A urgência da construção de uma alternativa

A esta esquerda cabe dar o primeiro passo: unir-se onde tem estado dividida.

Há consensos, mas não há compromissos. É esse o problema. E é esta situação que urge superar através de um compromisso exigente de ação política concreta, positiva, que construa uma solução e não se fique pela oposição. O compromisso é uma das artes mais difíceis da política e da democracia. Os compromissos, ainda por cima, nunca caem do céu. Têm de ser demonstrados, reclamados, exigidos com voz forte. É isso o que se faz no manifesto 3D (Dignidade, Democracia, Desenvolvimento) para Defender Portugal. Não é mais tolerável que a esquerda que tem burilado os seus programas, cuidado da resistência e detalhado a denúncia, se agarre aos seus pergaminhos apenas para se reafirmar a si mesma, sempre pronta a sublinhar as diferenças que existem entre si mas pouco capaz de assumir as responsabilidades de ser alternativa e de governar, coisa que só pode fazer em conjunto. Esta esquerda fragmentária tem estado demasiado fixada em hipotéticas vantagens que amealhará em futuros longínquos e irrealistas, e sempre depois de desgraças. E tem estado muito pouco atenta ao povo, que a direita – que nunca hesita perante o poder – vai fazendo sofrer. A paralisia da esquerda perante a governação é o grande favor prestado à situação e à alternância que não é alternativa. Por isso, a direita está sempre perto da governação, que monopoliza. Isso permite-lhe sonhar que, quando estiver em minoria, sempre pode ser parceira de um PS que a outra esquerda hostiliza e muitas vezes lança para campos que não podem ser os seus. Ao contrário, uma esquerda empenhada em governar e em identificar os compromissos que servem o povo é uma condição maior para responsabilizar o PS perante os seus deveres e perante si mesmo. Trata-se, pois, de assumir que toda a esquerda pode governar porque sabe estabelecer acordos entre si. É esta a principal prioridade da ação política alternativa, hoje.

Perante uma esquerda fragmentária, há vários passos a dar, sucessivamente. O primeiro é um compromisso inicial entre quem mais imediatamente se deve unir: o BE, o Livre, as várias plataformas, organizações, individualidades e ativistas. Assim se pode reverter o ciclo infernal de paralisia e se pode mostrar que as soluções existentes à esquerda não podem continuar a ser desfeitas pela direita que as detesta e pela própria esquerda que recusa assumir o valor que elas têm. Depois há, evidentemente, outros passos a dar. Perante o PCP e o PS. Mas este é o momento de afirmar que não há, em Portugal, esquerda capaz de ser construtiva e governar o país sem uma exigência de caminho comum entre quem se foi dividindo sem se afirmar, sem reconhecer que a capacidade da esquerda está também em muita gente inquieta que, fora dos partidos, sabe agir e agirá. O que não pode persistir é o fechamento sistemático e contra naturam. A esta esquerda, cuja ação conjunta reclamamos, cabe dar o primeiro passo: unir-se onde tem estado dividida, declarar que é parte de uma solução.  

O movimento iniciado com este manifesto tem de sentar à mesa gente com voz audível, alargando-se, mobilizando ideias e pessoas. Será uma plataforma de ação política incontornável e não apenas uma proposta. É isto um movimento político. O propósito inicial é modesto: uma lista de convergência para as eleições europeias de todos os que se diminuirão e diminuirão a esquerda se forem sozinhos; uma lista que seja muito mais robusta do que alguma outra possa ser porque inclua todos os melhores valores e propósitos de ação que a sociedade foi capaz de gerar nestes anos de inferno que a direita obcecada leva no poder. Este objetivo é a condição de uma ambição mais ampla, em nome do povo. Está em causa saber quem a assume e quem, rejeitando-a, se diminui a si mesmo.

Professor da Universidade de Coimbra. Subscritor do Manifesto 3D
 
 

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