Nos tempos livres, Míriam Bettencourt é, desde Janeiro de 2011, “pet sitter” e “dog walker” em Lisboa. No último aniversário teve a felicidade de receber uma bicicleta Peugeot (tal como o seu primeiro carro), levezinha e com rodas grandes, com a mesma idade que ela. Até há pouco tempo, deslocava-se para o trabalho de transportes públicos, recorrendo ao carro à noite ou ao fim-de-semana. Mas, agora, leva a bicicleta todos dias para o trabalho e não tem problemas em usar saltos altos.
No ano passado tornou-se um exemplo de persistência, sonho, determinação e concretização. Sente-se bem a andar de bicicleta quando passa pelos carros — só com uma pessoa lá dentro — “entalados no trânsito e no pára-arranca”. Confessa que já deu por si a cantarolar várias vezes enquanto pedala — e nesses momentos “ninguém a apanha”.
De que formas usas a bicicleta à sexta-feira?
Como em todos os outros dias, para o trabalho do Alto dos Moinhos até ao Saldanha, para os "pet sittings" que faço por toda a Lisboa ou mesmo em lazer. Já dei a volta a Lisboa e realmente é maravilhoso como em meia hora atravessamos a cidade. Para terem uma ideia, demoro entre 15 a 20 minutos a chegar ao Saldanha de bicicleta todos os dias. Se for de metro demoro entre 30 a 40 minutos, se não tiver sorte a trocar de linha.
O que muda na tua vida nesse dia?
Pedalar muda muita coisa. Não há nada melhor do que deslocações rápidas porta-a-porta, com estacionamento gratuito. Ganhei tempo, energia e anos de vida por não perder autocarros, o metro, ou montes de tempo à procura de um lugar para o carro. Outra coisa boa é que na bicicleta arranjo sempre lugar sentado e não sou obrigada a viajar de pé. É a melhor forma de começar o dia, de manhã cedo, e é terapêutico no regresso a casa, depois de um dia em frente ao computador.
Alguns mitos (sobre a utilização da bicicleta) que tenhas vencido?
O clássico mito das subidas de Lisboa. Quem experimentou andar 100 dias de bicicleta em Lisboa já provou que é um mito e eu já provei, a pedalar todos os dias há mais de um ano. As subidas de Lisboa vencem-se de forma simples: sobe-se até onde se conseguir. Todos os dias se tenta mais um bocadinho e paramos quando acharmos que estamos a ficar sem fôlego. Fica-se surpreendido porque, afinal, até se consegue subir na bicicleta e a conquista de uma subida é uma sensação maravilhosa! Lembro-me que a primeira vez que subi a Alameda pensei: "Se consigo esta, consigo qualquer uma!". A partir daí já se venceu o pior obstáculo que, afinal, está na nossa cabeça. Mas se não estivermos para subidas nesse dia, descemos da bicicleta e subimos com a bicicleta à mão — o problema das pessoas é que nem a pé andam. Depois divertimo-nos na descida. Não há mal nenhum em fazer isto de vez em quando, se não estamos a treinar para a subida à Torre da Volta a Portugal.
O que poderias melhorar nos percursos que realizas?
Apesar de todas as diferenças, ainda há muita coisa a melhorar. Claramente, o piso da cidade de Lisboa, que tem uma disparidade de estradas lisas e de outras completamente esburacadas e remendadas, que são um terror. Mais vias partilhadas, nomeadamente nas verdadeiras auto-estradas que temos dentro de Lisboa, mais sinalização dedicada aos velocípedes — sim eles existem e ainda se ouve dizer que "não estamos habituados". O aumento das bicicletas está à vista em toda a cidade. Penso que isto será importante não só para quem conduz automóveis, mas também para quem pedala e mostra por onde se pode seguir em segurança. Outra coisa que me parece importante é que qualquer parque de estacionamento, nomeadamente os subterrâneos, tenha estacionamento para bicicletas, onde possam ficar resguardadas. Alguns sítios já têm, mas é preciso mais. Se dedicarem pelo menos um lugar de estacionamento vai dar para dez bicicletas.
Uma pessoa da praça pública que gostarias de ver a usar a bicicleta e porquê?
Qualquer pessoa famosa (ou não) que faça uma deslocação menor do que cinco quilómetros. Vão ficar surpreendidos. Comecem por ir beber um café, dar uma voltinha aos jardins e esplanadas de Lisboa, ou simplesmente ir visitar alguém. Gostaria de convidar também qualquer motorista de táxi a vir fazer um percurso destes simples. Penso que se passarem pela experiência entendem melhor o que é pedalar e podem passar a dar o exemplo aos outros automobilistas, nomeadamente, nas ultrapassagens que devem ser feitas a mais de um metro e meio do ciclista.
O que tens a dizer a quem diz que andar de bicicleta na sua cidade é impossível?
Desliguem o “complicómetro”. Experimentem! Não é preciso ser atleta ou ter uma bicicleta “xpto”. Qualquer uma com os pneus cheios dá. Sejam prudentes, respeitem o código da estrada e vejam os conselhos da MUBi. Podem também pedir ajuda a um "Bike Buddy" para começar a pedalar. Mas atenção, é muito divertido e correm seriamente o risco de passar a adorar e ficar apanhadinhos pelas bicicletas.