Há notícias que se repetem ciclicamente e que não deixam de me surpreender. Por exemplo: "explosão em fábrica de pirotecnia” ou “morreu homem mais velho do mundo/mulher mais velha do mundo”.
Estas duas notícias são particularmente populares e eu acho que esta malta das notícias sonha secretamente com a notícia perfeita, uma espécie de fórmula alquímica noticiosa, que seria qualquer coisa como: “Homem mais velho do mundo explode em fábrica de pirotecnia.” Assim juntava-se o útil ao agradável.
O que acho mais surpreendente nas notícias do homem ou da mulher mais velha do mundo é que ficamos genuinamente espantados com a morte destas pessoas.
Porque, geralmente, a primeira notícia que surge não é a da morte, é a que dá conta que “mulher mais velha do mundo vive no Japão e tem 120 anos”. E pensamos: “Esta mulher resiste a tudo. É imparável.” Mas eis que logo a seguir ela morre e ficamos a pensar: “Como é que é possível? Ainda agora tinha 120 anos e já morreu?”
Eu pelo menos fico sempre com uma certa sensação de frustração. Como se de repente 120 anos não fosse muito. “O quê, só 120 anos? Podia ter dado mais um bocadinho. Quem faz 120, faz 130. Estes japoneses são uma treta.”
O que exigimos no fundo deste pessoal longevo é o recorde. No mínimo. Achamos que se a pessoa bateu o recorde de idade, muito bem, cumpriu a sua missão. Morreu bem. Se não bateu, então porque raio morreu tão tarde? Não serviu de nada tanta decrepitude. Aliás, é por isso que não percebo o porquê de tantas notícias sobre a morte de uma pessoa centenária, porque no fundo o que queremos ouvir é: “Chinoca bate recorde de idade!” Com ponto de exclamação a condizer. E pronto. Mais nada. Até pode ser a pessoa mais velha do mundo no momento, mas se não bateu recordes, não interessa. O que pretendemos secretamente é que isto funcione como uma espécie de modalidade olímpica. Por exemplo, se o título da notícia for “Morreu homem belga de 116 anos”, sem mais, a informação não vale a pena. Mas se for “Homem belga bate recorde europeu de idade”, então já temos notícia. Porque já temos recorde. É nesta perspectiva que as notícias devem ser dadas. Ok, pessoal do jornalismo? Numa perspectiva competitiva, desportiva. Dá logo outro sal à coisa. Dou mais uns exemplos de bons títulos, para ver se isto fica assimilado: “Batido recorde europeu de idade em pista coberta”, porque há sempre aquelas pessoas que morrem de ataque cardíaco a ver desporto. Mesmo que seja só com 83 anos, se for recorde de pista coberta, já serve. “Matusalém acusado de doping”, etc. Percebido?
Quanto à pirotecnia o que me surpreende é que ainda haja fábricas de foguetes. Penso: “Mas ainda há disto? E explodem?” Parece uma piada de mau gosto. Ou melhor, o que realmente surpreende é que haja fábricas de foguetes em tal monta, que dê para tantas explodirem. Em todo o caso, o que peço aos jornalistas é que não cessem de me surpreender. Porque é de notícias deste calibre que precisamos para manter a pestana aberta na viagem de comboio matutina.