Como seria o Macbeth de Laurence Olivier?

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Laurence Olivier como Macbeth numa produção de 1955: se o actor e encenador não tivesse desistido do projecto, Macbeth teria sido a sua quarta adaptação cinematográfica de um texto de Shakespeare

A história do clássico de Shakespeare é bem conhecida: dois amigos, um rei, uma mulher maquiavélica, três bruxas proféticas, uma sucessão de assassinatos e um absoluto desejo de poder, que se revela incapaz de contrariar o destino.

A peça do dramaturgo britânico é eterna e foram já muitos os que arriscaram trabalhar Macbeth no teatro e no cinema. Um deles, Laurence Olivier (1907-1989), deixou o projecto ficar pelo caminho em 1958, quando a produção estava já na fase final. Por causa de problemas financeiros, e depois de vários esboços e guiões, o actor e encenador desistiu daquela que poderia ter sido a sua quarta adaptação cinematográfica de Shakespeare, depois de Hamlet, Ricardo III e Henrique V. O filme que nunca chegou a ser ficou para sempre envolto em mistério, em grande parte porque o próprio Olivier assim o quis. Durante décadas, o actor garantiu que nenhum dos guiões tinha sobrevivido. Agora, Jennifer Barnes, uma académica de 31 anos da Universidade de Exeter, pode ajudar a desvendar o mistério.

A investigadora estava a mexer em documentos do arquivo de Laurence Olivier, que a Biblioteca Britânica comprou à família do actor em 2000 por um milhão de libras, quando encontrou referências aos guiões de Macbeth. E depois os próprios guiões, desde os primeiros esboços aos mais detalhados, explica no PhysOrg, site especializado em notícias relacionadas com investigação científica nas mais diversas áreas.

Barnes estava inicialmente interessada em reunir documentação sobre a adaptação de Ricardo III e ficou muito surpreendida com o que descobriu. Consciente de todo o secretismo que envolvera o projecto de Olivier e daquela que era então sua mulher, a actriz Vivien Leigh, a investigadora continuou à procura de mais papéis relacionados com Macbeth. "Estava à volta dos catálogos, peguei num guião e descobri que era o de Macbeth. Não acreditei porque sabia que não era suposto existir", disse Barnes ao diário britânico The Guardian. A académica acredita que os arquivistas que fizeram o inventário do espólio desconheciam a importância do que tinham em mãos. "[Laurence Olivier] criou uma aura de mistério à volta de Macbeth. Creio que é por isso que todos querem saber como seria", acrescentou, lembrando que o actor e encenador chamara ao projecto um "monstro impossível" para justificar o facto de ser financeiramente inviável.

Os documentos que Barnes identificou comprovam que Olivier atribuíra a si próprio o papel de Macbeth e, como seria de esperar, escolhera Leigh para o de Lady Macbeth (os dois tinham já desempenhado as mesmas funções em 1955, numa peça do Shakespeare Memorial Theatre). Cada um dos actores interpretaria também uma das bruxas.

O guião, com muitas marcações técnicas e notas precisas do encenador, revela também que Olivier introduziu alterações ao original e que muitas das escolhas que faz estão ancoradas na sua experiência pessoal: num dos primeiros esboços, por exemplo, Lady Macbeth sofre um aborto, o que não consta do texto de Shakespeare mas aconteceu a Leigh. Barnes acredita que até a forma como o encenador aborda o casal de protagonistas está marcada pela relação dos dois, que estava próxima do fim: "Uma das histórias recorrentes é a de que Leigh estava a enfraquecê-lo, a emasculá-lo. Acho que a separação dos Macbeth é enfatizada nesta versão."

"Estes documentos merecem um estudo", disse Jennifer Barnes ao PhysOrg, porque "comprovam a importância de Laurence Olivier como ícone shakespeariano dos séculos XX e XXI".

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