Quando o futebol é mais do que um jogo

Um Fio de Jogo é uma peça de teatro escrita por Carlos Tê, encenada por Luísa Pinto e interpretada por Pedro Almendra. Está em cartaz no Cine-Teatro Constantino Nery, em Matosinhos, até 15 de Junho.

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Um Fio de Jogo, um monólogo, interpretado por Pedro Almendra, e encenado por Luísa Pinto PEDRO GRANADEIRO/NFACTOS
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Um Fio de Jogo, um monólogo, interpretado por Pedro Almendra, e encenado por Luísa Pinto PEDRO GRANADEIRO/NFACTOS
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Um Fio de Jogo, um monólogo, interpretado por Pedro Almendra, e encenado por Luísa Pinto PEDRO GRANADEIRO/NFACTOS
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Carlos Tê PEDRO GRANADEIRO/NFACTOS

É esta a questão a que Carlos Tê pretende responder com Um Fio de Jogo, um monólogo, interpretado por Pedro Almendra, e encenado por Luísa Pinto, que está em cena no Cine-Teatro Constantino Nery, em Matosinhos, desde a semana passada, e sempre de quarta-feira a domingo, até ao próximo dia 15 de Junho.

Bill Shankly, ex-jogador do Liverpool, já tinha tentado exprimir o seu sentimento para com o futebol ao afirmar que este é “mais do que uma questão de vida ou morte”. Em Um Fio de Jogo, Carlos Tê foi ainda mais além. Aproveitando a sua experiência como escritor e adepto, o autor desenvolve argumentos, comprova com histórias e traduz por palavras esta empatia pelo “desporto rei”, que irrompe barreiras sociais numa euforia orquestral e unissonante há já várias décadas.

Graças a este significado intemporal do futebol, a peça, que foi “elaborada para o Euro 2004”, acabou por sair do papel – embora “parcialmente reescrita” – dez anos depois, explica Carlos Tê ao PÚBLICO no decorrer do ensaio para a imprensa. O autor salienta que esta decisão foi tomada em virtude da “aproximação do Campeonato do Mundo”, o que não poderia ser mais oportuno, dados os laços entre a filosofia da obra e o futebol “canarinho”.

Juninho Paranapanema, uma das personagens-tipo do monólogo, é a personificação do jogador humilde, que nasceu no “sertão brasileiro” e veio para a Europa em busca do seu sonho. O seu vocabulário mesclado e repleto de preciosismos linguísticos, a sua paixão por feijão e as suas raízes religiosas são alguns dos clichés que Pedro Almendra incorpora para sublinhar a importância do futebol, que foi protagonista nas vidas de milhares de jovens desde a infância.

E são exactamente essas raízes que unem quatro personalidades tão distintas. Apesar das diferenças entre Juninho, com o seu sorriso maroto, o treinador, e seu fato Hugo Boss, o comentador, e o discurso intelectual e transcendente, e o radialista, com a sua filosofia imaterial sobre o desporto, todas as personagens se reencontram na infância. Todas amam o futebol como um membro da própria família, porque, de facto, sempre o foi.

“O futebol tem esse lado mítico, de coisas que passam de geração em geração, por isso é tão fascinante e misterioso”, diz o autor. “Conheci muitos amigos, que o único assunto que tinham para falar com o pai era o futebol, numa época em que a distância de gerações era muito grande [anos 60] ”, acrescenta. E é por este motivo que a raiz é o início e o fim de Um Fio de Jogo. A pergunta e a resposta. O problema e a solução. Carlos Tê explora o futebol não só como um desporto, mas também como uma filosofia de vida.
 
Bola de ouro

Enquanto reescrevia o texto, e “não sabia por onde começar”, o autor adoptou uma frase de Nilton Santos – considerado pela FIFA o melhor lateral-esquerdo de todos os tempos: “Eu sou amigo de infância de todas as bolas do mundo”. Para além de dar a entender a relevância da infância e das origens, Carlos Tê coloca a bola num patamar central. As personagens falam para a bola, agradecem à bola e amam a bola. A bola é o estandarte do futebol, é o instrumento que faz o humilde tornar-se rei.

As mais variadas referências futebolísticas, como Garrincha, Pelé, Eusébio, Tostão, Didi, Vavá, Di Stéfano, Diego Maradona, entre muitas outras, não são feitas para enaltecer as estrelas, mas as suas origens, as suas raízes, que, no fundo, são as raízes do futebol. O autor mostra ao público o seu olhar cirúrgico do mundo da bola, conta histórias verídicas dos mitos – os seus amuletos, crenças e superstições – para que a “pelota” entre na baliza, fala das fundações do desporto, no pé do “menino” do terreno baldio, e dá um significado sui generis à expressão “bola de ouro”, numa obra pintada de vermelho e amarelo.

Carlos Tê, em apenas um “fio”, conjuga os sentimentos mais arcaicos com um debate filosófico em relação ao futebol, num monólogo soberbo que explica o porquê de personagens completamente diferentes vibrarem em prol de um objecto tão simples, como uma bola.

 

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