Quixotesco

O risco grande ao falar do cinema africano que se faz hoje em dia é o de cair na condescendência benevolente para com uma cinematografia que batalha para existir e, para o bem e para o mal, não esconde as fragilidades a que essa batalha constante a condena. Numa carreira de 25 anos, A República di Mininus é apenas a quinta longa-metragem de ficção do guineense Flora Gomes, e demonstra a cada momento as limitações com que trabalhou e a incapacidade de fazer justiça prática à ideia que o norteia: uma alegoria sobre um país em guerra de onde os adultos desapareceram, deixando as crianças no poder e obrigadas a entender-se para o bem de todos.


À imagem dos filmes anteriores de Gomes, é uma obra por vezes amadora, muito frágil e canhestra, que se sente ter tido de acomodar o mosaico de investidores internacionais e institucionais do “primeiro mundo” com vista a um qualquer “retorno” comercial ilusório (a versão final é falada num inglês muito trabalhado, certamente devido à presença do actor americano Danny Glover). Mas a conjugação de sinceridade e ingenuidade presente quer na premissa quer no empenho da equipa acabam por ajudar a transcender as muitas fraquezas de A República di Mininus e atribuem-lhe um capital de simpatia nada dispiciendo. Afinal, esta história sobre o faz-de-conta de crianças que inventam a sua própria comunidade é ela própria um faz-de-conta de cinema, a fingir (sem ilusões) que é maior do que pode ser. Está muito longe de ser um grande filme - o anterior filme de Gomes, o desopilante musical fajuto A Minha Voz, era bem mais conseguido. Mas o simples facto quixotesco de existir perante o desinteresse generalizado (com data de 2011, é um filme que anda há mais de um ano à espera de estreia, e a sua exposição internacional tem sido bastante modesta) confirma que A República di Mininus merece mais do que a mera condescendência.

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