Emigrar não é mau, precisar de emigrar sim

Partilharam salas de aulas da mesma faculdade, trabalharam em Portugal, mas decidiram emigrar. Maria Peixoto e Rui Alves estão no Brasil, Nuno Félix na Colômbia. São engenheiros civis e para eles Portugal não chegou

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Nuno Félix já esteve em Espanha e no Brasil. No início do ano foi para a Colômbia DR

Fazer uma carreira internacional sempre foi o objectivo de Nuno Félix. O programa Erasmus, que o levou seis meses para Paris, foi o primeiro passo para perceber que o futuro estava lá fora: “Gostei tanto da experiência que soube que era por esse caminho internacional que tinha de ir”.

Rui Alves percebeu-o quando entrou no mercado de trabalho (“desde o início que senti que aí não ia a lugar nenhum”), Maria Peixoto despediu-se e foi para Curitiba, no Brasil, à aventura (“estava numa situação relativamente estável, mas senti que não podia chegar muito longe”).

O problema nem foi a dificuldade em arranjar emprego em Portugal. Todos o conseguiram mal terminaram a licenciatura em engenharia civil, na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), antes de 2008 e de a crise se instalar por completo no sector. O problema era olhar para a frente e não ver futuro.

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Rui Alves está em Curitiba, no Brasil, desde 2010 DR

Sem perspectivas

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Maria Peixoto foi para o Brasil à aventura DR

“Em Portugal, as pessoas trabalham bem, têm brio profissional, mas os salários são muito baixos. Às vezes achamos que é um mito urbano, mas quando saímos sentimos que somos mesmo muito mal pagos e que as nossas perspectivas de vida são muito curtas”, disse ao P3 Rui Alves, a partir de Curitiba.

A filial da empresa onde trabalhava em Portugal - que o levou para Curitiba em 2010 - fechou entretanto. Até ao final deste mês, Rui Alves está a trabalhar como consultor imobiliário. Depois vai tentar voltar ao ramo da construção, mas com a consciência de que o "boom" do mercado brasileiro não torna a tarefa especialmente simples.

Quem já o comprovou foi a namorada, Maria Peixoto, quando decidiu ir para Curitiba e esbarrou em sete meses de procura até conseguir um emprego na sua área – fez uma pós-graduação e trabalhou no mercado imobiliário até conseguir um lugar na empresa em que está actualmente.

O problema que os engenheiros civis enfrentam no Brasil não se prende apenas com o visto, barreira que todos os profissionais encontram. O CREA – entidade correspondente à Ordem dos Engenheiros de Portugal – demora, “em média, dois anos para validar o diploma” português.

A barreira burocrática do Brasil

“Toda a burocracia associada ao processo de contratar um português é uma responsabilidade que muitas empresas não querem assumir”, lamenta Maria Peixoto. Mas, vencida essa barreira, lembra Rui Alves, “os cérebros portugueses, concorrendo em igualdade de circunstância com quaisquer outras pessoas, conseguem aceder a bons cargos”.

A avaliação de Nuno Félix é semelhante. Por isso, fala da emigração como “um passo lógico”: “Qualquer experiência internacional, curta ou longa, é muito positiva”. Emigrar não os entristece, a “necessidade de emigrar” sim, ressalva Rui Alves. “O futuro dos profissionais da construção portugueses passa pela emigração. E a experiência é boa. O que é triste é o facto de ser a única saída”, completa Maria Peixoto. 

A Federação Portuguesa da Indústria da Construção e Obras Públicas anunciou ontem, terça-feira, que o ano de 2011 foi o “pior registo de que há memória”, com quebras de produção na ordem dos 9,4%. Em Novembro, o Instituto de Emprego e Formação Profissional revelava um número assustador: cerca de 78 mil desempregados no sector, o que significa mais nove mil pessoas no espaço de um ano. 

Mesmo para os que conseguem emprego em Portugal, Rui Alves não antevê um futuro brilhante. “Ouço colegas que vão a entrevistas de trabalho e a quem são propostos 800 euros. Como é possível construir alguma coisa? Como se consegue segurar pessoas com capacidade intelectual com salários destes? Será que é só por causa da crise ou já acontecia antes?”, questiona o jovem engenheiro. 

“A gente emigra, provamos o que existe deste lado e a vontade de regressar é muito pequena”, assume Rui Alves. