Diz-se muito por aí que uma criança precisa de dois pais. Então e duas crianças, de quantos pais precisam? É que dois pais para duas crianças parece um conjunto harmonioso, o arranjo perfeito, mas é um combate desigual. Porque as crianças são micro-criaturas, mas têm uma energia exponencialmente maior que a dos adultos. Nem tem comparação. As crianças têm uma concentração energética comparável a um átomo de urânio.
Aliás, as centrais nucleares deviam ser alimentadas a crianças. Se se pusessem crianças a chocar umas contra as outras — bem sei que não é muito pedagógico —, mas se fosse possível tenho a certeza que se produzia muito mais energia do que nas centrais nucleares convencionais. Como um bom físico nuclear explicaria:
— Ora bem, o processo passa por colocar uma data de crianças num espaço muito reduzido e esperar que elas choquem umas com as outras. O que não é difícil. Cá está! O Joãozinho chocou de frente com a Madalena e produziu-se uma libertação energética equivalente a 5 x 10¹¹ kJ, o suficiente para abastecer cerca de 50.000 lares portugueses durante um ano.
— Mas elas não se magoam?
— É incrível, mas nem por isso. E os ganhos energéticos são muito significativos.
Explora-se a energia das ondas, a energia eólica, falta a energia das crianças. Para quando um automóvel movido a crianças? E se as crianças são átomos de urânio, os adultos são átomos de merda. Já não há lá energia nenhuma para espremer. O que há é uma amálgama calórica que se vai desfazendo aos poucos até à podridão final.
Portanto, quando se diz que uma criança precisa de dois pais, não é bem essa a formulação correcta. Uma criança precisa, no mínimo, de dois pais. Porque por vezes é preciso reforços. Tal como os forcados, às vezes é preciso mais um para domar o animal. Há crianças que precisam de cinco pais e um rabejador. Devia haver uma comissão de avaliação que decidisse quantos pais deveria ter uma criança. Sentenciaria: “O Luisinho, que é um átomo de urânio-235, precisa de três pais nos dias normais e de sete nos dias em que parece que engoliu meio quilo de vespas.”
A teoria das famílias numerosas está completamente invertida. Uma família não devia ser numerosa por ter muitos filhos, mas por ter muitos pais. Comprava-se um carro de família, não para pôr as cadeirinhas das crianças, mas para pôr os pais todos lá dentro. “Vá, toca a entrar. Ora bem, um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete. Estão todos?” “Não, falta o André.” “Ah, é verdade, falta a criança.”
O que dizer então dos pais e mães solteiras. São autênticos super-heróis, seres sobre-humanos. Os pais e mães solteiras competentes deviam ser beatificados. Deviam ter direito a um mausoléu imediato. A ser agraciados com a Ordem do Peixe Espada ou lá o que é. Acho que seria da mais elementar justiça ouvir o seguinte nas notícias do Vaticano: “O papa beatificou hoje os três pastorinhos, uma freira francesa e duas mães solteiras.”
E agora devia terminar com qualquer coisa redentora, dizendo que apesar de tudo vale a pena ter dois filhos. Mas a única coisa que me ocorre é a seguinte pergunta: Para quando a adopção de pais? É que eu talvez precise de uma meia dúzia.