Eva Oliveira viaja, de três em três meses, entre a Alemanha — onde o P3 a encontrou — e a Palestina, devido ao seu mestrado, dedicado à identidade dos palestinianos que vivem em Israel. Sobre a adaptação, afirma sentir-se “mais em casa na Palestina do que na Alemanha”. Para além da sua língua materna, fala castelhano, francês, italiano, inglês, alemão, árabe e está a tentar aprender hebraico.
Como vive uma portuguesa na Palestina?
Sinto-me mais em casa na Palestina do que na Alemanha. Culturalmente, há muitas afinidades com Portugal. O intenso convívio entre familiares é um exemplo disso.
E como mulher, sentiste dificuldades na adaptação a uma sociedade árabe?
As mulheres não são ostracizadas como se pensa no Ocidente. Muitas das tarefas ficam a cargo dos homens.
Tens muita preocupação com o que vestes?
Tento não usar roupas que deixem os ombros ou os joelhos descobertos. À excepção desse aspecto, posso vestir-me como quiser. As palestinianas cristãs, por exemplo, vestem-se de forma liberal, pelo que é possível encontrar todos os estilos de roupa. E tenho uma vantagem: muitas pessoas pensam que sou uma palestiniana refugiada, pela minha aparência e pelo meu árabe imperfeito. Se tivesse um ar mais “nórdico”, a minha presença seria muito mais notada.
Como encaras a questão do véu?
Muitas mulheres sentem-se “despidas”, sem o véu. Outras não o usam. Quanto mais alta a classe social, menor o número de mulheres a usar o véu. Em algumas zonas rurais, há mais conservadorismo, nos hábitos, mas isso é como em Portugal. Esta é a realidade palestiniana. Na Arábia Saudita, por exemplo, é diferente.
Porquê a Palestina?
Quando estive na Síria, tive um professor de Árabe que era refugiado palestiniano. Vivia num quarto com os pais e oito irmãos e, enquanto contava a sua história, chorou. Nas sociedades árabes, o choro, num homem, é altamente reprimido. Para além deste episódio, outros, em que fui conhecendo palestinianos e fui explorando bibliografia sobre o assunto, despertaram a minha curiosidade sobre o tema.
Qual é o tema da tua tese?
Em palavras simples, tem a ver com a identidade nos palestinianos que vivem em Israel. Pouca gente sabe, mas 20% da população israelita é palestiniana. Quando o Estado de Israel foi fundado, 800 mil palestinianos tornaram-se refugiados, enquanto que 600 mil ficaram em Israel e foram registados como israelitas. Nesta faixa da população, há uma crise de identidade: muitos não sabem se são palestinianos, israelitas ou “árabes”, como são denominados pelo Estado. A coexistência com base na igualdade de direitos, entre comunidades, é impossível porque as leis chegam a ser racistas.
Como encaras o problema israelo-palestiniano?
Duvido que vá acontecer algo de extraordinário porque o povo palestiniano está cansado e resignado com a situação. Para além disso, não está organizado e a classe política que o representa não defende os seus interesses junto de Israel.
Como vives a situação de Portugal, a partir da Alemanha?
Estou muito preocupada e não sinto que os portugueses sejam capazes de colocar as diferenças ideológicas de parte para lutarem pelo bem comum. Na Alemanha, está muito enraizada a ideia de que os portugueses e os gregos viveram uma festa paga pelo contribuinte alemão. Houve um alemão que chegou a escrever-me, dando conta da sua revolta por “ter que pagar a festa dos portugueses e dos gregos”.
Como vês o teu futuro?
Pretendo fazer um doutoramento, pelo que antevejo mais cinco anos a viajar. Sou uma verdadeira nómada: quando estou num lugar, sinto saudades dos outros lugares e das pessoas que lá deixei.