Ansiedade académica: quando a emoção vence a razão
Borboletas no estômago, vontade de correr para a casa de banho, pensamento constante: “Eu não vou conseguir, eu não vou conseguir”. Tremuras e um exame na frente. Resultado: mesmo depois de muito estudo a ansiedade provoca-nos uma “branca”
Uma experiência pela qual muitos estudantes já passaram e muitos estarão a passar. A verdade é que a ansiedade disfuncional, nos termos da psicologia, nos faz ver tudo a preto.
Sofia Fonseca, psicóloga da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), explica ao Ciência 2.0 que há uma confusão entre os conceitos de ansiedade e stress. A ansiedade é a forma como reagimos a estímulos, quando nos encontramos, por exemplo, em situações de ameaça, e o stress corresponde a situações externas às quais temos dificuldade em dar resposta. Mas a ansiedade traduz-se numa curva. Se por um lado é positivo estarmos ansiosos e despertos para uma determinada acção — uma ansiedade estimulante — por outro ela pode ser negativa e causar problemas — uma ansiedade disfuncional.
“A ansiedade pode desenvolver-se a diferentes níveis: emocional, cognitivo, comportamental e corporal”, salienta a especialista. O medo é um dos sinais emocionais para a ansiedade, ao passo que, a nível cognitivo, existe um pensamento ruminante, no qual não se consegue deixar de pensar no mesmo assunto e só se vê o lado negativo. As dificuldades de concentração são também uma das consequências deste problema.
Quando ela existe, "o corpo é que paga"
A ansiedade académica, em particular, tem despertado a atenção de vários estudos em Portugal. Este exemplo de ansiedade repercute-se, em específico, em contexto de Ensino Superior. Por um lado, temos o ingresso numa nova vida e realidade que implica algumas vezes um afastamento do lar, da família e dos amigos. A agravar ainda mais pode juntar-se um contexto de crise económica, já que se conhecem casos de alunos sem dinheiro para pagar as propinas.
Por outro, há uma mudança de regime de avaliação e de exigência, há diferenças na relação com os professores e situações de competitividade entre colegas. E qual a resposta dada nestas e noutras situações? De acordo com a psicóloga, existe a fuga e, para além disso, o “evitamento e a procrastinação (adiar algo) quando não se quer enfrentar uma determinada situação, como um exame”. Nestes casos, há também a procura de pessoas de referência para conferir a quem sofre de ansiedade uma sensação de segurança.
Em termos de resposta mais disfuncional, regista-se ainda o recurso ao consumo de álcool e de drogas. Sobre este aspecto, saiu recentemente um estudo que aponta para um elevado consumo de substâncias psicotrópicas por parte dos alunos universitários do Porto, devido a situações de ansiedade. A nível corporal, quem experimenta uma ansiedade disfuncional, pode sofrer de “náuseas, tensão muscular, boca seca, aceleramento do ritmo cardíaco, falta de ar, tremuras e de desconforto gastrointestinal”, salienta a especialista. Estes casos podem existir antes de um exame ou de uma apresentação oral. “Há investigação que nos mostra que os exames e as apresentações orais são dos factores de ansiedade que mais afectam os estudantes”, aponta.
Aprender a controlar a ansiedade
“A pensar nesses casos, a FPCEUP está a realizar um 'workshop' com o objectivo de ajudar os alunos a ultrapassar e a lidar com estas situações”, conta Sofia Fonseca. O objectivo, neste grupo de intervenção que começou no dia 17 de Outubro, será trabalhar a ansiedade académica e ensinar formas de controlar a ansiedade.
A iniciativa está aberta a toda a comunidade académica. Um facto curioso é que, quer neste curso, quer em consultas de Psicologia, os estudantes desta área, especificamente da FPCEUP, são os que menos recorrem a este serviço, garante a psicóloga. "Na teoria têm mais conhecimentos para lidar com a sua própria ansiedade, na prática não significa que os consigam implementar", explica.
"Têm uma reserva grande em procurar ajuda", acrescenta. Para combater a ansiedade existem várias medidas, como por exemplo, aprender a respirar, a trabalhar o pensamento, mudando a forma de pensar e técnicas de relaxamento. “Às vezes, os estudantes conseguem perceber mais facilmente exercícios cognitivos de elevada dificuldade e não conseguem lidar com a parte emocional. Emocionalmente os estudantes não conseguem ser tão competentes como cognitivamente. Aprender como gerir as nossas emoções é fundamental”, termina Sofia Fonseca.