um plano de paz. Mas o cessar-fogo unilateral anunciado até sexta-feira vai manter-se, anunciou o ministro dos Negócios Estrangeiros, Pavlo Klimkin.

Isto apesar de as acusações das partes darem a entender que a trégua é essencialmente teórica. O Exército denunciou violações “em massa” e acusou os pró-russos de mais de 40 ataques a postos de controlo e posições militares em dois dias. Um dos líderes separatistas, Alexander Borodai, primeiro-ministro da autoproclamada república de Donetsk, faz a acusação contrária: de serem as forças governamentais quem tem estado na ofensiva.

A situação na Ucrânia está no centro de múltiplas movimentações diplomáticas. Esta quarta-feira realizou-se uma conversa telefónica de Poroshenko com o Presidente russo, Vladimir Putin, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o Presidente francês, François Hollande e todas as partes concordaram em continuar este tipo de conversação telefónica na quinta-feira. Segundo a presidência francesa, Merkel e Hollande apelaram aos líderes russo e ucraniano para "trabalharem em conjunto" numa conversa que durou "mais de uma hora"

Na terça, o diálogo do Presidente ucraniano foi com o vice-presidente norte-americano, Joe Biden, que defendeu a presença de “observadores no terreno que constatem as violações” e apelou ao fim do “fornecimento de armas e de militares vindos do outro lado da fronteira”. Na quarta-feira foi o secreário de Estado John Kerry que pediu a Putin "actos concretos" para pôr fim à crise no Leste da Ucrânia.

Os confrontos entre pró-russos e forças regulares, que já terão causado para cima de 400 mortos, foi o tema central de uma reunião da NATO. O secretário-geral, Anders Fogh Rasmussen, citado pela Reuters, disse “não ver mudança” no posicionamento da Rússia e a aliança atlântica manteve a suspensão da cooperação com Moscovo, que decidiu após a anexação da Crimeia, em Março.

O cenário de agravamento das sanções à Rússia está também em cima da mesa. Numa conversa telefónica, o Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o primeiro-ministro britânico, David Cameron, admitiram-no, caso as autoridades de Moscovo não tomem medidas para “acalmar a situação”. Também Merkel, que considera “corajoso” o cessar-fogo de Poroshenko, admite sanções. “O progresso é lento. As soluções diplomáticas são sempre preferíveis, mas, se nada mais resultar, as sanções podem voltar à agenda.”

Olhada pelos países ocidentais como a causadora da instabilidade na Ucrânia, a Rússia entende que devem ser valorizados os “sinais positivos” que entende estar a dar. Mais concretamente, refere-se à revogação da autorização dada em Março para uma intervenção militar das suas forças no país vizinho, aprovada esta quarta-feira pela câmara alta do Parlamento – com 153 votos a favor e um contra.

A fragilidade do processo é, porém, evidenciada pela declaração de um dos eleitos russos que votaram o pedido do Presidente Vladimir Putin. Citado pela Reuters, Viktor Ozerov considerou a decisão um gesto de boa vontade para facilitar os esforços de paz, mas não excluiu uma eventual reversão da medida. “Se o Presidente necessitar de tomar medidas de natureza militar, o Conselho de Defesa da Federação e o Comité de Segurança estão prontos a considerar rapidamente uma tal decisão”, disse.

O contraponto ao discurso de maior firmeza tinha sido anteriormente dado pelo chefe adjunto da diplomacia russa, Grigori Karassine. “Esperamos que os sinais positivos que o Presidente russo envia sejam ouvidos no mundo e sobretudo na Ucrânia”, disse, citado pelas agências. “As decisões adequadas serão agora tomadas pela discussão entre [o Governo de] Kiev e as autoridades do Sul e do Leste da Ucrânia”, acrescentou.

A reacção de Kiev chegou por Pavlo Klimkin. “Acreditamos que é um passo positivo, mas precisamos de outros passos positivos”, disse.

Sugerir correcção
Comentar