Governo britânico favorável a técnica de procriação que envolve três “progenitores”
A nova técnica permitiria prevenir as doenças genéticas associadas a estruturas celulares chamadas "mitocôndrias".
Aquele país tornar-se-ia assim no primeiro do mundo a permitir o nascimento de crianças geradas pela fecundação, pelo esperma de um homem, de um ovócito resultante da “mistura” dos ovócitos de duas mulheres.
Há toda uma série de doenças genéticas causadas por mutações no ADN das mitocôndrias, as "baterias" das células, que possuem um bocadinho de ADN próprio. Quando certas mutações se verificam nesse ADN mitocondrial, podem nascer crianças com graves doenças, incluindo diabetes, surdez, problemas oculares e gastrointestinais, doenças cardíacas, demência e outras doenças neurológicas. Estima-se que uma em cada 6500 crianças seja afectada.
A nova técnica, que já foi testada com êxito em macacos-rhesus (ver "Troca de mitocôndrias pode acabar com doenças transmitidas pela mãe", PÚBLICO de 25/10/2012), permite literalmente trocar essas baterias celulares por versões não defeituosas. Acontece que as mitocôndrias da mãe passam para os seus futuros filhos exclusivamente via o citoplasma (a "clara") dos ovócitos, sendo portanto possível descartar o ADN mitocondrial defeituoso. Para isso, transfere-se o ADN nuclear (99% do genoma) do ovócito da futura mãe para um ovócito com mitocôndrias normais, doado por outra mulher. A futura criança terá assim, no fundo, três “progenitores” – embora a contribuição da mulher dadora do ovócito seja muito pequena.
Os críticos da nova técnica argumentam que ela não é ética, mas essa não foi a opinião emitida no ano passado pelo Conselho de Bioética Nuffield, órgão independente muito influente no Reino Unido, que a considerou eticamente aceitável para prevenir as doenças graves e incapacitantes derivadas de defeitos no ADN das mitocôndrias (ver "Pode ser ético procriar com o ADN de três pessoas", PÚBLICO de 12/06/2012). E, no início deste ano, uma consulta pública revelou que muitos britânicos – embora não a maioria – são a favor da sua aplicação.
O passo agora dado pelo Governo britânico nesse sentido não significa que a nova técnica venha a estar disponível imediatamente. Será preciso, primeiro, provar que ela pode ser utilizada em segurança no ser humano. Mas o objectivo assumido é que as directivas estejam prontas até ao fim do ano e que o Parlamento possa votá-las já no ano que vem.