"Vítor Gaspar, não exagere" na austeridade, pede Paul De Grauwe
O economista belga colocou em causa a postura dos países do Norte da Europa e alertou o Governo português para a possibilidade de estar a dirigir o país para a insolvência com o esgotamento da política de austeridade.
O economista belga, que falava na conferência "Portugal em Mudança", que celebra os 50 anos do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, centrou grande parte da sua argumentação na perspectiva de que os países do Norte da Europa estão a fugir às suas responsabilidades, crítica que lhe custou uma disputa com o embaixador alemão em Portugal, Helmut Elfenkämper.
Apesar de Vítor Gaspar ser "um bom amigo" de Paul De Grauwe, como este último fez questão de referir, o economista belga fez também questão de fazer referência à linha de acção do Governo: "Vítor Gaspar, não exagere".
"O Governo português pode estar a levar o rumo da austeridade demasiado longe e a puxar a economia portuguesa para uma espiral recessiva. Não vai conseguir curar o défice orçamental e reestruturar a dívida pública assim", disse Paul De Grauwe, afirmando ainda que o esgotamento desta via já mostrou várias vezes que pode levar os países em reestruturação para a insolvência.
O economista reconhece que não existe uma grande liberdade na contestação às metas para a reestruturação orçamental dos países do Sul, mas, alertou, isto não deve significar que os países deixem de pedir uma redução da austeridade. Para Paul De Grauwe, "há uma opção de reduzir a austeridade".
Paul de Grauwe defendeu que os países do Norte da Europa devem apoiar a reestruturação económica dos países recessivos do Sul, a braços com um crescimento da dívida soberana que, disse, é também fruto das políticas de austeridade que são impostas pelos parceiros europeus: "Os países do Norte não querem estimular a economia", afirmou o economista belga, em referência ao receio de fraco crescimento que a Alemanha, por exemplo, tem vindo a mostrar.
O professor da London School of Economics apelou a uma partilha das responsabilidades na retoma económica da zona euro, afirmando que à medida que os países do Sul assumem políticas de austeridade que impedem o seu crescimento económico, os países do Norte deveriam acompanhar este esforço "com investimento económico". "Mas não, estes países querem manter os seus excedentes económicos", acusou Paul De Grauwe.
A este argumento, Paul De Grauwe juntou outra crítica: o Banco Central Europeu (BCE) está a agir "tanto como polícia como bombeiro da Europa", o que, defendeu, lhe retira independência na sua linha de acção. Como exemplo, o economista utilizou a ambiguidade da posição do BCE enquanto rede de segurança do sistema financeiro – que agora quer assumir com o anunciado programa de compra ilimitada de dívida – e enquanto "moralizador" da situação dos países que encabeçam a crise da dívida externa europeia, ao apelar à adopção de medidas de austeridade para a retoma do crescimento. "É horrível que o BCE faça parte da troika", disse, reforçando esta postura com a metáfora de um bombeiro que deixa as casas arder – leia-se, países com uma austeridade consumidora – para que "o dono da casa receba um castigo".
Na fase reservada às questões do público, ergueu-se das cadeiras do segundo auditório da Fundação Calouste Gulbenkian Helmut Elfenkämper. "Tenho a dizer-lhe que não gosto da sua metáfora do bombeiro", afirmou o embaixador alemão em Portugal. "A Alemanha não pode investir mais dinheiro sem o risco de criar bolhas económicas", atirou o diplomata em resposta à acusação de Paul De Grauwe, que colocou várias vezes em causa o facto de os países do Norte, particularmente a Alemanha, estarem a aplicar medidas de austeridade desnecessárias, arrastando a economia da zona euro para uma dupla recessão. A isto, Paul De Grauwe ripostou: "Está a dizer-me que não existem investimentos na Alemanha [que não apresentem riscos de bolhas económicas]? Olhe à sua volta. Parece-me que há um problema de imaginação na Alemanha", disse.