No final da primeira parte do Ninfomaníaca, Joe, a personagem interpretada por Charlotte Gainsbourg, diz “I don''t feel anything”. Esse parece o momento em que o murmúrio que se vai exalando do filme (ou do cineasta Lars, que tanto estará na personagem de Stellan Skasgard como na personagem de Charlotte) tem hipótese de ser libertado. Como uma declaração de impotência, porque a montanha pariu uma inofensiva enciclopédia sobre isso que será “filmar o sexo”. Como um suspiro final (mas virá ainda a segunda parte...), depois de tantas manobras de auto-citação, de Dogville logo no início, por exemplo, com o tratamento do espaço a funcionar como “espaço em branco” para todas as “projecções”, até à involuntária paródia, aquele pedaço com Uma Thurman, do Lars confrontacional do passado, passando por uma espécie de auto-crítica do cineasta sobre a sua obsessão pelo martírio das personagens femininas; com isto, e com o cinismo que mascara confissões e com o ruído Rammstein a sobrepor-se à fragilidade, Ninfomaníaca - Parte 1 é fundamentalmente um filme que sabe que é triste: a tragicomédia de Lars é o seu espectáculo íntimo em público estar a revelar-se mais tonitruante do que a sua virulência de cineasta (continuando Lars a ser tocante sobretudo nas confusões a que propositadamente se expõe, com alguma da pulsão S&M do Dogma 95, nas conferências de imprensa de Cannes...).
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