Jovem e Bela

Charlotte Rampling é convocada para uma aparição. Charlotte era a mulher de Sous le Sable, o filme de François Ozon que mais trabalhava contra o miniatural para que tende o cinema do realizador. Charlotte como que abençoa, com a sua presença, Isabelle e Marine Vacht, personagem e intérprete de Jovem e Bela. Isso pode dizer algo sobre o último Ozon. Sobre a sua coabitação com a escuridão. É perturbante, coisa que raramente se pode dizer de um filme do cineasta - talvez não se possa dizê-lo desde 2001, precisamente desde Sous le Sable. Apesar de Isabelle ir ao encontro do seu psicanalista, e não haver ironia alguma do filme nisso, nada vai servir para explicar as razões desta forma de uma adolescente de 17 anos que, em quatro estações e outras tantas canções de Françoise Hardy, se prostitui, querer vivre sa vie - como o título do filme de Godard que Ozon viu (também viu Belle de Jour, de Buñuel: Marine na cama faz “aparecer” na memória do espectador Catherine Deneuve na cama). O que “explica” o filme é, por isso, a potência do inexplicável: silenciando-se sobre as justificação, faz-se suficientemente “branco” para ser invadido por projecções. Há qualquer coisa da ordem da clarividência, do aboutissement, nos planos finais deste percurso de Isabelle até aos seus clientes, pontuado pelas cápsulas amorosas de Hardy, luminosas e intensamente tristes. É a luz da escuridão que ilumina - plano final, depois, obviamente, de Marine Vacht se ter cruzado com Charlotte Rampling.

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