Hugo Veiga, o português por trás da campanha viral da Dove

Com 33 anos, Hugo Veiga trabalha como redactor na Ogilvy São Paulo. Idealizou, com Diego Machado, a campanha “Dove Real Beauty Sketches” que está a correr o mundo

Já não dá para esconder o sotaque. Hugo Veiga, 33 anos, nasceu no Porto, mas já está do outro lado do Atlântico há quase sete. Na última semana, pôs meio mundo (ou o mundo inteiro?) a falar sobre ele sem saber. Ou, pelo menos, sobre as suas ideias. É que Hugo, o “portuga mais brasileiro do que os brasileiros”, é um dos cérebros por detrás da campanha viral da Dove “Real Beauty Sketches”. 

Na agência Ogilvy Brasil, em São Paulo, o “copywriter” (na foto, de azul) forma com o director de arte brasileiro Diego Machado (de bege) uma dupla dinâmica que colecciona prémios desde 2011: só no festival de publicidade Cannes Lions já arrecadaram um Leão de Ouro, um de Prata e três de Bronze. “Como equipa é como que nem namorada: encontramos uma cara-metade”, graceja Hugo, em entrevista por Skype. Os dois idealizaram a campanha “Dove Real Beauty Sketches”, em que o artista forense Gil Zamora desenha mulheres a partir das descrições delas próprias e de desconhecidos. Conclusão, bem visível na comparação entre os dois retratos: As mulheres, "excessivamente auto-críticas", são mais bonitas do que aquilo que pensam.

Em poucos dias, os vários vídeos oficiais da campanha, lançada nos EUA, Canadá, Brasil e Canadá, somaram milhões e milhões de visualizações no YouTube. Tornou-se, por exemplo, no post mais partilhado da história do Mashable. Garantia de um atónito Hugo. “Não estávamos à espera que fosse tão rápido e tão impactante em todo o mundo. É absurdo”.

Foto
Os retratos de Florence

Uma "experiência social"

O segredo? Ser uma campanha que “sai do mundo da publicidade”. Transformou-se numa “experiência social” e, na verdade, foi pensada para isso. Conhecida por apostar na ideia de “Real Beauty”, a Dove queria resgatar o fulgor deste conceito — aquele que se sentia, por exemplo, na campanha “Evolution”, Grand Prix em Cannes de 2007. O trabalho caiu na mesa dos dois jovens. A premissa: “Como é que conseguimos provar às mulheres que elas são mais bonitas do que elas se vêem?”

Hugo fala da experiência em Cannes e do Leão de Ouro

“É óbvio que elas têm uma percepção distorcida da realidade”, comenta Hugo, olhando para o estudo da Dove que acompanha os vídeos — apenas 4% da população feminina mundial se considera bonita. O “pulo do gato” (eis o “brasuca”) foi encontrar uma forma de “usar as próprias críticas delas” para provar que estão enganadas. Chegaram, assim, ao retrato falado e, consequentemente, a Gil Zamora, depois de uma pesquisa no YouTube.

O portuga mais brasuca do que os brasileiros

O vídeo foi filmado em Janeiro em São Francisco. Ninguém sabia se iria resultar. Mais do que um “retrato da fisionomia correcta”, queriam uma “representação da percepção”. Gil chegaria perto? Quais seriam as reacções delas? Souberam que “tudo ia correr bem” quando chegaram ao hotel e resolveram fazer um teste com uma mulher que estava no bar. “No final, Gil mostrou-nos: toda a gente disse ‘uau’.” Já nas gravações, montada a exposição, outra surpresa: “Todas ficaram emocionadas. Abriram-se. Viram que aqueles desenhos eram uma representação de várias lutas que tiveram com elas próprias ao longo do dia.”

Um conselho para os jovens portugueses

"Quem quer bolota, trepa"

E agora? Hugo Veiga tem consciência que “esta é daquelas campanhas que pode mudar uma carreira”. Sim, o Grand Prix “é um grande sonho”, mas já o está a viver. “Ao ler os comentários das mulheres, ao ver toda a repercurssão. Nós estamos aqui muito mais para agradar ao público do que a um grupo de publicitários que está sentado numa sala durante uns dias.” A verdade é que nem tem tido tempo para pensar nisso. “Estou imerso em trabalho”, diz, no final de uma semana a dormir umas cinco ou seis horas por noite. Aliás, neste ano, só foi uma semana à praia — no Rio de Janeiro, no Carnaval.

A “vontade” de regressar a Portugal está lá, mas não agora, quando o país está “com uma depressão emocional”. Longe vão os tempos em que, por cá, inspirado no Professor Bambo, se transformou em Professor Carago para procurar emprego. Foi assim que entrou para a Strat, em 2004. O humor também foi ficando de lado. Teve de ser. Já o pai lhe dizia: "Quem quer bolota, trepa". No Brasil, por causa do verbo, viu-se obrigado a trocar de frase: "Acredita, se lança, que o povo aplaude".

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