Papa beijou Cristina Kirchner na primeira audiência do pontificado

Encontro era aguardado com expectativa depois da frieza que marcou a relação entre a Presidente argentina e o até agora arcebispo de Buenos Aires. Kirchner pediu ao Papa para mediar diferendo com o Reino Unido sobre as Malvinas.

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O cardeal Bergoglio é o primeiro Papa oriundo da América Latina Reuters

Uma vez mais, o Papa quebrou o protocolo do Vaticano e beijou Kirchner depois de esta lhe ter oferecido uma matera ornamentada – o recipiente usado para a tradicional bebida argentina. Foi um início caloroso de uma audiência privada que, segundo o porta-voz da Santa Sé, durou “15 a 20 minutos” e foi seguido de um almoço entre os dois compatriotas na residência de Santa Marta, onde Francisco continua alojado.

Num encontro com os jornalistas depois da refeição a Presidente destacou a “simplicidade” que tantos elogios tem valido ao Papa e disse ter encontrado Jorge Bergoglio “sereno e tranquilo”, mas também “preocupado com a imensa tarefa de liderar o Vaticano e com todas as coisas que sabe que há para mudar”.

Procurando desfazer a ideia de que recebeu friamente a eleição do arcebispo de Buenos Aires – criada por uma nota de felicitações em que não era mencionado nem o nome de Bergoglio, nem o facto de ser argentino –, a Presidente referiu-se a Francisco como “o nosso Papa”. “Não porque é argentino, mas porque é o Papa de todos os católicos”.

Sobre o que falaram no encontro a sós, Kirchner referiu apenas as questões internacionais, revelando ter pedido a mediação do Papa no diferendo que opõe a Argentina ao Reino Unido sobre o controlo das ilhas Malvinas – assunto que Londres recusa discutir, dizendo que os habitantes querem continuar ligados à coroa britânica, como mostrou um referendo realizado na semana passada. 

“Estamos perante uma oportunidade histórica. Ambos os países têm Governo democráticos e não há perigo nenhum do ponto de vista bélico, para lá [do risco] de militarização do Atlântico Sul”, afirmou a Presidente, citada pelo jornal La Nación.

O porta-voz do Vaticano, o padre Federico Lombardi, avisou que não seria feito qualquer comentário, por não se tratar de uma visita de Estado, mas de “um gesto de cortesia e de atenção em relação à Argentina e à sua Presidente”.

A audiência, na véspera da missa que inaugurará oficialmente o pontificado, foi pedida pelo Governo argentino, no que a imprensa de Buenos Aires descreveu como uma tentativa de ultrapassar as frias relações do passado.  

O afastamento começou ainda durante a presidência de Néstor Kirchner, que morreu em 2010 já depois de a mulher lhe ter sucedido no cargo. O primeiro choque, recordaram nos últimos dias os jornais de Buenos Aires, aconteceu em 2004, quando o então cardeal Bergoglio aproveitou a homilia do tradicional Te Deum realizado no feriado nacional para denunciar “o exibicionismo e os anúncios estridentes” de certos responsáveis.

O Presidente, que viria depois a classificar o arcebispo de Buenos Aires como o “verdadeiro representante da oposição”, decidiu levar as celebrações para outras cidades do país, numa estratégia seguida pela sua mulher.

As relações com Cristina Kirchner, apesar de mais cordiais, foram sempre tensas, sobretudo quando o Governo avançou com a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, perante a forte contestação da Igreja. O La Nación recordava no domingo, por exemplo, que a Presidente recusou o sacerdote que o arcebispo enviou ao hospital onde Nestor Kirchner estava internado após sofrer um ataque cardíaco para oferecer assistência espiritual. Depois disso, o arcebispo de Buenos Aires terá tentado várias vezes ser recebido na Casa Rosada, sempre sem sucesso.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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