Palavras de 2012

Foram 50 as palavras escolhidas, semana a semana, durante o ano de 2012. Ancoradas na actualidade e descritas com a ajuda de dicionários, enciclopédias e citações, começaram por ser divulgadas na Pública, passando para a revista 2 em Março. As duas semanas que faltam corresponderam a edições especiais, sem a rubrica Palavra.

Foto
A nuvem das palavras do ano – escolha de Rita Pimenta

Escolhemos também “Jogos” e “medalha”, para assinalar as Olimpíadas em Londres. Em Setembro, quisemos registar “manifestação” e, em Abril, “liberdade”. Porque sim.


(Não estranhe o leitor o facto de não encontrar palavras como “austeridade”, “resgate” ou “troika”. Essas já vêm de longe… e entraram nas escolhas de 2011.

 
DEZEMBRO
 

30 de Dezembro
Burlão

Especialista em trapaças

Adjectivo e nome masculino, “burlão” é uma “pessoa que pratica burlas, que engana, ludibria para ganhar alguma coisa”. O que terá ganho Artur Baptista da Silva, o alegado “burlão da ONU”? Tempo de antena, sem dúvida. Primeiro, como especialista em crise europeia; depois, como especialista em trapaças. Apresentava-se como coordenador de uma equipa das Nações Unidas “encarregada pelo secretário-geral Ban Ki-moon de apresentar um relatório da crise na Europa do Sul”.

A quem pratica burlas também se chama “burlador”, “trapaceiro” ou “trampolineiro”. Entrevistado pela imprensa e convidado para programas de televisão, Artur Baptista da Silva chegou a apresentar “três pontos para uma renegociação da dívida com a troika”.

Em direito, “burla” corresponde a “crime que consiste em enganar alguém para lhe extorquir quaisquer valores ou para obter lucros”. Uma “fraude”, portanto. Daí que o International Club de Portugal admita recorrer aos tribunais, “caso se comprove ter sido enganado por um falso especialista”. A associação convidou-o para um debate. O Ministério Público informou que irá tomar medidas “adequadas e convenientes”, pois o também “consultor do Banco Mundial” incorre nos crimes de “burla e usurpação de funções”.

Sinónimos de “burlão”: “falacioso”, “gatuno”, “prestidigitador”, “tramposo”, “vigarista”, “velhaco”. No entanto, Artur Baptista da Silva despertou simpatia entre os portugueses. Tanto por apelar à renegociação da dívida como por ter enganado a comunicação social. Nas palavras de Nicolau Santos, director adjunto do Expresso, “embarretado”.
 

23 de Dezembro
Armas

Ter ou não ter, eis a questão

Plural da palavra “arma”, que significa “instrumento que se usa para atacar ou defender”. Por extensão, “qualquer objecto que sirva para esses fins”. No dia 14, em Newtown (EUA), um jovem de 20 anos usou-as para o pior desses fins, matando 20 crianças e seis adultos na escola de Sandy Hook. Antes, Adam Lanza (que sofria de síndrome de Asperger) disparou sobre a mãe. Terá sido ela a iniciá-lo na carreira de tiro, já que era adepta de armas de fogo: “Aquelas que funcionam mediante a deflagração de uma carga explosiva que dá lugar à formação de gases, sob cuja acção é lançado no ar um projéctil.” Teve direito a quatro desses projécteis na cabeça, enquanto dormia. No final do massacre, o atirador ter-se-á “atacado” a si próprio ou “defendido”, depende do ponto de vista. Total: 28 mortos.

Seguiu-se o tradicional debate após tiroteios “inexplicáveis” nos Estados Unidos. A regulação do uso de armas de fogo, num país onde nove em cada dez pessoas possuem uma. Entretanto, “disparou” (um verbo aqui apropriado) a venda de mochilas à prova de bala (um acréscimo de 40%). A Companhia Emenda II também tem escudos do “tamanho de um caderno”, para pôr na mala dos alunos. “Não garantimos nada, apenas vendemos tranquilidade aos pais”, disse o vice-presidente da empresa, Elmar Uy. 

Há vários tipos de armas, todos reveladores do engenho humano no que toca à destruição: arma biológica (“usa organismos vivos”), branca (“objecto com lâmina de metal polido”), de arremesso (“é lançada à distância”), de repetição (“não automática”) e nuclear (“arma explosiva cuja energia resulta de uma reacção nuclear”).

Diz-se que “a cantiga é uma arma”. Se ainda conseguirmos, cantemos. Canções de Natal, por exemplo.


16 de Dezembro
Paz

Da pomba branca à moeda única  

Substantivo masculino, do latim pace. “Ausência de conflito armado, violência ou qualquer forma de luta”, mas também “Estado de uma nação ou terra que não se acha em guerra”. Assim falam os dicionários sobre a “paz”. Alfred Nobel quis distinguir quem a promovesse e fez nascer o Prémio Nobel da Paz. Este ano foi atribuído à União Europeia e entregue em Oslo na segunda-feira. Uma decisão pouco pacífica que obrigou o presidente do Comité Nobel, Thorbørn Jagland, a justificar-se: “A União Europeia ajudou a construir a fraternidade entre nações e a promoção da paz que Alfred Nobel deixou como legado. O Prémio Nobel da Paz é assim merecido e necessário.” Sobre “paz armada”, diz o dicionário: “Respeito recíproco das nações à custa das Forças Armadas, que as mesmas conservam.” Mas também regista “paz germânica”, como expressão que alude “a uma paz imposta ou inculcada em normas não gerais”. Há ainda a “paz podre”, que é “apenas aparente”. Se antes o símbolo da paz era uma ave, a pomba branca, “que, trazendo no bico um ramo de oliveira, anunciou a Noé e aos que iam na sua arca que o sossego e a segurança tinham voltado depois do Dilúvio Universal”; agora, é uma moeda, o euro.

Segundo Durão Barroso, “um dos símbolos mais visíveis da nossa unidade”. Expressão que se adequa a estes tempos é “estar à paz de pílulas”, ou seja, “não ter dinheiro nenhum”. Já “descansar em paz” significa “salvar-se”, diz-se “de todos os que morrem na religião católica”. Foi a Igreja católica que criou o Dia da Paz. O Papa Paulo VI propôs que fosse celebrado sempre no primeiro dia do ano civil, 1 de Janeiro. Fê-lo numa mensagem difundida em 1967 (antes do Twitter).


2 de Dezembro
Aprovação

Consentimento, louvor, aplauso 

“Acto ou efeito de aprovar; confirmação, consentimento”, mas também “voto com que se aprova numa assembleia deliberativa”. “Aprovação” de um orçamento, por exemplo. Como a que aconteceu na terça-feira, na votação da proposta do Orçamento do Estado para 2013. Foi aprovada com os votos a favor da maioria parlamentar PSD-CDS e com os votos contra do PS, PCP, BE, Os Verdes e do deputado do CDS eleito pela Madeira.

Alguns dos deputados terão votado a favor, mas contrariados, disseram vários comentadores ao longo da semana. Mas o resultado é que conta, argumentaram outros. Os dicionários também registam como sinónimos: “louvor”; “consentimento”; “assenso”; “beneplácito”. E dão alguns exemplos: “A sua atitude teve a aprovação de todos”; “saiu sem a aprovação da mãe” ou “o examinando obteve aprovação no exame”. Como nas sucessivas avaliações da troika, de que muito se orgulha o Governo. “Aprovar” significa “achar bom ou bem”, “ratificar” ou “dar como apto (depois de exame ou concurso)”. Por aprovar está ainda a proposta de lei na generalidade para os estivadores, que esta semana se manifestaram contra “a nova lei do trabalho portuário, que consideram que os coloca num regime igual ao que vigorava antes do 25 de Abril”. O substantivo feminino “aprovação” também quer dizer “aplauso”. O que a oposição faria se o Presidente da República vetasse o Orçamento para 2013.


NOVEMBRO

25 de Novembro
Cessar-fogo

Final de conflito ou somente pausa

“Interrupção ou fim das hostilidades entre nações ou partidos em guerra”, regista o dicionário. Outra definição do substantivo masculino “cessar-fogo”: “Cessação de hostilidades entre países ou facções em guerra ou em luta.” Na quarta-feira, o Egipto declarou um acordo de cessar-fogo entre Israel e o governo da Faixa de Gaza. Entrou em vigor às 19h desse dia, mas não se sabe até quando durará. Terá mesmo fim algum dia? Depois de uma semana de conflitos (após muitos outros no passado) e de 162 mortos (após incontáveis outros desde há muito tempo), “o acordo de cessar-fogo negociado no Cairo exige a Israel que acabe com as ‘incursões e assassínios em Gaza’” e faz aos palestinianos “a exigência de que todas as facções parem todas as hostilidades contra Israel lançadas a partir da Faixa de Gaza, incluindo os ataques com rockets e ataques ao longo da fronteira”. Segundo a AFP, Benjamin Netanyahu terá falado ao telefone com Barack Obama e seguido a recomendação de “dar uma oportunidade à proposta egípcia”, contribuindo para “estabilizar e pacificar a situação”. O Ministério dos Negócios Estrangeiros português divulgou uma nota a congratular-se com o acordo: “Só a cessação da violência pode acabar com o sofrimento das populações e abrir caminho a uma solução duradoura.” “Cessar-fogo” também quer dizer “cor ou sinal determinante de suspensão da execução do tiro”. O dicionário desconhece por agora a palavra “drone”.


