Apoiantes da Irmandade Muçulmana incendeiam edifícios da Universidade Al-Azhar

Nova vaga de repressão enterra esperanças de diálogo e mostra que Governo está apostado na erradicação do movimento islamista.

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Edifício da Universidade Al-Azhar KHALED KAMEL/AFP

A Human Rights Watch diz não ter dúvidas de que a decisão – anunciada quarta-feira, um dia depois de um atentado suicida, sem paralelo no Egipto desde os ataques contra locais turísticos na década de 1990 – é “politicamente motivada”. “Ao apressar-se a apontar o dedo à Irmandade Muçulmana sem qualquer investigação ou provas, o Governo parece unicamente motivado pelo seu desejo de esmagar aquele que é o maior movimento da oposição”, disse à Reuters Sarah Leah Whitson, directora da HRW para o Médio Oriente e Norte de África.

A Irmandade repudiou o atentado contra a esquadra de Mansoura, que fez 16 mortos, como tinha feito com todos os ataques lançados por grupos jihadistas desde o golpe militar que em Julho derrubou Mohamed Morsi, dirigente do movimento islamista e primeiro Presidente eleito do Egipto. Mas o Governo interino, tutelado pelos militares, acusa-a de instigar e financiar a violência, numa retórica secundada pela vasta maioria dos jornais e televisões – nesta semana um jornal pró-governamental escreveu na manchete: “O povo quer a execução dos irmãos.”

Ao abrigo da lei antiterrorismo, aprovada em 1992 por Hosni Mubarak, a punição prevista para os dirigentes da Irmandade Muçulmana pode ir até à pena de morte. Quem participar numa manifestação convocada pelo grupo arrisca cinco anos de prisão, a mesma pena prevista para quem “promova o grupo com as suas acções, ou palavras, que participe nas publicações ou gravações da organização terrorista”.

Mas a ameaça não impediu centenas de apoiantes do movimento islamista de voltar a sair à rua, depois das orações semanais de sexta-feira. Grupos que não se comparam às multidões que no Verão se manifestaram contra o derrube de Morsi – num sinal claro da eficácia de uma repressão que em poucos meses decapitou o mais poderoso movimento político do Egipto e fez milhares de mortos.

O Ministério do Interior revelou que 265 “elementos da Irmandade” foram detidos nas manifestações, que se juntam às dezenas presas no dia anterior. Houve confrontos no Cairo e em pelo menos outras quatro cidades do país, nuns casos opondo os manifestantes a polícias e noutros a grupos apoiantes do Governo. O Ministério da Saúde confirmou cinco mortos e mais de 80 feridos.

Neste sábado, a violência teve como palco a universidade de Al-Azhar, parte da mais influente instituição do islão sunita, onde estudantes islamistas terão tentado evitar que colegas entrassem no edifício para realizar exames. A televisão estatal noticiou que “estudantes terroristas” atearam fogo às faculdades de Economia e Agricultura, desencadeando uma intervenção da polícia. Um dos manifestantes morreu ao ser atingido por disparos e outros cinco ficaram feridos. Uma centena de jovens foram detidos.

Para os analistas, esta nova vaga de repressão mostra que os apoiantes da linha dura, partidários da erradicação da Irmandade, estão a ganhar terreno no Governo e nas forças de segurança, derrotando aqueles que, como o vice-presidente Ziad Bahaid el-Din, defendiam uma solução que passasse pelo diálogo. Sinal disso afirmam é a decisão de confiscar todos os bens da rede de mesquitas, hospitais e associações de beneficência ligadas à Irmandade. Permitidas pelo regime de Mubarak, servem milhões de egípcios e serviram de base para o poder conquistado pelo movimento islamista ao longo da sua existência.
 
 
 
 

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