A partir de hoje, a cidade de Lisboa é "co-gerida" pela câmara e pelas freguesias

As 24 juntas de freguesia da cidade são agora responsáveis pela limpeza e varredura das ruas, por espaços verdes, passeios, equipamentos desportivos, escolas e mercados.

Foto

“A cidade deixou de ser gerida só pela câmara”, constatou António Costa, afirmando que, a partir de agora, Lisboa tem “um regime de co-gestão”.

Como forma de assinalar essa nova realidade, os 23 presidentes de junta presentes na cerimónia, que se realizou nos paços do concelho, receberam cada um uma chave da cidade de Lisboa. “É algo que tem sido exclusivo do município e que, por direito próprio, tem de passar a ser de todos nós”, justificou António Costa, que, simbolicamente, escolheu entregar a primeira chave a José Moreno, que preside à freguesia do Parque das Nações, nascida com a reforma administrativa de 2012.

No seu discurso, o presidente da Câmara de Lisboa sublinhou que essa reforma foi feita com base num “amplo acordo político”, entre o PS e o PSD, e “em concertação social”, que é como quem diz em diálogo com os três sindicatos que representam os trabalhadores do município. António Costa acrescentou que esta é “uma oportunidade histórica” para demonstrar que é possível fazer uma reforma com base nesses dois pressupostos, mas também para acabar com “a ideia absurda que existe no país de que o dinheiro entregue às autarquias é mal gerido”.

O autarca socialista não perdeu a oportunidade para frisar que o seu objectivo desde o início deste processo é que esta seja “uma dupla descentralização”. “Já fizemos a parte que nos compete”, disse, lembrando que espera agora que o Governo liderado por Pedro Passos Coelho entregue à Câmara de Lisboa o policiamento do trânsito e a gestão dos transportes públicos.

“Queremos dizer ao Estado que é altura de partilhar o poder com o município”, disse, garantindo que, se aquelas competências passassem para o município, este iria exercê-las “com mais eficiência” do que a administração central.

“Sou um adepto da descentralização e sobretudo um municipalista. Acredito que os municípios têm capacidade para ser mais eficientes na gestão dos recursos públicos”, reagiu o vereador António Prôa em declarações ao PÚBLICO. O autarca social-democrata considera “evidente que Lisboa ganhará em ter no seu seio a capacidade de gerir o trânsito”, mas é menos peremptório em relação aos transportes públicos.

“É importante o município ter um papel muito importante na gestão”, admitiu António Prôa, ressalvando no entanto que tal “não tem de significar necessariamente que a Carris e o Metropolitano de Lisboa passem a ser empresas municipais”. "O fundamental é que o município possa influenciar a sua gestão e desenvolvimento, o que neste momento não acontece", rematou.  

Quanto à assinatura dos autos de transferência de competências para as juntas de freguesia, o vereador do PSD considerou que este foi, "simbolicamente e substancialmente", um momento "muito importante" não só para a cidade, mas também "para o país". "Em Lisboa foi possível o PSD e o PS entenderem-se. Era bom que isso servisse de exemplo a outras matérias estruturantes, como a natalidade e os fundos comunitários", afirmou António Prôa.

Já o vice-presidente da câmara considerou que este dia foi “o dia D da reforma administrativa de Lisboa”. “A partir de hoje, as juntas terão a responsabilidade integral da limpeza e varredura das ruas”, disse Fernando Medina, enunciando o conjunto de áreas que as freguesias assumiram esta segunda-feira: a manutenção de mais de 1280 espaços verdes e de mais de 1500 quilómetros de passeios, a gestão de mais de 100 equipamentos desportivos, de mais de 150 espaços de jogo e de recreio, de mais de 120 escolas e jardins-de-infância e de mais de 28 mercados e feiras.

Nesse sentido, 1048 trabalhadores do município transitaram já para as juntas de freguesia, que, com a assinatura dos autos de transferência, viram desbloqueadas as segunda, terceira e quarta tranches dos 68 milhões de euros que receberão este ano para fazer face às novas competências.

Segundo Fernando Medina, que tem os pelouros das Finanças e dos Recursos Humanos, segue-se “um mês intenso, em que se finalizarão os próximos passos” desta reforma administrativa. Segundo disse, no fim de Abril as juntas passarão a receber as receitas relativas aos mercados, no fim de Maio serão transferidos os cerca de 400 trabalhadores em falta e, no início de Junho, as freguesias passarão a exercer competências em matéria de licenciamento.

“O resultado para as finanças da câmara não é famoso”, admitiu o vereador, referindo-se aos 68 milhões de euros que antes eram do município e que, a partir daqui, passam a ser das juntas. “Mas temos a profunda convicção de que o resultado para a cidade é”, rematou o autarca socialista.

O presidente da Junta de Freguesia de Carnide, Fábio Sousa, foi o único ausente da cerimónia de assinatura dos autos de transferência de competências. Uma decisão que a junta comunista justificou num comunicado, em que salienta que “os órgãos autárquicos da freguesia sempre manifestaram a sua profunda discordância com todo este processo”.

Para a junta, aquilo a que se assiste é ao “esvaziamento de responsabilidades por parte do município” e ao “desmantelamento de grande parte dos serviços municipais”, como o de higiene urbana e a rede de bibliotecas municipais. Algo que, conclui o executivo comunista, “nada tem a ver com um verdadeiro processo de descentralização de competências”.

A junta presidida por Fábio Sousa lamenta ainda “a forma como a actual maioria na Câmara de Lisboa tratou e continua a tratar os trabalhadores”, promovendo “uma transferência sem diálogo, sem ouvir e sem ter em conta a opinião dos trabalhadores”. O comunicado termina dizendo que a ausência na cerimónia “não coloca em causa a assinatura do auto de transferência”.   


Sugerir correcção
Comentar