18 de Novembro
Visita

Alemanha e Colômbia vieram a Portugal

Substantivo feminino que significa “acto ou efeito de visitar” e também “pessoa que visita”. Há visitas discretas e visitas perturbadoras da vida dos visitados. Basta comparar duas recentes, de dois países: Colômbia e Alemanha. Poucos saberão o nome de quem representa o primeiro; todos saberão o de quem representa o segundo. Juan Manuel Santos (Presidente colombiano) e Angela Merkel (chanceler alemã). “Visitar” quer dizer “ir a casa de alguém ou a algum lugar”. Acção que pode ser de “cortesia”, “afeição”, “caridade”, “recreio”, “devoção” ou “no exercício de certas profissões”. “Que veio Merkel cá fazer?”, perguntou Vasco Pulido Valente. “Exibir a sua autoridade de credora sobre uma tribo inerme e primitiva? Ou resolveu, simplesmente, como chefe da Alemanha, fiscalizar o estado das colónias?” Para Celso Filipe, subdirector do Jornal de Negócios, a visita da chanceler foi o “pretexto perfeito para verbalizar as frustrações que se têm vindo a acumular” e lembrou que Merkel “não é responsável pelas más políticas nacionais, mas é altamente responsável pela falta de uma política europeia coerente e solidária”. O que as medidas de segurança conseguiram evitar durante a sua presença em Lisboa não o conseguiram no dia da greve geral. Um dicionário de outros tempos regista “visita” como “tributo antigo que consistia num mimo ou presente de comestíveis, e que o enfiteuta [inquilino] pagava ao senhorio”. No caso recente, consommé de aves, cabrito à portuguesa e Quinta da Bacalhoa 2009, servidos em São Julião da Barra.


11 de Novembro
Presidente

O mais alto cargo e um pássaro 

“Pessoa que preside, que ocupa o mais alto cargo.” Algumas palavras adiante, os dicionários registam: “O chefe de Estado numa república, Presidente da República.” Foi para este cargo que Barack Obama foi reeleito nos EUA por mais quatro anos. E disse: “O nosso caminho tem sido difícil e longo. Mas temo-nos levantado e sabemos, nos nossos corações, que para os Estados Unidos o melhor ainda está para vir.” Nada estava garantido à partida. Menos ainda depois do primeiro debate frente a Mitt Romney. “Presidente” significa ainda “aquele que dirige os trabalhos de uma assembleia ou de uma corporação deliberativa”. É um cargo de que se espera intervenção e eloquência. No entanto, há presidentes que praticam mais o silêncio. Ou inventam assuntos “tabu”. (Lembram-se?) Falamos de Cavaco Silva, que recentemente recuperou a voz, e logo na inauguração de um hotel de luxo e num dos raros momentos em que não falou na terceira pessoa. “Ninguém me pressionará sobre essa matéria.” A matéria era o Orçamento do Estado para 2013. 

Disse Obama: “O vosso trabalho não termina no voto. A questão não é o que o país pode fazer por nós, mas o que cada um pode fazer por nós.”

Disse Cavaco: “O que não falta em Portugal são apetites por protagonismo mediático. Pode faltar trabalho. Eu prefiro o trabalho.”

Presidente é também o “mordomo da festa de uma freguesia” ou ainda, no Brasil, um “macuquinho”– pássaro que “vive nos cisqueiros e nos lugares em que os esgotos desembocam nos riachos”.


4 de Novembro
Tempestade

Perturbação atmosférica e civil

Do latim, tempestate, corresponde a “agitação violenta da atmosfera, acompanhada muitas vezes de relâmpagos, trovões, chuva e granizo” e também a “ventos violentos que mudam mais ou menos subitamente”.

“Tempestade” significa ainda “temporal no mar, caracterizado pelo encapelamento das ondas e pela agitação do vento”. Houve de tudo isto nos EUA, numa tempestade a que se chamou Sandy. Na origem, o “furacão”:

“Ciclone tropical com velocidade da ordem dos 150 km/h” e “coisa que destrói ou provoca grandes males”. Tudo verdade, como comprova o estado em que Nova Iorque e New Jersey (em português, Nova Jérsia) ficaram. “E o Sandy ainda não acabou”, disse o Presidente Barack Obama, referindo-se à crise que provocou.

Fora do sentido meteorológico, “tempestade” quer dizer “agitação, desordem, perturbação” e, mais concretamente, segundo alguns dicionários, “agitações civis num Estado”. Para se observar e viver este tipo de tempestade”, não foi preciso mudar de geografia. Bastou acompanhar a votação do Orçamento do Estado português para 2013 e assistir aos protestos frente ao Parlamento. E não se aplicará aqui a expressão “fazer tempestade em copo de água”, que significa “fazer estardalhaço,  grande agitação por motivo insignificante”. Mas pode aplicar-se outra, a de “clima tempestuoso”. E não se está a falar de ventania ou granizo.

 

OUTUBRO


28 de Outubro
Sentença


Quando a ciência vai a julgamento

“Julgamento proferido por um juiz, tribunal ou árbitros.” Do latim, sententia, a palavra “sentença” também pode ser entendida como “veredicto”. Seis anos de prisão por homicídio involuntário, no caso dos seis cientistas julgados em Itália, na segunda-feira, “devido a falhas de comunicação do risco sísmico à população de Áquila antes de um tremor de terra que, dias depois, matou 309 pessoas”, noticiou o PÚBLICO. Inédito. Reacção do geofísico Miguel Miranda, presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que vigia a actividade sísmica no território português: “Os cientistas e as organizações públicas não vão dizer nada ou vão passar a ser alarmistas e dizer que vêm aí sismos de magnitude 10 [nunca houve nenhum com um tal valor] em todos os sítios, porque essa é a forma que têm de se proteger.” Alfredo Campos Costa, especialista em engenharia sísmica do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, disse, com ironia: “Tendo em conta o que aconteceu, o melhor é estar já calado.” Mas ainda considerou a questão “muito insólita e idiota”. De volta ao dicionário: “rezar a sentença” quer dizer “ditar ou impor uma decisão ou uma ordem”. Exemplo: “O pai já lhe rezou a sentença: nas férias vai trabalhar.” Também se regista “sentença” como “o julgamento de Deus acerca dos homens”. De volta às notícias: o jornal El Mundo lembrou Galileu a propósito da condenação. E como “cada cabeça sua sentença”, uns duvidam da ciência, outros da justiça.


21 de Outubro
Contas

Afinal de contas, as contas são por conta

Substantivo feminino plural que corresponde “às quatro operações”: adição, subtracção, multiplicação, divisão. “Contas” e “cálculos” são sinónimos. E é o que os portugueses andam a fazer a partir da aritmética do Governo para o Orçamento do Estado para 2013, que o mesmo é dizer para o orçamento de cada um de nós. Tabelas, gráficos, simulações, percentagens, escalões e números com muitos zeros invadiram os jornais, os sites e as televisões. Para ajudar os cidadãos, preocupados em fazer “contas à vida”. O dicionário é generoso nos registos de frases feitas em que entram as palavras “conta” e “contas”. Alguns exemplos: “Afinal de contas” (em conclusão); “dar conta do recado” (ser capaz de cumprir uma tarefa) “pagamentos por conta” (para amortizar uma dívida); “fazer de conta” (fingir); “à conta de” (por causa de); “com conta, peso e medida” (com moderação); “em conta” (a um preço acessível); por “conta própria” (de forma independente). Pode-se até criar uma frase usando vários destes sentidos, só por exercício lúdico: o Governo acha-se capaz de “dar conta do recado” da dívida à troika com os “pagamentos por conta” dos contribuintes. Mas espera que estes “façam de conta” que não se “dão conta” de que é “à sua conta” que, “afinal de contas”, resolve todas as contas. “Contas” também significa “rosário”, “terço”. Se tem fé, reze. Se não tem, reze também.


14 de Outubro
Pobreza

Falta de dinheiro e de ideias 

“Estado ou condição de pobre, carência de recursos”, lê-se num dicionário. Noutro, regista-se: “Conjunto de pessoas carenciadas do necessário para a sua sobrevivência.” Frase que acompanha esta definição: “A pobreza envergonha a humanidade civilizada.” Mas só alguns dos “civilizados” se comovem, como revelou o episódio de quinta-feira no Bairro do Cerco, em que a Polícia Municipal do Porto desmontou a tenda onde vivia uma família com seis crianças. “Isto é pobreza, sabe? Não é mais nada. São pessoas educadas, que têm os filhos bem tratados e que não causam problemas. Onde está a coisa que tanto se diz de acudir aos pobres?”, disse uma moradora no bairro, de 63 anos. De “pobreza” e “empobrecimento” também falam os opositores do Orçamento do Estado.

José Seguro (PS) escreveu no PÚBLICO que “o que se sabe do Orçamento para 2013 mostra que o Governo vai insistir no erro e consequentemente no empobrecimento do país”; João Semedo (BE) disse que “as privatizações são um instrumento activo do empobrecimento do país”; o fiscalista Tiago Guerreiro disse à Antena 1 que “o aumento da carga fiscal leva a um empobrecimento inevitável”.

E o líder parlamentar do PS, Carlos Zorrinho, já começou a poupar nas despesas do país: passou de um BMW 5 para um Audi 5 “porque era significativamente mais barato”, escreveu no Facebook. Pobreza...

São vários os tipos de “pobreza” a que se pode assistir por estes dias, em muitos sectores: “pobreza de espírito”, que significa “falta de cultura” e “de perspectivas”, ou “uma pobreza confrangedora de ideias”. “Empobrecer” é “tornar ou ficar pobre ou mais pobre”. E nem sempre se trata de dinheiro (falando na consequência e não na causa), mas de “fazer perder ou perder a qualidade, a riqueza, a variedade”. Vem um exemplo: “A programação televisiva tem vindo a empobrecer.” Podia ser outro.


