(Re)prova dos professores contratados ou Quem quer ser milionário?
A prova não é só idiota para professores com 5 ou mais anos de serviço. A prova é idiota.
Ora, é isso que o MEC pretende fazer aos futuros professores. Se falharem no ramo comum da prova, será vão o sucesso na componente específica. Compare-se agora aquele patrão com este.
A PACC sustenta-se em várias falácias:
o apelo à ignorância: "como ninguém provou que os extraterrestres existem, logo não existem". Neste caso, "como ninguém provou que os professores contratados são bons professores, logo não são bons professores." (A prova de que assim se os toma está no YouTube; partindo de declarações que aí estão de um responsável do MEC, tendo muitos frequentado a via ensino, nela “desaprenderam” o que aprenderam no ramo científico.) Há provas de que são bons professores, mas alguém não as quer ver, pelo que a esta falácia subjaz outra:
a falácia indutiva da omissão de dados relevantes. Recorrente no jornalismo tabloide, ocultam-se dados para impor uma conclusão. O MEC já o provou ter feito ao ignorar a experiência profissional destes professores. As próximas duas falácias são desdobramentos desta;
o falso dilema: "ou compra este carro ou fará uma má compra" (Bush também disse ao mundo que ou estávamos com os EUA ou com os terroristas). Aqui, "ou o MEC examina, com a PACC, os professores ou não há garantia de qualidade na futura docência." Já se pensou no MEC noutra possibilidade que garanta essa qualidade? Já, mas vinda da desaprendizagem operada pelas “ciências ocultas da educação” (a expressão é do mesmo responsável do MEC), não é uma possibilidade. Bem!, as ciências da educação são, em grande parte, parte das ciências sociais e humanas e estas, por seu turno, foram um relevante alargamento na ciência (Manuel Sobrinho Simões dizia há dias ao PÚBLICO, e agora percebo a quem também se dirigia, que os portugueses precisam de CSH como de pão para a boca);
a petição de princípio: "os ex-presidiários são perigosos, logo não se deve confiar em ex-presidiários". Serão todos os ex-presidiários perigosos? A justiça não falha? O arrependimento não existe? Aqui, "a atual formação inicial de professores em Portugal é de qualidade duvidosa, logo não se deve acreditá-la." O MEC apresentou publicamente provas de que essa formação é de qualidade duvidosa? Para tal não basta chamar ideólogos aos sociólogos da educação (este epíteto é do mesmo responsável do MEC);
"a prova visa verificar o domínio dos conhecimentos e capacidades fundamentais para o exercício da função docente" (aviso n.º 14185-A/2013). Vago. Considerando o termo “fundamentais”, temos a falácia da composição: "todos os jogadores da seleção de futebol são excelentes jogadores, logo esta seleção tem um futebol excelente." (Se assim fosse, o treinador seria irrelevante, e não é.) São somente os aspetos formais e disciplinares "fundamentais" na docência? Que dizer dos domínios pedagógico ou ético? Que para a direção de turma não são "fundamentais"? Que é bom um professor que ignora a pessoalidade dos alunos? A melhor ler no MEC: O Erro de Descartes. A emoção é importante no processo de decisão, e alguma inteligência emocional é crucial numa profissão que, sendo educativa, é social. Voltámos ao pior de Descartes, ignorando o seu erro.
Ajuíze o leitor. Para uma prova que, segundo a tutela, visa "avaliar a capacidade de mobilizar o raciocínio lógico e crítico, bem como a preparação para resolver problemas em domínios não disciplinares" (PÚBLICO, 28.11.13), é assim que os seus criadores mobilizam o raciocínio lógico e crítico. Os fundamentos da PACC são líquidos. São um cenário de um western: na tela, é perfeito; abram-se as portas para ver o que há por trás.
Mas o MEC começa a aprender. Já lhe dou 9,4!
Até admito, com o Quem quer ser milionário?, estar a caricaturar a PACC. Faço-o porque os políticos têm um poder que o cidadão comum não tem, e esse é um desequilíbrio, talvez inevitável, mas um desequilíbrio da democracia: legislam sobre todas as profissões, mas nenhuma outra legisla sobre a sua – de políticos. Solidarizando-me com aqueles que daquele são vítimas, e querendo (re)unir o que outros querem separar, o apelo ao justo justifica-o.
A prova não é só idiota para professores com 5 ou mais anos de serviço. A prova é idiota.
Professor com mais de 5 anos de serviço