De novo o bullying
O bullying é um dos temas favoritos da comunicação social. Continuam a surgir notícias sobre agressões, comportamentos sexuais violentos, provocações e insultos nas nossas escolas, como se o território escolar fosse um local onde a violência é constante e universal.
Esta leitura apressada de alguns acontecimentos acaba por dar uma visão negativa dos nossos estabelecimentos de ensino; e ignora o esforço dos professores e directores que, todos os dias, lutam para melhorar o clima escolar.
Os dados científicos de que dispomos sobre a violência nas nossas escolas demonstram que os comportamentos violentos graves não são frequentes e que os estudantes, na sua maioria, se sentem bem no território escolar. O que existe é uma indisciplina crescente na sala de aula e situações isoladas de extrema agressividade que devem merecer uma atenção especial.
Em 19 de Março, o PÚBLICO escrevia em título: “Mais de 60% de alunos confirmam casos de bullying nas suas escolas”. A notícia referia-se a um inquérito a 1963 alunos, entre os 12 e os 15 anos, de nove concelhos, a quem foi feita a pergunta “directa”: “Há bullying na tua escola?”
A iniciativa da Associação EPIS (Empresários pela Inclusão Social) é louvável, mas necessita de enquadramento e apoio técnico. O problema começa na pergunta “directa” atrás referida, porque sabemos como muitos estudantes não sabem distinguir bullying de brincadeiras e pequenas provocações que caracterizam o convívio saudável em território escolar.
Bullying é o conjunto de comportamentos de humilhação e provocação, continuado e sistemático, exercido por um estudante (ou grupo de estudantes), sobre um colega (ou grupo de colegas). Bullying não é, assim, uma série de piadas ou provocações dispersas, nem interacções mais agressivas e episódicas sobre vários estudantes. Bullying envolve sempre controlo e poder — mantidos — dos mais fortes em relação aos mais fracos (física e/ou psicologicamente).
Há 50 anos, no Liceu Pedro Nunes, círculos de alunos, gritando “Porrada! Porrada!”, rodeavam dois rapazes em luta feroz, donde não raro brotava sangue. Tudo acabava numa ida ao reitor e, passados uns dias, outros protagonistas ocupavam a cena. No silêncio do pátio, contudo, também havia bullying : contra o estudante tido como homossexual, ou contra o magrinho que fugia dos confrontos.
Na mesma notícia, a deputada Rita Rato “recomenda a criação de gabinetes pedagógicos nas escolas (…) compostos por um psicólogo, um assistente social, um animador sociocultural e um representante dos professores e alunos”. Trata-se de uma intenção louvável, mas pouco realista: não vai haver dinheiro para contratar tanta gente; há risco de burocratizar aquilo que deveria ser uma iniciativa flexível de cada escola ou agrupamento; e, sobretudo, muitas escolas já têm gabinetes de apoio aos alunos, que deveriam ser dinamizados e melhorados, ao contrário do que tem acontecido com o actual Governo.
Precisamos compreender que a luta contra o bullying não passa só por gabinetes e psicólogos: que pode fazer um técnico de saúde mental, sozinho, numa escola caótica? O percurso faz-se lado a lado com os estudantes: já repararam que, para um pequeno grupo de agressores e vítimas, há centenas de jovens que a tudo assistem sem nada fazer? Uma comissão que os envolva numa verdadeira campanha é o caminho.