7 de Outubro
Ajustamento

Encaixe perfeito e liquidação de contas

“Diz-se de duas ou mais coisas que se unem de maneira perfeita, justa, que se encaixam bem umas nas outras.” Até soa bem. Mas os dicionários também registam os significados “ajuste”, “contrato”, “convenção” e “liquidação de contas”. E para que se liquidem as contas que envolvem Portugal e a troika foi anunciado por estes dias um “ajustamento” que implicará um “enorme aumento de impostos”, nas palavras de Vítor Gaspar. “Brutal” nas palavras de muitos outros. E logo as siglas IRS e IMI invadiram os jornais e o pensamento dos portugueses. 

Mas o “ajustamento” já começou antes e, para o presidente do BPI, Fernando Ulrich, é “notável”. Disse-o na conferência da revista Exame, acrescentando: “Devíamos chapar isso na cara desses articulistas do Financial Times.” Jornal que afirmou na quinta-feira que, “ainda que os indicadores nacionais demonstrem optimismo, um olhar próximo revela que Portugal cada vez mais combina alguns dos piores aspectos da Grécia e da Irlanda”. Resposta do ministro das Finanças: “Vamos cumprir o nosso lado do acordo.” E disse também ao Financial Times não tencionar pedir mais auxílio financeiro nem prazos alargados para o cumprimento das metas orçamentais. Ou seja, nada de se “ajustar” a novas situações, como renegociar a dívida. “Ajustar” quer dizer “acertar”, “adaptar”, “conciliar”, “harmonizar”. 

O “ajustamento”, disse Passos Coelho, vai prosseguir “de modo controlado, passo a passo, protegendo os mais fracos”. Tudo sobre “o melhor povo do mundo”, disse Vítor Gaspar. Até soa bem.

 
SETEMBRO


30 de Setembro

 

Extinção

Fundações, bichos e fábulas

 

“Acto ou efeito de extinguir” é o primeiro esclarecimento do dicionário para o substantivo feminino “extinção”, que também equivale a “abolição”, “aniquilamento” e “morte”. Em quarto lugar, regista: “Acção de pôr fim a uma instituição, entidade, etc.” Exemplos: “A extinção de um instituto público”; “a extinção de um imposto”. Simpático, este último. 

A lista para a extinção de fundações já foi divulgada: “Numa lista de 230, o Governo quer extinguir 38.” Há câmaras a recusar, outras a aceitar e outras indecisas. O verbo “extinguir” tem o sentido de “fazer desaparecer” e “acabar de todo com”. Daí que alguns sectores criassem a expectativa de “supressão” de mais fundações (como a Social Democrata da Madeira, por exemplo). E a expressão “a montanha pariu um rato” voltou ao discurso político. “A montanha pariu um rato, e duas coisas podem ter acontecido: ou o Governo sobrevalorizou a montanha e não havia assim tantas gorduras nas fundações como era dito; ou o Governo não foi rigoroso na sua análise”, disse Carlos Zorrinho, líder parlamentar do PS. Do outro lado, veio a resposta: “Se a montanha pariu um rato, houve um rato, leia-se Largo do Rato [sede do PS], que ao longo dos anos pariu montanhas”, disse Luís Montenegro, líder da bancada do PSD. Mas nos últimos dias houve outros animais com protagonismo. O ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, invocou uma fábula para caracterizar Portugal, considerando que não pode ser “um país de muitas cigarras e poucas formigas”. Usando também uma expressão comum, foi uma semana “entregue aos bichos”. Nenhum em vias de extinção.

 

 

23 de Setembro

 

Taxa

Contribuição mensal, percentagem, tributo

 

Há vários significados para o nome feminino “taxa”.

Tanto pode ser “prestação que se exige dos particulares que utilizam um serviço público”, como “regulamento que estabelece as custas dos processos judiciais” ou “quantia fixa cobrada por certos serviços”. Também equivale a “tarifa”, “tributo” e “percentagem”. Explorando um pouco mais os sentidos ligados à economia, consegue chegar-se a uma definição de Taxa Social Única, cuja sigla – TSU – se repetiu e repetiu nos últimos dias. Taxa Social Única corresponde então “a contribuição mensal para a Segurança Social que incide sobre o salário de cada funcionário e que deve ser paga por este e pela empresa onde trabalha”. O dicionário não se aventurou em números. E fez bem. Quem se aventurou deu-se mal.

O anúncio da intenção de alterar a TSU (aumentando de 11% para 18% os descontos dos trabalhadores e reduzindo de 23,75% para 18% a parte dos empregadores) provocou protestos da sociedade civil, das empresas e dos políticos. Houve até alguns conselhos, como o de António Vitorino: “Não se deve levar longe de mais o esticar da corda (...), um dia ela pode mesmo romper.” No final da semana, havia indícios de abertura para “alterações à alteração”, que seriam logo apresentadas na sexta-feira ao Conselho de Estado. Antes, o PSD convidou o CDS para “renovar apoio ao acordo de coligação” – por causa da “taxa”. Amanhã, depois da reunião com os parceiros sociais, se saberá se haverá ou não recuo. “Taxa” e “imposto” são sinónimos, mas em certos contextos não se devem “confundir”, dizem os advisers


16 de Setembro
Manifestação

Demonstração popular para exprimir opinião

“Demonstração popular, pelas ruas, para exprimir qualquer opinião, qualquer protesto.” É assim que a maior parte dos dicionários regista a palavra “manifestação”. Com algumas variantes curiosas, como a de um dicionário mais antigo, que fala em “publicidade de sentimentos ou opiniões colectivas”.

Outra formulação: “Ajuntamento de pessoas destinado a exprimir publicamente um sentimento, uma opinião política.” Outra ainda: “Demonstração popular nas ruas, com acompanhamento de cantos, de gritos, de emblemas, etc., para exprimir qualquer opinião pública.” Como por exemplo: “Que se lixe a troika, queremos as nossas vidas.” Mote das manifestações marcadas para ontem em algumas cidades do país, contra as mais recentes medidas de austeridade anunciadas pelo primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho. “Inconstitucionais”; dizem alguns; “injustas”, dizem muitos; “inaceitáveis”, dizem quase todos.

Para Manuela Ferreira Leite, ex-líder do PSD, o país ficará “destroçado”. Para o jornalista Pedro Santos Guerreiro, do Jornal de Negócios, “o curso da revelação destas medidas mostra a hierarquia do poder em Portugal (...) a troika quer, Gaspar sonha, a obra de Passos nasce. Um escreve o texto, o outro implementa, o último lê-o.” “Acto ou efeito de manifestar” é outra forma de definir “manifestação”. E antes de chegar à rua andou pelas redes sociais. Desta vez, não se deixou ficar por lá.


9 de Setembro
Medalha

Chapa a que todos os atletas aspiram

Diz um dicionário antigo: “Peça metálica, geralmente redonda, com a representação de personagem ou sucesso notável e respectiva inscrição. Insígnia de Ordem honorífica.” Acrescenta um mais recente: “Chapa metálica, gravada e revestida a ouro, prata ou bronze e que é atribuída, respectivamente, ao primeiro, ao segundo ou ao terceiro prémio de uma competição desportiva, de um concurso ou de um certame. Nos Jogos Olímpicos, todos os atletas aspiram a uma medalha.” Nos Paralímpicos, também.

Esta semana, os portugueses Armando Costa, José Macedo e Luís Silva conquistaram uma de prata. Modalidade: boccia (destinada a atletas com paralisia cerebral e doenças neuromusculares).

No atletismo, foi Lenine Cunha que, ao saltar 6,95 metros em comprimento, garantiu uma medalha de bronze para Portugal. “Esta era a medalha que faltava e foi conseguida num ambiente fantástico”, disse o atleta ao Record. E dedicou-a ao treinador, José Costa Pereira, à família e aos amigos. “Têm sido incansáveis a enviar mensagens de apoio.” Mas não houve manchetes.

“Medalha” também significa “caixinha de tampa que as mulheres usavam ao pescoço como adorno”. Em linguagem familiar, corresponde a “pequena nódoa ou sujidade numa peça de vestuário”.

Já “medalhão” quer dizer, em sentido figurado e depreciativo, “indivíduo nulo, sem valor real, guindado a posições altas pelo dinheiro ou pela influência de boas amizades, jeitosamente conseguidas”. Costumam ser manchete.


2 de Setembro
Televisão

Telecomunicação explorada por alguém

Nome feminino. “Sistema de telecomunicação que permite a transmissão e a recepção de imagens instantâneas, convertidas em sinais electromagnéticos, por meio de ondas hertzianas ou de cabo coaxial”, informa um dicionário, para logo em seguida nos dar todas as explicações sobre as diferenças entre “televisão por cabo” e “televisão por satélite”. Resumindo: o primeiro transmite “sinais áudio e vídeo através de uma rede de cabos ópticos” e o segundo garante “o transporte dos sinais de imagem e de som a grande distância”, usando “uma ligação de satélites de telecomunicações”.

Alguns caracteres mais adiante, o dicionário dá-nos o que procurávamos. “Televisão: organismo estatal ou empresa que explora esse sistema de telecomunicações.” E regista as expressões “televisão estatal” e “televisão privada”, em separado. Nada de concessões.

Outro entendimento tem o consultor do Governo António Borges, que considerou na semana passada, em entrevista à TVI, “muito atraente” a possibilidade de concessionar a RTP1 a investidores privados.

E acrescentou que a RTP2 irá “muito provavelmente” fechar.

Reacções: “Pouca-vergonha”, disse Mário Soares; “inconstitucional”, afirmou Adriano Moreira; “uma anedota” e “uma negociata”, disseram os trabalhadores da RTP. Passos Coelho, dias mais tarde, preferiu falar em “processo de alienação”, garantindo que o vai estudar “sem tabus”. Paulo Portas já assumiu não concordar.

O programa segue dentro de momentos. Ou não.


AGOSTO
 

26 de Agosto
Sucessão

Passagem de direitos e obrigações

“Acto ou efeito de suceder” e “situação em que uma pessoa fica investida num direito ou numa obrigação que antes pertencia a outra pessoa”, dizem os dicionários.

Falam no singular porque não registaram ainda a “solução do século XXI” proposta por Francisco Louçã para a sucessão de si próprio no Bloco de Esquerda (BE).

Aí, teriam de substituir a expressão “uma pessoa” por “duas pessoas”. Os nomes escolhidos pelo coordenador daquele partido são o médico João Semedo e a actriz Catarina Martins. A ideia provocou uma “sucessão” de reacções no BE. Ou seja, uma “série de coisas ou acontecimentos que se seguem ou se sucedem em determinada ordem”. Para Ana Drago, “há outros modelos de direcção” e “todas as possibilidades estão ainda em aberto”. Para Daniel Oliveira, “a solução bicéfala (ou tricéfala, se a ela acrescentarmos a liderança parlamentar, que obviamente ganha outra relevância na ausência de um coordenador único) gera confusão, descoordenação e enfraquece o partido”. A ala da UDP “considera que uma solução colegial com vários porta-vozes seria uma melhor opção”. “Sucessor” significa “aquele que tem a mesma dignidade ou os mesmos predicados que outrem teve”.

Na História, houve várias “guerras de sucessão”, casos de Espanha, Áustria e Polónia.

Na Matemática, uma “sucessão oscilante ou indeterminada” quer dizer “aquela que não tem limite finito nem infinito”.

O “sucessor de São Pedro” é o “Sumo Pontífice da Igreja católica”. O de Louçã ficará a conhecer-se em Setembro.


19 de Agosto
Submarino

Embarcação que submerge e emerge

Como adjectivo, “submarino” regista-se assim: “Que acontece, vive, cresce debaixo do mar ou no seio das águas marinhas.” Como substantivo: “Embarcação destinada a operar submersa, sendo as suas principais missões militares afundar navios inimigos por meio de torpedos e bombardear instalações do inimigo por meio de mísseis.” Num dicionário antigo, lê-se “immergido no mar” (duplo “m”) e “barco submarino destinado a navegar por baixo da superfície da água”. Ou seja, submarinos são embarcações que ora “submergem” ora “emergem”, como certas notícias. Analogia “roubada” ao ex-jornalista Paulo Portas, ex-ministro da Defesa e actual ministro dos Negócios Estrangeiros. “Há oito anos que, de vez em quando, notícias dos submarinos emergem e depois, de repente, submergem. Quando interessa, aparecem e, quando deixa de interessar, desaparecem”, afirmou em Ponta Delgada, Açores.

A “emersão” do assunto ocorreu quando o Jornal de Notícias divulgou que “grande parte da documentação dos submarinos desapareceu do Ministério da Defesa”.

O actual ministro da pasta, José Pedro Aguiar-Branco, perguntou: “Quais documentos?” E explicou que não recebeu “qualquer notificação” da Procuradoria-Geral da República.

“Submergível” e “submersível” são sinónimos de “submarino”. O verbo “submergir” significa “afundar”. Bernardo Ayala assessorou juridicamente a Defesa no processo, “foi arguido na investigação do Departamento Central de Investigação e Acção Penal ao negócio e vai pedir uma indemnização ao Estado”, noticiou-se.

Um dicionário brasileiro descreve “caça submarina”: “Esporte que consiste em mergulhar, seguir a nado o peixe e atacá-lo com arpão.” Antes que chegue à superfície.
 

12 de Agosto
Fundação

Património com fins desinteressados?

“Acto ou efeito de fundar, de instituir” é um dos significados do substantivo feminino “fundação”. Outros sentidos: “alicerces”, “pessoa moral ou colectiva que resulta da constituição de um património destinado a fins desinteressados” (a parte dos “desinteressados” é bonita) e “instituição de interesse público criada por doação” (igualmente bonito).

No início do ano, foi lançado um censo obrigatório a 401 fundações portuguesas, para que o Governo as avaliasse.

A 2 de Agosto, publicou-se o relatório da análise, mas 37 fundações ficaram de fora por “insuficiência de informação disponibilizada”. Entretanto, ganharam tempo para entregar “os elementos em falta”. Daqui a menos de um mês, Vítor Gaspar, ministro das Finanças, “terá de tomar uma decisão final e publicar as listas das fundações que vão continuar a receber apoios do Estado”, noticiou-se.

Objectivo: reduzir o peso do Estado paralelo. Pormenores: é em 227 fundações que se estima cortar por ano entre 150 milhões e 200 milhões de euros. Fundações que não são de solidariedade social (IPSS). Um período feliz para o reconhecimento de fundações são os três meses que antecedem as eleições legislativas, segundo uma análise do PÚBLICO. E é possível uma instituição ser reconhecida antes mesmo de ser instituída. Caso da Fundação Paula Rego, que nasceu a 4 de Setembro de 2009 e foi reconhecida a 31 de Agosto. Antes de ser já o era. Em Angola, “fundação” corresponde a julgamento em tribunal segundo os usos e costumes cabindas.


5 de Agosto
Jogos

Espectáculo desportivo em honra de Júpiter

Plural de “jogo”, que é um substantivo masculino com inúmeros significados.

Muitos dicionários registam mais de 20, desde “exercício ou passatempo entre duas ou mais pessoas das quais uma ganha, e a outra ou as outras perdem” a “manobra” ou “disfarce”. Mas também “espectáculo desportivo”.

Eis o que nos tem sido dado a assistir por estes dias a partir de Londres.

“Sessão pública em que decorrem actividades lúdicas e competitivas com a presença de espectadores” foi outra definição encontrada para “jogos”.

No capítulo dos exemplos, todos remetem para Jogos Olímpicos ou Olimpíadas.

E explicam: “Jogos que se celebravam de quatro em quatro anos, perto de Olímpia (Peloponeso), em honra de Júpiter.” Alguns acrescentam “grande evento desportivo com diversas modalidades, realizado de quatro em quatro anos, em países diferentes, desde 1896”.

Ou ainda “série de provas de atletismo realizadas na Grécia antiga em honra de Zeus; competição desportiva internacional, em que estão representadas todas as modalidades aprovadas pelo COI (Comité Olímpico Internacional)”.

A origem da palavra “jogo” é latina e deriva de “jocus”, “divertimento”. Um dicionário enciclopédico conta que “a origem dos Jogos remonta ao ano de 776 a.C. e a lenda atribui a sua criação a Hércules. Os vencedores eram coroados.” Nestes tempos, pelo menos de quatro em quatro anos, desporto não é sinónimo de futebol.


JULHO


29 de Julho
Lixar

Polir, não fazer caso, tramar

Verbo transitivo (como o poder) que significa “desgastar com lixa, para tornar liso”. O mesmo que “polir”, mas também “tramar”.

Na forma reflexa e na gíria, “que se lixe!” quer dizer que “não importa”, “não vale a pena fazer caso”. Revela portanto “despreocupação” e “indiferença”. Algo para que a pessoa se está “borrifando”.

Do género: “Perdi as eleições, que se lixe!” Foi nesta forma elegante que Passos Coelho se dirigiu ao grupo parlamentar do PSD para assinalar o fim da sessão legislativa na Assembleia da República.

“Se algum dia tiver de perder umas eleições em Portugal para salvar o país, como se diz, que se lixem as eleições, o que interessa é Portugal.” A ser sincero, o discurso até cai bem. Mas para a CGTP não colhe. Arménio Carlos, secretário-geral, aproveitou a expressão: “O primeiro-ministro está a lixar-se para os portugueses, senão (...) já tinha invertido as políticas que neste momento são responsáveis pelo aumento da austeridade e dos sacrifícios.” Carlos Zorrinho, líder parlamentar do PS, também: “Quem se está a lixar para as eleições está a lixar-se para os eleitores.” O dicionário dá outras explicações para “lixar”: “Causar irritação.” E exemplifica: “Parem de me lixar a cabeça com esse assunto.” Com o significado de “causar ou sofrer danos”, as frases registadas são “não me lixem o negócio” e “caiu da bicicleta e lixou-se todo”.

Faltou encontrar um exemplo com o famoso bivalve, o mexilhão. Na versão do Brasil, “quem se lixa” é um crustáceo: “Quando o mar briga com a praia, quem apanha é o caranguejo.”


22 de Julho
Incêndio

Fogo, calamidade, crime

Substantivo masculino que significa “fogo que lavra e devora” e “acto ou efeito de incendiar”. Numa semana em que as temperaturas foram elevadas e o vento se passeou pelo país (incluindo regiões autónomas), foram muitos os incêndios que centenas de bombeiros enfrentaram.

Na noite de quarta-feira, era esta a descrição do PÚBLICO sobre a situação em Portugal: “Estradas cortadas, casas e palheiros queimados, pessoas deslocadas e o Parque Natural da Arrábida atingido pelas chamas. É este o cenário dos incêndios esta quarta-feira no país, com a Autoridade Nacional de Protecção Civil a contabilizar 148 ocorrências até ao início da noite, altura em que se mantinham activos 15 fogos. Os dez incêndios mais relevantes eram combatidos às 20h30 por quase 1500 operacionais.” A ilha da Madeira foi um dos territórios que suscitaram maior preocupação.

Sentidos figurados para incêndio: “ardor”, “grande calor”, “conflagração”, “entusiasmo” e “calamidade” (sentido figurado?).

Segundo o mais recente relatório da Autoridade Florestal Nacional, “até 30 de Junho, tinham ardido 35 mil hectares de floresta, quase três vezes mais que a média da última década”.

Sinónimos: “lume”, “fogo”.

Exemplos de expressões com “fogo” registadas no dicionário: “a fogo lento” (a pouco e pouco); “brincar com o fogo” (tratar descuidadamente das coisas perigosas); “fogo vivo” (tiroteio renhido).

Por último, “fogo posto” (incêndio provocado) – “criminoso”. Sem sentido figurado.


15 de Julho
Médico

Cura no serviço público e no privado

“Aquele que é diplomado pelas faculdades ou escolas de Medicina” e “que exerce a Medicina”. Quando não faz greve. Mesmo que faça, continua a ser um “clínico”.

Por extensão, alguém “que cura, que sara qualquer mal”.

Na quarta e quinta-feira, estes “profissionais da Medicina” não foram trabalhar, pelo menos nos centros de saúde e nos hospitais públicos. Se deram consultas nos seus consultórios ou noutras empresas, não se sabe. E é feio entrar na esfera privada dos fiéis ao Juramento de Hipócrates, que tem frases como estas (tradução livre): “Juro solenemente consagrar a minha vida ao serviço da humanidade”; “os meus colegas serão minhas irmãs e irmãos”; “manterei o máximo respeito pela vida humana”.

Como não acreditar em quem, mais cedo ou mais tarde, nos terá nas suas mãos? Sejam públicas, privadas ou em parceria? “A greve dos médicos é uma comédia”, escreveu Henrique Raposo (Expresso). E deixou alguns dados: “(...) há dois anos, o Estado pagava 80 euros por hora, e agora paga entre 25 e 30 euros. Eis, portanto, a razão da greve.

Receber 30 euros por cada hora extraordinária é, sem dúvida, uma exploração feudal.” Lembrou também que esta classe “navega no pleno emprego. Ao sair da faculdade, um jovem médico tem sempre colocação”.

No primeiro dia de greve, cerca de duas mil batas brancas (segundo a PSP) manifestaram-se em frente ao Ministério da Saúde. Não se insurgiam assim desde os anos 1980. (Mas a vida agora também lhes corre mal.) Traziam uma tarja preta e um autocolante onde se lia “Em defesa do Serviço Nacional de Saúde”. Alguns utentes acreditaram, outros não.


8 de Julho
Licenciatura

A duração depende do currículo

Substantivo feminino que significa “grau académico obtido após a conclusão de um curso universitário, numa área alargada do conhecimento (científico, literário, artístico, etc.)”. Não se diz em quanto tempo nem onde. Mas a 2 sabe. Se for num ano, é na Lusófona. Haja currículo.

Divulgou-se esta semana que foi assim que o ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, conseguiu uma licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais.

Para a Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado, na voz de João Redondo, “não é de todo vulgar”. Para o reitor Mário Moutinho, “este procedimento é comum desde a aplicação do processo de Bolonha”.

E as propinas? Será que teve de se endividar na Caixa Geral de Depósitos, como sugeriu por estes dias o presidente da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, José Duarte, a 2300 alunos? Não será fácil pagar três anos de uma vez. A menos que... haja currículo.

Um “licenciado” – num dicionário antigo – “é alguém que tem o título universitário imediatamente anterior ao de doutor”; num mais recente, “é uma pessoa que obteve o grau universitário de licenciatura, após a conclusão de um curso numa área específica”.

Por extensão, corresponde a alguém “instruído”. Em Portugal, porque, no Brasil, quer dizer “aquele que exerce profissão liberal devidamente autorizado, embora não haja cursado o ensino superior”.

Ou que está “despedido, dispensado do serviço”.


1 de Julho
Penálti

Grande penalidade e uma pena grande

Substantivo masculino de origem inglesa, penalty. Muito provavelmente, o leitor saberá do que se trata (e não pelos melhores motivos).

A definição que o dicionário revela é esta: “No futebol, castigo aplicado contra uma equipa por uma falta cometida por um dos seus atletas dentro da grande área e que corresponde ao direito a um remate que pode ser defendido apenas pelo guarda-redes.” A enciclopédia acrescenta: “A cobrança de penáltis também está prevista no regulamento de algumas competições futebolísticas, quando a igualdade no marcador insiste em prevalecer, geralmente em jogos decisivos ou eliminatórios.” Foi o que aconteceu na quarta-feira, na meia-final do Europeu entre Portugal e Espanha.

Mais: “É cobrada uma série de cinco penáltis para cada equipa, até que uma seja declarada vencedora por ter feito pelo menos um golo a mais do que o rival.” Espanha marcou quatro e Portugal apenas dois. João Moutinho e Bruno Alves falharam. Espanha venceu.

Durante os penáltis, “os jogadores de ambas as equipas permanecem no círculo central”, exceptuando, obviamente, os guarda-redes (“goleiros”, como se diz no Brasil).

Quando o empate persiste depois das cinco tentativas de cada lado, as equipas vão alternando novos remates até que uma consiga pôr a bola dentro da baliza e vença.

Sinónimo de pénalti: “grande penalidade”. Quando se perde: uma pena grande.


JUNHO


24 de Junho
Português

Todo aquele que não é sisudo

Adjectivo, do latim portucalense. “Relativo ou pertencente a Portugal”, “próprio de Portugal”. Como substantivo, regista-se: “Aquele que nasceu ou se naturalizou em Portugal” e “habitante ou cidadão de Portugal”. Os dicionários poderiam acrescentar “que, em tempos de campeonato de futebol, exibe a bandeira nacional”.

Sinónimos: “lusitano”, “luso”.

“Português” também diz respeito a um “sistema linguístico” e a uma disciplina obrigatória até ao 12.º ano (em certos níveis, designada Língua Portuguesa). Na semana que passou, centenas de alunos prestaram provas neste domínio. Alguns terão sabido antes os conteúdos do exame da “língua de Camões”. “À maneira portuguesa” é uma expressão que equivale aos advérbios “portuguesamente” (em desuso) e “portuguesmente”.

Em sentido figurado, um “português” é alguém “franco, leal, apesar de rude”.

Não se diz que é “piegas” nem “que tem paciência” - para recordar palavras do primeiro-ministro (também) português.

No Mato Grosso (Brasil), português é a “designação de todo aquele que não é sisudo”. Ainda no Brasil, há a expressão “portuguesada”, que significa “reunião de portugueses”, mas também “linguagem rude”, “chalaça”, “grosseria”.

“Falar português claro” significa “dizer as coisas como elas são”. E “em bom português” quer dizer “em linguagem clara e correcta”.

Na agricultura, “português” corresponde a uma “variedade de trigo mole”.


17 de Junho
Dívida

É mais difícil pagar do que pedir

Substantivo feminino de origem latina: debïta, plural de debïtu. Significa “o que se deve”, “obrigação de pagar alguma quantia de dinheiro a outrem”. A um amigo, a um banco ou a um fundo. Os dicionários estão cheios de dívidas: activa, amortizável, certa, coberta, consolidada, interna, externa, nacional, pública, fiscal, flutuante, passiva, privilegiada, quirografária, solidária, vitalícia. Decifremos algumas.

A “interna” corresponde ao “total da dívida pública contraída dentro do país”; já a “externa” é aquela que “o Estado contrai no exterior, em nome do interesse público”. A “nacional” diz respeito à “acumulada pelo governo, interna e/ou externa”, enquanto a “pública” se traduz no “conjunto das obrigações de natureza financeira contraídas pelo Estado”. Há portanto muitas maneiras de o Estado se endividar. De pagar as dívidas, nem tanto.

Para que os países do euro consigam pagar as suas, o Parlamento Europeu está a discutir a criação “de um fundo de amortização de dívida, aplicável aos países com dívidas superiores a 60% do PIB”. Isto na semana em que Espanha pediu ajuda para os bancos e em que foi crescendo a especulação à volta da probabilidade de um pedido de resgate para cobrir as necessidades de financiamento do país. Mas Espanha vai negando.

De quem não cumpriu um dever, diz-se que “está em dívida” moral. Há ainda a “dívida de honra”. Esta tem como garantia “a ética, a integridade e a probidade do devedor”. Já não se usa.


10 de Junho
Selecção

Do desporto ao circo

“Escolha de indivíduos mais fortes para perpetuar a espécie”, “escolha instintiva feita pelos próprios animais entre si” e também “a preferência dada pelas fêmeas aos machos mais fortes e mais belos”. Só à sétima explicação, os dicionários atribuem a este substantivo feminino o sentido de “grupo de jogadores de qualquer desporto representativo de um país, de uma região, de uma cidade”. Mas o “qualquer desporto” a que Portugal presta mais atenção é ao futebol. E não a todos os escalões.

A selecção de sub-21 ganhou por 3-1 à Albânia, na quarta-feira (continuando na corrida para o Euro 2013), mas pouco se deu por isso. Não houve “circo”. Palavra usada pelo treinador Manuel José Jesus, em entrevista à TSF: “Em 80% das vezes, o primeiro jogo determina o futuro. Isto não é profissional. Anda um país inteiro atrás de uma selecção que passa a vida em festas e mais festas e charretes. É um circo autêntico.” 

Carlos Queiroz, antigo seleccionador, reforçou a ideia: “Eu próprio me confrontei com uma tentativa muitas vezes absurda e até ridícula de exactamente transformar a selecção num circo.” E deu como exemplo a proposta que recebeu “para que fossem os adeptos a escolher o 23.º jogador para o Mundial 2010”.

“Seleccionador” é “aquele que pratica a selecção” e “escolhe, entre jogadores profissionais, os que hão-de constituir determinado grupo para enfrentar num desafio desportivo”. Mas também “máquina para classificar, por tamanhos, minerais ou quaisquer matérias, para separar o coque das escórias”. Nem sempre com sucesso. 

3 de Junho
Secreta

Revelação só para alguns

Comecemos pela forma masculina, “secreto”. Adjectivo de origem latina: secretus. Explicações de diferentes dicionários: “Que não é do domínio público”; “que não é visível ou facilmente acessível”; “que se conserva oculto”, mas também “revelado apenas a algumas pessoas”.

Como sinónimos, regista-se: “confidencial”, “privado”, “encoberto”, “dissimulado” ou “íntimo”, “profundo”.

