Raptadas

Depois da nomeação para o Óscar de melhor filme estrangeiro por "Incêndies" (2010), o canadiano Denis Villeneuve entra em Hollywood à quinta longa-metragem e pela porta grande: dirigindo um elenco de luxo encabeçado por Hugh Jackman e Jake Gyllenhaal, uma equipa de primeira água onde pontua o grande director de fotografia Roger Deakins e um guião que andava há anos a ser considerado um dos melhores argumentos não produzidos pelos estúdios. São muitas bolas para tentar manter no ar ao mesmo tempo, mas Villeneuve manobra-as com inteligência, agarrando com segurança - mas talvez demasiada sisudez - esta história policial que se desenrola metodica e inexoravelmente após o rapto de duas meninas numa pequena comunidade da Pensilvânia. Raptadas opõe a investigação do detective encarregue do caso (Gyllenhaal, impecável como de costume) à raiva incontida do pai de uma das meninas (Jackman a exercitar o talento que os seus filmes de acção nem sempre lhe permitem mostrar), que rapidamente decide fazer justiça pelas próprias mãos. Villeneuve desenha um retrato incisivo, intenso, de uma “pequena América” pós-11 de Setembro confusa e insegura, que ressoa de modo sugestivo com os tempos sociais e políticos que vivemos, colocando em jogo de modo surpreendente questões de fé e crença, bem e mal.


Raptadas desenrola-se de modo atípico, pensativo, contra a corrente do policial moderno, recusando a acção pela acção, respirando com um fôlego quase fatalista que envolve o espectador numa atmosfera plúmbea. É uma espécie de primo direito do Mystic River de Clint Eastwood, mas perde-se quando, em direcção ao final, o que ficou durante duas horas em lume brando ameaça vir por fora, com a necessidade de atar as pontas soltas a deixar para trás algumas das questões mais estimulantes do filme. É pena que assim seja, mas continua a estar aqui uma obra inteligente e francamente acima da média.

Sugerir correcção
Comentar