Corria o Verão de noventa e oito. A crise embrionava, Portugal recebia a Expo e o Bin Laden ainda fazia vídeos caseiros. Oeiras nunca tinha visto um Agosto tão quente, e a sua Piscina Oceânica transbordava braçadeiras por metro quadrado. Entre a multidão, contavam-se três pessoas. Sei que isto agora podia evoluir para uma anedota do português, inglês e francês – conheço uma parecida – mas não. Era só o meu irmão, um vizinho e outro graúdo com peso a mais para a idade. Peso a mais para a idade é ser simpático, ele era gordo. Era tão gordo que o nutricionista o proibiu de ir a piscinas de água doce. Tão gordo que cada vez que mergulhava ficava com uma poça de água no umbigo que dava para confundi-lo com um lavatório. Mas chega de falar sobre mim.
Se eu soubesse o que sei hoje, tinha guardado a cassete onde o meu pai documentou essa tarde de mergulhos. Aquelas três horas a desafiar a gravidade dos três aos dez metros, hoje, tinham-me feito a vida. Bastava ter-me antecipado ao visionário que arquitectou a ideia "out-of-the-box" de pôr “famosos” a mergulhar numa piscina em horário nobre, e enviá-la à SIC. A morte do VHS arruinou as minhas aspirações de ter um programa para as massas do audiovisual, mas vendo pelo lado bom da coisa, também eliminou o único documento oficial que testemunhava a minha obesidade infantil. Acho que não fiquei a perder. O Splash até tinha tudo para ser uma boa ideia, só faltou o ingrediente para tornar aquilo espectacular. Se fosse eu a mandar, deixava tudo igual, mas os concorrentes estavam a meio da digestão de uma feijoada. Talvez os metesse a saltar com uma bigorna atada ao pé, não sei. Num dia mau, talvez fosse mais longe. Continuava a deixá-los saltar para uma piscina, mas sem água. O público quer drama, e aí sim, faria sentido os contornos narrativos do Voltaire que a SIC põe à volta de um duplo-mortal encarpado. Deixando como está, nada faz sentido. Do que ainda me lembro, saltar para uma piscina é uma coisa engraçada.
O Splash conseguiu transformar um concurso de mergulhos numa espécie de Ponto de Encontro com uma piscina. Há tanto jogo de emoções que até parece que o programa foi escrito pela Margarida Rebelo Pinto.
Entre tantas outras coisas que há para dizer, onde a SIC capricha é na selecção do elenco, indo repescar famosos-que-outrora-vingaram-numa-área-qualquer-(pausa para respirar)-mas-cujas-vicissitudes-da-vida-se-encarregaram-de-os-colocar-na-miséria. Aqui para nós, já duvidei mais que o Splash fizesse parte do programa Novas Oportunidades.
Aos concorrentes, ainda assim, gabo-lhes a coragem. Não de saltar, mas de usar fatos-de-banho com padrão de trapezista do Circo Chen. Só por isso mereciam a pontuação máxima. Sim, porque após o salto os concorrentes recebem pontos. Primeiro, dados pelo júri, depois, dados no hospital. Já lá vi chapões que mereceram 7 pontos de um jurado e 27 de um cirurgião plástico. Para além dos chapões, quando percorro a amostra de concorrentes femininos, mais parece que vai haver lugar para chupões. Já no lado masculino, há de tudo, até futebolistas. Sem querer ser exigente, se era para ver jogadores de futebol a atirar-se para a piscina, tinham posto o Barcelona a jogar. No meio disto tudo, só fico triste por ver tantos “famosos” que foram lançados em novelas da TVI a emigrar para a SIC. Mas não me surpreende. Topa-se logo que não têm amor à camisola, já que em ambos os canais andam de tronco nu.
Ainda assim aproximam-se ventos de esperança. O Gaspar demitiu-se, os combustíveis baixaram, a senhora aqui do talho deixou de dizer chalchicha e a SIC vai lançar um novo programa. Diz que é uma tourada com famosos. Tem tudo para correr bem. Sobretudo se os equiparem de vermelho.