Também significa “segredo”, que, explicam os cínicos, “é algo que se diz ao ouvido de toda a gente”. Ou (em versão actualizada) que se envia por sms. No feminino, “secreta”, refere-se a “polícia que lida com informações relativas à segurança do Estado”; isto é, “polícia secreta” ou “serviços de informações”. Tema escolhido pelo primeiro-ministro para o debate quinzenal na quarta-feira passada na Assembleia da República, a que se seguiu a audição de Miguel Relvas (ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares) em comissão parlamentar.

“Espionagem”, “espiões”, “espiar” também poderiam ser as palavras da semana, mas já as “gastámos” antes, nos casos das “escutas telefónicas”. Estes parecem ser tempos de (má) literatura policial.

Mas há outros sentidos para a palavra “secreta”. Alguns inesperados. Antigamente, era uma “tese defendida na universidade só na presença dos lentes”. Na liturgia, significa a “oração que o sacerdote recita na missa, depois do ofertório e antes do prefácio; corresponde à colecta e pós-comunhão e, como estas, varia conforme o tempo, férias e festas”.

Num registo popular (e escatológico), “secreta” quer dizer “latrina”.

 
MAIO

 

27 de Maio
Adenda

Acrescento, apêndice ou remendo?

Uma “adenda” significa “o que se deve acrescentar no fim de uma obra escrita”. Há dicionários que falam em “acrescentamento no fim de um texto ou livro” e em “conjunto de artigos, notas, declarações que se acrescenta no fim de um livro, contrato ou acta”. Nenhum dá como exemplo adenda a um tratado, que foi o que se discutiu no Parlamento no final da semana. No caso, ao tratado orçamental.

O PS propôs uma adenda (também designada “protocolo” e “acto adicional”) para “o emprego e crescimento”. E conseguiu aprová-la, por abstenção da maioria (PSD e CDS). À segunda, foi de vez.

Jerónimo de Sousa (PCP) preferiu chamar-lhe “remendo”, dizendo que só pode levar “a uma falsa saída”. O seu partido votou contra, assim como o Bloco de Esquerda e o Partido Ecologista Os Verdes.

Cavaco Silva (Presidente da República) ficou todo contente: “Só posso congratular-me com essa notícia. É importantíssimo que Portugal se possa apresentar na cena internacional como um país onde existe coesão política e coesão social na aplicação de um programa negociado com instituições internacionais.” Voltando aos dicionários.

“Complemento”, “acréscimo”, “aditamento”, “livro, caderno de notas ou de anotações suplementares e esclarecimentos” são outras definições para “adenda”, que vem do latim “addenda: as coisas que devem ser acrescentadas”. Sinónimo: “apêndice”.

Se as adendas servirão para alguma coisa, on verra. Para usar a língua de François Hollande (Presidente francês), que também parece acreditar nelas.


20 de Maio
Desempregado

Para além da estatística

“Que está sem emprego, sem ocupação” e “indivíduo em idade activa que se encontra sem trabalho remunerado”.

Duas definições para “desempregado”, que tanto pode ser adjectivo como nome. Social e pessoalmente, segundo Passos Coelho, tem tudo para ser uma “oportunidade”. Disse o primeiro-ministro: “Estar desempregado não pode ser um sinal negativo”; “tem de representar também uma oportunidade para mudar de vida”. Já o ministro das Finanças parece não ter visão equivalente. Palavras de Vítor Gaspar: “Comparado com outras experiências negativas, a satisfação de vida de um desempregado não se recupera, mesmo depois de estar desempregado há muito tempo.” Vamos ao verbo – sempre no princípio das coisas.

“Desempregar” significa “tirar o emprego a”; “despedir do trabalho”; “privar do emprego ou cargo”; “demitir”. Também pode ser o trabalhador a “desempregar-se”, isto é, a “abandonar voluntariamente, o trabalho”. Decerto, num incontrolável impulso de empreendedorismo (palavra feia e comprida). Disse o primeiro-ministro: “Despedir-se ou ser despedido não tem de ser um estigma.” Disse o dicionário: “A crise económica desempregou muita gente.” Disse o INE: “Taxa de desemprego de 14,9%.” Com contagens mais ou menos rigorosas, é de pessoas que se trata: João, Vítor, Inês, Francisco, Luís, André, Rita, Gurwinder, Nélson, João Paulo, Tiago, Michael, Aguinaldo, Ana, Hélder são os desempregados que nos fitam no blogue O Desemprego Tem Rosto, do fotojornalista do PÚBLICO Daniel Rocha. Uma oportunidade para se olhar além da estatística.


13 de Maio
Europa

Tão amigos que nós fomos

“Se os continentes têm especialidades, as da Europa parecem ser os sistemas políticos e económicos. A noção de democracia nasceu na Europa, tal como as de capitalismo e comunismo.” Assim começa a explicação de uma enciclopédia geográfica de 1988 para “Europa”. Por estes dias, houve eleições em dois dos seus países: França e Grécia.

Num dicionário enciclopédico de 1992, escreve-se: “Povoada desde o Paleolítico Inferior, as suas condições privilegiadas de habitabilidade desencadearam ondas migratórias das mais diversas raças. As regiões mais a oriente evoluíram mais rapidamente (Creta e Grécia).” Já ninguém parece lembrar-se disso. 

Salto no tempo: “Quando, em 9 de Maio de 1950, propôs à República Federal da Alemanha e aos outros países europeus que quisessem associar-se a criação de uma comunidade de interesses pacíficos, Robert Schuman realizou um acto histórico. Ao estender a mão aos adversários da véspera, não só apagava os rancores da guerra e o peso do passado como desencadeava um processo totalmente novo na ordem das relações internacionais.” Eis o motivo por que 9 de Maio se tornou Dia da Europa (decisão da Cimeira de Milão, em 1985). Informações registadas no site da Representação da Comissão Europeia em Portugal. Aí também se lê: “A União Europeia está atenta aos desejos dos cidadãos e coloca-se ao seu serviço. Conservando a sua especificidade, os seus hábitos e a sua língua, todos os cidadãos se devem sentir em casa na 'pátria europeia', onde podem circular livremente.” Texto a necessitar de revisão.


6 de Maio
Promoção

Preços baixos, publicidade gratuita

“Redução de preços” e “conjunto de técnicas publicitárias utilizadas para fazer vender um produto ou para dar a conhecer um estabelecimento”. Foi preciso folhear quatro dicionários até se chegar a estes sentidos para a palavra “promoção”.

Isto porque o significado mais comum é “acesso ou elevação a cargo de uma categoria superior” e porque os dicionários não conhecem o Pingo Doce. Outra definição: “Grande esforço para conseguir alguma coisa.” Foi o que fizeram centenas de portugueses no 1.º de Maio para conseguirem comprar produtos a metade do preço. Foi também o que fizeram outros tantos para conseguirem vender o que aqueles queriam comprar.

Se “sabe bem pagar tão pouco”, trabalhar assim nem tanto (seja qual for o dia).

Ouviram-se frases como “o Pingo Doce transformou o Dia do Trabalhador no Dia do Consumidor” (Constança Cunha e Sá) e, “em lugar da revolução, a classe média foi ao supermercado” (Manuel Villaverde Cabral).

Também foi lembrado que “o Pingo Doce conseguiu fazer o mesmo que a Apple faz no lançamento de um novo produto. Ou o que os U2 fazem quando colocam bilhetes à venda. A diferença é que para muitos a Apple e os U2 são marcas cool, mas o Pingo Doce não” (Paulo Morais, http://mktmorais.com). E ninguém teve de aparecer nu, como em certas campanhas de vestuário.

Publicidade, portanto.

E gratuita. “Promotor” é alguém “que promove ou excita”. Só se encontrou um exemplo: “Promotor de uma desordem.”


ABRIL


29 de Abril 
Liberdade

Continua a passar por aqui

Registo de um dicionário de 1940: “Condição do homem que pode dispor de si ou que não é propriedade de outrem”; “poder de fazer ou deixar de fazer uma coisa”; “livre arbítrio”. Em Portugal, a liberdade tem só 38 anos. Feitos ainda agora, no dia 25 de Abril. Cada um comemorou-a (ou não) de acordo com a sua vontade. Livremente, portanto.

Definições recentes: “Poder ou direito de agir sem coerção ou impedimento” e “estado de quem não está subjugado ou totalmente dependente de alguém”.

Frases feitas: “Isso seria um atentado à liberdade de cada um” e “a democracia como expressão da liberdade”.

Nem sempre nem nunca.

Liberdades há muitas. As “individuais” são assim descritas: “Garantia que todos os cidadãos têm de não serem impedidos do exercício dos seus direitos, excepto nos casos determinados pela lei.” As poéticas, “uso de figuras e alterações morfológicas e sintáticas em poesia”.

Excerto de um soneto de Bocage: “Liberdade querida e suspirada/ que o despotismo acérrimo condena:/ Liberdade, a meus olhos mais serena/ que o sereno clarão da madrugada (.)” Excerto de um poema de Sérgio Godinho: “Aprende a nadar companheiro/ que a maré se vai levantar/ Que a liberdade está a passar por aqui (.)” Liberdade de imprensa: “Direito de usar os meios de comunicação oral ou escrita, para informar e para expressar as suas posições e opiniões, sem censura prévia ou manipulação alheia.” Só assim faz sentido comunicar com quem está desse lado das páginas.


22 de Abril
Indemnização

O valor do trabalho e da antiguidade

Substantivo feminino que significa “recompensa”, “ressarcimento de dano sofrido” ou “aquilo que se concede ou se consegue para compensação de um prejuízo”. Os dicionários nunca dão o exemplo concreto de “indemnização por despedimento”. Mas foi um assunto que por estes dias ocupou o Governo, que divulgou a decisão de a baixar “para seis a dez dias por cada ano de antiguidade”, contra os actuais 20 a 30 dias. Portugal aproxima-se assim do “valor médio das compensações na União Europeia”. Compensações de despedimento (não de trabalho).

