A Luz ovacionou Eusébio pela última vez
Milhares de pessoas e muita emoção na despedida do “Pantera Negra”.
Poucos minutos depois das 11h30 já as primeiras centenas de pessoas estavam na bancada central do Estádio da Luz que o Benfica abriu para quem quisesse prestar uma última homenagem a Eusébio. O cachecol do Benfica (mas também de outros clubes) e o guarda-chuva eram acessórios fundamentais e, mesmo à chuva, havia quem estivesse sentado na primeira fila, a guardar um lugar o mais próximo possível do relvado.
A enorme afluência obrigou a que fossem abertas as duas bancadas por trás das balizas. Vários milhares de pessoas (cerca de dez mil) estiveram presentes. Cantou-se por Eusébio: “Tu és o nosso rei”. O nome do “Pantera Negra” ecoou pelas bancadas que o viram jogar (não as actuais mas as do antigo Estádio da Luz) e vibraram com muitos dos seus golos.
A primeira ovação aconteceu quando o caixão de Eusébio foi coberto com uma bandeira do Benfica e colocado no carro funerário. Um momento acompanhado através dos ecrãs gigantes do recinto. Novo momento de emoção quando o carro entrou no relvado: as palmas duraram até o caixão ser colocado num púlpito no centro do relvado, após o que tocou o hino do Benfica.
Seguiu-se a realização do último desejo de Eusébio: dar a volta completa ao relvado do Estádio da Luz. Um momento sublinhado por muitos aplausos e com dezenas de cachecóis a serem arremessados para o carro funerário.
“Uma parte do Benfica morreu hoje”, disse Gonçalo da Costa no final da cerimónia. “Cresci com as imagens dele. Sei o que significou para o clube e para o país”, acrescentou, dando um exemplo dessa dimensão simbólica do “Pantera Negra”: “Fiz uma viagem nas Caraíbas e naqueles hotéis junta-se muitos turistas estrangeiros. Quando dizia que era português falavam-me no Eusébio e no Benfica”. “Tenho pena de não o ter visto jogar”, admitiu Gonçalo da Costa.
A derradeira despedida de Eusébio do Estádio da Luz, com a saída do carro funerário, foi um pico de emoção nas bancadas. Os aplausos soaram mais alto, as lágrimas foram difíceis de suster. Nos ecrãs gigantes passavam imagens do passado glorioso do “Pantera Nega”, os golos a preto e branco que construíram a lenda.
Muita gente concentrou-se cá fora junto à estátua de Eusébio. Mas, largos minutos depois do fim da cerimónia, Maria Adelaide e Maria de Fátima continuavam sentadas na bancada, os olhos lacrimejantes. “Está a ser um dia emocionalmente muito difícil”, confessou a última. “O Eusébio é uma figura do nosso tempo. Ao nos despedirmos dele lembramo-nos da memória dos nossos familiares, que também já partiram, e que começaram a trazer-nos para esta realidade do futebol”. E lembra um episódio: “O casamento da minha irmã mais velha foi no dia do jogo com a Coreia do Norte [do Mundial 1966]. E ela, vestida de noiva, a ouvir o jogo no transístor e a correr cá para fora, para ver os golos no ecrã!”
“Não podemos reduzir o Eusébio ao futebol. Foi uma figura social e política muito importante. Um símbolo de ouros tempos. Ele foi utilizado pelo Salazar, que nunca o deixou sair do Benfica”, apontou Maria Adelaide, evocando a “lição de vida” que o “Pantera Negra” deixa como herança: “Ela tinha uma humildade que não vemos nas pessoas que estão hoje no poder. Mas ver esta gente toda unida dá-me esperança que isto mude”.
Eusébio foi uma figura maior do que o futebol. Maior do que um clube, do que um país, do que a vida. Como se lia na moldura de uma fotografia colocada aos pés da estátua de Eusébio: “Os deuses são eternos”.