Elefantes avaliam risco ligado a presença humana a partir da voz

Os elefantes parecem ser exímios em determinar o nível de ameaça decorrente de uma presença humana com base em subtis sinais vocais, reveladores da etnicidade, sexo e idade desses seus potenciais predadores.

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Um grupo de elefantes atravessa uma planície numa reserva natural do Quénia Laszlo Balogh/REUTERS

A equipa de Karen McCombe, da Universidade de Sussex (Reino Unido), e colegas no Quénia estudaram as reacções de elefantes – que vivem no estado selvagem em território queniano, no Parque Nacional de Amboseli – às vozes de elementos das etnias Maasai e Kamba, comunidades humanas locais. Acontece que os Maasai criam gado e que, por isso, envolvem-se periodicamente em conflitos violentos com os elefantes na disputa pela água e pelas pastagens, matando os paquidermes com lanças em retaliação quando há morte de homens. Os Kamba, pelo seu lado, cultivam a terra e não costumam ter este tipo de confronto com os elefantes do parque.

Com base em estudos anteriores, explicam os autores, sabia-se que os elefantes consideram os Maasai muito mais ameaçadores do que os Kamba. Em particular, a apresentação de roupas previamente vestidas por uns e por outros suscita-lhes reacções de medo só no caso dos Maasai – e a cor vermelha das vestes habituais desta etnia também provoca reacções de agressividade nos animais. Ou seja, ao que tudo indica, os elefantes são capazes de avaliar o risco da presença de humanos em função de indicações visuais e olfactivas associadas à etnia.

Os cientistas quiseram agora saber se os elefantes, “talvez a presa dos humanos mais avançada do ponto de vista cognitivo” – também se baseavam em indícios auditivos para avaliar a ameaça humana. Isto, segundo eles, teria a vantagem adicional de permitir uma reacção defensiva por parte dos elefantes mesmo antes de haver qualquer contacto visual ou olfactivo com o potencial predador – e ainda de lhes poupar stress fisiológico, movimentações e interrupções das suas rotinas de vida caso fossem desnecessários. “Os predadores humanos representam um desafio particularmente interessante para os elefantes, na medida em que grupos humanos diferentes podem significar níveis de perigo radicalmente diferentes para os animais que vivem por perto”, diz Karen McCombe em comunicado da sua universidade.

Quarenta e sete famílias de elefantes foram expostas a 35 gravações diferentes da frase “Olhem, olhem para ali, vem aí um grupo de elefantes!”, dita “num tom claro e descontraído” por dez homens, dez mulheres e cinco rapazes de língua Maasai; e por dez homens de língua Kamba. As famílias de elefantes são compostas por fêmeas relacionadas entre si e as suas crias e são lideradas pela fêmea mais velha ou “matriarca”.

As gravações de voz humana eram emitidas a uns 50 metros de cada grupo de elefantes através de um altifalante “camuflado por detrás de uma barreira de folhas de palmeira”, lê-se no artigo. As reacções dos animais eram observadas com binóculos e registadas em vídeo.

Os resultados mostram que, ao ouvir vozes de homens Maasai, os elefantes eram mais susceptíveis de apresentar reacções defensivas – tais como agruparem-se de forma mais compacta ou levantarem e baixarem a tromba para cheirar as emanações do potencial predador – do que ao ouvir vozes de homens Kamba.

“A linguagem humana é rica em indicações acústicas”, diz o co-autor Graeme Shannon. “E a capacidade de distinguir entre os homens Maasai e Kamba a dizer a mesma frase, cada um na sua língua, sugere que os elefantes conseguem distinguir várias línguas.”

E essa capacidade diferenciadora não pára aí. É que nem todos os Maasai foram considerados igualmente ameaçadores pelos elefantes: as vozes de mulheres e de rapazes Maasai não provocaram respostas defensivas tão fortes como as vozes dos homens daquela etnia. Por outro lado, as vozes dos homens, mesmo distorcidas para parecerem femininas, continuaram a ser vistas como ameaçadoras pelos animais.

Isto sugere, segundo os autores, que os elefantes conseguem discriminar não apenas a língua falada pelas pessoas, como também o seu sexo e a sua idade. “A capacidade de distinguir um perigo real de um perigo aparente é altamente adaptativa (…) e os nossos resultados deveriam suscitar estudos semelhantes noutras populações de animais com uma longa história de coexistência com os humanos”, concluem.

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