O Ministério da Economia considera a “medida fundamental para tornar o mercado de trabalho mais competitivo”, permitindo “criar mais e melhores postos de trabalho”.

Em termos jurídicos, “indemnização” corresponde a “ressarcimento da perda de um direito adquirido por contrato ou ajuste”, mas também “modo de liquidar a responsabilidade derivada de um facto criminoso”. Não se indica as contas a fazer, nem em dias nem em euros.

Para a forma verbal “indemnizar”, a explicação é “pagar a alguém o valor do dano material ou moral que sofreu”. Sinónimos: “compensar”, “reparar”, “remunerar”.

O dicionário revela-nos ainda o adjectivo e substantivo “indemnizista”, “relativo ao sistema político da indemnização” ou “partidário desse sistema”.

Em português do Brasil, escreve-se “indenização” – cai o “m”. Se caem dias, não sabemos.


15 de Abril
Sorrelfa

Quem a pratica ou é sonso ou astuto

Em desuso na forma, mas não na prática. “À sorrelfa” significa o mesmo que “à socapa”. Se lhe juntarmos “suspensão” e “reforma”, o leitor certamente perceberá do que se está a falar. Se lhe adicionarmos o particípio do verbo “antecipar” (antecipada), então ficará totalmente esclarecido sobre a escolha desta expressão, recuperada pelo jurista Pedro Lomba (PÚBLICO, 10 de Abril): “Podemos ou não achar a reforma antecipada um direito bizantino – eu tenho dificuldade em compreender reformados de 55 anos – mas a verdade é que esse direito existe, foi com ele que as pessoas contavam e, ainda que seja necessário revê-lo, isso não pode ser feito à sorrelfa.” Isto é, “dissimuladamente”, “sorrateiramente”, “com o intuito de enganar”, “sonsice”. O deputado do PS Miguel Laranjeiro usou uma expressão equivalente: “Queremos explicações porque isto foi uma decisão tomada às escondidas, à socapa.” Sinónimos: “dissimulação mansa para iludir ou enganar”, “disfarçadamente”, “com pés de lã”, “pela calada”.

Justificação de Pedro Passos Coelho: “Se o Governo tivesse comunicado com grande antecedência que ia proceder nesse sentido, evidentemente que o objectivo que pretendia seria furado pelo recurso ainda mais intenso a esse mecanismo.” O Presidente da República justificou-se com o habitual “interesse nacional”. Como substantivo e adjectivo, “sorrelfa” quer dizer “pessoa manhosa”, “avarenta”, “mesquinha”. Os brasileiros consideram-na “astuta”. 


8 de Abril
Subsídio

Repor ou não repor o “benefício”?

Do latim, subsidiu, “o que se conserva em baixo, reserva, apoio”. Mas também “vencimento, especialmente de parlamentares”, e “quantia paga pelo Estado, empresa ou instituição, em complemento da remuneração base”. Os dicionários mais recentes registam os exemplos “subsídio de férias” e “de Natal”. Recentes, mas desactualizados, a julgar pelas notícias dos últimos dias que puseram em dúvida a recuperação desse “benefício” nos próximos tempos. Disse o primeiro-ministro: “A reposição dos subsídios de férias e Natal à função pública só acontecerá em 2015 e de forma gradual.” O ministro das Finanças disse algo parecido, mas cometeu “um lapso” com as datas. Já Peter Weiss, da troika, falou mesmo diferente: “Temos de ver se isto [o corte] se tornará numa medida permanente ou não.” Socorro! – sinónimo de “subsídio”.

Há também o registo de “subsídio de alimentação”, entendido como “auxílio ou complemento em dinheiro, abonado a uma companhia para a compra de géneros e condimentos no comércio local ou em cantinas do exército”.

Em meio militar, a palavra significa “forma expressa na lei para tornar menos rigorosa a situação militar e para compensar a situação da família dos indivíduos chamados para o serviço militar e cujo sustento estava exclusivamente a cargo dos mancebos recrutados”.

Existia até o subsídio de marcha, “complemento pago, além do soldo, quando o militar se desloca”. Agora, é ele que marcha. Pelo menos mais três anos.


1 de Abril
Venda

De olhos tapados

“Acto ou efeito de vender”, mas também “acto de alguém se deixar peitar ou subornar”.

São as duas primeiras explicações do dicionário para o substantivo feminino “venda”. Segue-se “entrega de valores contra moeda ou representativo de moeda” e, no Direito, “venda a retro”, que significa “venda com que se reconhece ao vendedor a faculdade de resolver o contrato”.

Nunca se fala em “bancos”, “liquidações superiores a viabilizações”, “contribuintes” ou “catástrofes” (como se ouviu a propósito da venda do BPN ao BIC), mas se nem os dicionários virtuais podem actualizar-se à velocidade dos casos reais, menos ainda os de papel.

“Taberna” e “venda” são a mesma coisa, “mercearia” também. E pode ser ainda “faixa com que se cobrem os olhos”. Neste caso, há sentidos (figurados) interessantes: “cegueira”, “obcecação”. Quando se diz que alguém tem “uma venda nos olhos”, significa que “não percebe o que se passa”. Está “num estado de ignorância”.

A palavra “venda” é de origem germânica, de “binda”, ligadura. Curioso, não? O verbo “vender” oferece-nos diversos significados: “Ceder alguma coisa a alguém mediante certo preço”, mas também “impingir”, “alienar a sua liberdade por um preço” ou “prostituir”. E invoca as expressões “ter para dar e vender”; “vender gato por lebre”; “vender cara a vida” (defendê-la com valentia).

Por fim, um exemplo nostálgico de um dicionário não tão antigo como isso: “Vender uma casa por cem contos.”


MARÇO


25 de Março
Combustível

Reacção em cadeia

“Que arde, que serve de alimento ao fogo” e também “lenha ou qualquer substância com que se faz lume”, registam os dicionários. E informam que tem origem em combusto.

Por estes dias, a palavra andou à solta por aí, associada a outras, como “gasolina”, “gasóleo”, “escândalo”, “barril”, “petróleo”, “sobrevivência”, e motivando várias expressões: “máximos históricos”, “aumento despropositado e incompreensível” (disse o presidente do ACP), “flexibilização da carga fiscal” (disseram os revendedores), “mais eficiência na utilização de energia” (disse o primeiro-ministro).

Deu-se portanto uma reacção em cadeia, que, na Física, até se adequa a “combustível”, já que este significa também “substância cindível que, numa pilha atómica, pode originar uma reacção em cadeia”. Isto é, “uma reacção que se desenvolve por si mesma, porque os agentes necessários à reacção são produzidos pela própria reacção”. Compreendido? Em sentido figurado, pode também querer dizer “causa”, “origem”, “motivo”, “alimento de perturbação”, “tumulto”, “que facilmente se inflama”. Num dicionário mais antigo, regista-se “conflagração moral”. O que também se adequa ao passado recente e ao futuro longínquo.

“Combustão” quer dizer “acto de queimar” e “estado de um corpo que arde, produzindo calor e luz”.

Mas no caso não é preciso muita ciência para se saber quem fica a arder.


18 de Março
Lealdade

Boas e más moedas

“Carácter de uma pessoa ou de uma coisa leal” é o que significa o substantivo feminino “lealdade”. O dicionário dá um exemplo: “A lealdade deve ser a principal qualidade do comerciante.” Não fala em políticos nem em artigos da Constituição, mas remete para legalidade.

Porque o adjectivo “leal” (dois géneros) tem origem na palavra latina legalis – “conforme com a lei”, “legal”.

Longe viria o artigo 201 que o Presidente da República invocou no início da semana para justificar a acusação a José Sócrates de falta de “lealdade institucional”. Que é o mesmo que dizer “deslealdade” e “hipocrisia” (antónimos de “lealdade”).

Quem é “leal” é “digno”, “honesto”, “direito”, “sincero”, “fiel”, “probo”, “franco”. Por extensão, “é de boa qualidade, não é falsificado”. Exemplo: “Criado leal.” Há outro significado para a mesma palavra, mas já enquanto substantivo comum, “moeda antiga de prata que na Índia Portuguesa valia 12 réis”. Ou “moeda de boa lei nos reinados de D. João I e de D. Duarte”. Nessa altura, só valia dez réis. Diz-se de “boa lei” por “oposição aos reais de ligas muito baixas do reinado anterior”.

E vem à memória uma citação mais antiga (2004) de Cavaco Silva: “A má moeda expulsa a boa moeda.” Lei de Gresham, que o social-democrata transpôs para a vida partidária. Mas aí o alvo era outro ex-primeiro-ministro: Pedro Santana Lopes. Que a meio da semana comentou o assunto e lá lhe pagou da mesma moeda. Quanto valerá hoje um “leal”?


11 de Março
Fundos

Ora mandas tu ora mando eu

“Papéis de crédito garantidos oficialmente”, diz um dicionário. “Quantia mais ou menos considerável para qualquer fim”, diz outro.

“Concentração de recursos de várias procedências para, mediante financiamentos, se promover a consolidação ou o desenvolvimento de sector deficitário da actividade pública ou privada”, descreve outro ainda. É este último registo que está mais próximo dos “fundos” que protagonizaram a semana - os que nos chegam do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).

Avaliados em 5800 milhões de euros, estariam prestes a mudar de tutela – de Álvaro Santos Pereira (Economia) para Vítor Gaspar (Finanças). E logo se recuperou entre os comentadores a expressão “tiro ao Álvaro”. Mas, no “fundo” (que significa “intrinsecamente”), não havia “compita” entre os ministros. Nada de “ora agora mandas tu, ora agora mando eu”. Aparentemente, tudo se resolveu com uma nova expressão no léxico governativo: “comissão chapéu”. Sete ministérios vão definir o rumo e a prioridade das verbas provenientes de fundos comunitários e extracomunitários. Quem segura no “chapéu” é Vítor Gaspar, o coordenador. Das Finanças.

Um dicionário de origem brasileira contempla a expressão “marchar a um de fundo”. Significado: “Marchar, um após outro, em cordão, numa fila só.” Sem atropelos. Em 1940, o registo para “fundos” (substantivo masculino plural) resumia-se a “capital, haveres”. Faltavam cinco anos para ser criado o FMI.


4 de Março
Exame

Substantivo masculino (do latim examen) que significa “prova a que alguém é submetido, para se verificar se está ou não habilitado a exercer um cargo, a obter um diploma”. Ou a receber dinheiro. Isto é, mais uma tranche. “Exame” também quer dizer “pesquisa para verificar uma coisa, para dela ficar ciente” mas também “inspecção” ou “interrogatório”. Um “examinador” é “aquele que examina”; já um “examinando” é “uma pessoa que se prepara para exame”. Uma pessoa ou um país. O dicionário regista a frase: “O examinando estava nervoso porque temia ser interrogado sobre assuntos que não dominava.” Ao que “sofreu exame” chama-se “examinado”. “Sofreu” parece apropriado. Há exames médicos, de consciência, da escola e da troika. Outra frase registada: “Examine como eles trabalham bem!” No Brasil, descreve o dicionário Aurélio, há um “exame final de todas as disciplinas dum curso secundário, exigido como preparatório para cursos superiores”. Tem o expressivo nome “exame de madureza”.


FEVEREIRO


26 de Fevereiro
Samba

Diz um dicionário de 1940 que “samba” é um “bailado popular” e uma “dança de negros”. Os mais recentes registam este substantivo masculino como “dança brasileira de origem africana, de compasso binário e ritmo sincopado”.

Alguns acrescentam que é “mais dinâmica que a rumba”.

E há um que especifica a origem da palavra como proveniente do quimbundo, “semba” – “umbigada”. Por estes dias, escutou-se e dançou-se o samba, porque o calendário assinalou o Carnaval. Com mais ou menos tolerância, dependendo da latitude. No Brasil, “samba” também significa “conflito em que se envolvem várias pessoas”.

Já o verbo intransitivo “sambar” tem dois significados: “dançar o samba” e “frequentar os bailes”.

Um “sambista” ou “sambador” tanto pode ser um “exímio dançarino” como um “compositor de samba”. Na versão angolana, “sambar” é o mesmo que “furtar com rapidez”. Também existe a palavra “sambear”. Para Chico Buarque, “menino quando morre vira anjo; mulher vira uma flor no céu; malandro quando morre vira samba”. 


12 de Fevereiro
Piegas

Substantivo de dois géneros e também adjectivo de origem popular. Foi mesmo a propósito do povo que a palavra saltou para a comunicação social. Pela voz do primeiro-ministro.

Enquanto substantivo, regista-se como “indivíduo ridiculamente sensível” e “aquele que se atrapalha com pequenas coisas”.

Como adjectivo, “chorão” e “que se assusta com facilidade”.

Num dicionário brasileiro, “diz-se de quem se embaraça com bagatelas”. Significado de “pieguice” ou “pieguismo”: “sentimentalidade excessiva ou afectada”, “niquice”, “lamechice”. No Alentejo, há o termo “pieguento”, que quer dizer “embirrante”, “impertinente”, “quezilento”.

“Piegueiro” é uma expressão usada no Brasil e significa “meigo”, “muito dócil”, “que faz carícias como uma criança”.

O dicionário de sinónimos dá-nos mais estes significados para “piegas”: “atoleimado”, “delicodoce”, “efeminado”, “mimalho”, “papalvo”, “tetas”. E mais estes para “pieguice”: “louvaminha”, “toleima”. Mas os sentidos mais inesperados (e certamente desconhecidos por Passos Coelho) fomos encontrá-los na gíria: “chulo”; “o membro viril”; “pénis”.


5 de Fevereiro
Seca

“Falta de chuva” é o sentido que se impõe por estes dias em Portugal. Ou “período extenso em que não chove” e “estiagem”. No entanto, o primeiro significado que os dicionários registam para o substantivo feminino “seca” é “acto ou efeito de secar ou enxugar”. Em sentido figurado, surge como “importunação”; “maçada”. Exemplos expressivos de frases: “O discurso foi uma seca medonha.” Todos já assistimos a alguns. Outro, muito usado por jovens perante uma contrariedade: “Que seca!” Mais um, para quem conhece pelo menos uma “pessoa maçadora” ou “impertinente”: “Um seca insuportável.” Também há a expressão “correr Seca e Meca”, que quer dizer “viajar por muitos países”. Se a viagem for até ao Brasil, pode encontrar dois significados. Em Ceará, “Inverno longo e rigoroso”; em Minas Gerais, “cerimónia” e “luxo”.

Já a versão masculina da palavra, “seco”, surge com sentidos esperados. “Privado de água ou de humidade”; “enxuto”, “árido” e “murcho”. Expressão actual: “Engolir em seco.” Calar-se.

 
JANEIRO


29 de Janeiro
Pensão

Substantivo feminino, cujo primeiro significado registado é: “Renda que se paga vitaliciamente ou por determinado tempo a alguém, como recompensa de serviços.” Não diz onde, mas sugerimos alguns exemplos: numa universidade, numa fundação, num banco. “Pensão” também quer dizer “casa de hóspedes”; “hospedaria”. Muitas vezes em regime de “pensão completa”. Isto é, “tudo incluído”. Para os lados de Belém, em Lisboa, há uma quase deste género, que contempla alojamento, alimentação, Transporte, secretariado e várias assessorias. Mas os hóspedes dizem estar com dificuldades em pagar as despesas. Não se sabe quais, e é feio perguntar. Nos últimos dias, “pensão” rimou com “petição”, “indignação” e “demissão”. “Incómodo” é o último sinónimo que os dicionários registam. Pelo meio, aparece “obrigação” e “trabalho”. A origem de “pensão” é latina – pensione traduz-se por “pagamento”. Como depende de muitas variáveis, os dicionários não desenvolvem o assunto.


22 de Janeiro
Concertação

“Acto ou efeito de concertar.” Embora seja um substantivo feminino, é normalmente protagonizado no masculino. Sobretudo quando se trata de “concertação social”, tema central dos últimos dias. Mais fácil de encontrar é a forma verbal “concertar”. E o seu significado é tão pacífico que nem parece deste mundo. No modo transitivo, quer dizer “harmonizar vozes ou sons musicais”, “conciliar”. No intransitivo, “concordar”. No reflexo, “ajustar-se”. Há um dicionário que dá um exemplo muito expressivo (se pensarmos ao contrário da actualidade): “Concertaram a maneira de sair daqueles apuros.” Ou “entraram em combinações”. Mas isso, se mal esclarecido, pode levar a processo no tribunal. Que o digam os dirigentes sindicais “desconcertados”. Uma conclusão se pode tirar desta breve pesquisa, “concertar” terá sempre que ver com música.

E, se qualquer diapasão emite o som Lá, certamente que o concerto em Portugal também teve uma audiência “lá”. Nos camarotes da Europa. Com aplausos.


15 de Janeiro
Maçonaria

Nome feminino, de origem francesa (maçonnerie), que significa “sociedade secreta cuja doutrina tem como rótulo a fraternidade e a filantropia universais”. Bonito. “... e que usa como símbolo os instrumentos do pedreiro e do arquitecto (o triângulo e o compasso).” Versão mais recente: “Sociedade secreta, herdeira da tradição corporativa medieval e dos ideais iluministas, com rituais de iniciação e fins económico-sociais e humanitários de inspiração liberal.” Na frase exemplificativa deste último dicionário, há um parêntesis: “A Maçonaria tem membros e organizações (lojas) espalhadas pelo mundo.” Em mais nenhum se encontrou “loja”. Embora nos vamos “familiarizando” com a designação Grande Loja Regular de Portugal. Num registo de origem brasileira, remete-se para tempos antigos, em que “maçonaria” significava apenas “arte ou obra de pedreiro”. No sentido popular, aplica-se como “combinação ou entendimento secreto entre duas ou mais pessoas”. Nada se revela sobre o âmbito da “combinação” entre os “elementos juramentados”.

Nem sobre aventais.


8 Janeiro de 2012
Deslocalização

Substantivo feminino, apenas registado nos dicionários mais recentes, que remetem logo para “economia”. E explicam: “Deslocação estratégica das actividades de uma empresa de um lugar para outro com o fim de obter ganhos através dos custos de produção.” Noutra versão: “Mudança de localização de um centro de produção de um país ou de uma região para um outro país ou região, com o objectivo de procurar custos de produção mais baixos.” Não se fala de fiscalidade ou transferência de capitais para subsidiárias. O exemplo mais concreto vem de um dicionário online, que, perante o verbo transitivo “deslocalizar”, sugere: “A multinacional deslocalizou a fábrica.” Mas não é exactamente esse o significado que se atribuiu aos movimentos de sociedades portuguesas (do PSI-20) para a Holanda. Protagonista: Jerónimo Martins. Motivos: “Isenção da tributação de dividendos, taxas mais baixas e estabilidade fiscal.” Os dicionários científicos contemplam “deslocalização electrónica”, que significa que os “electrões de uma molécula não estão associados a um único átomo”, ou seja, “incluem-se numa orbital que se estende ao longo de vários átomos adjacentes”. E provavelmente “alimentam-se” de todos eles. Mas não queremos “deslocalizar” o assunto.
 
 
 
 
 

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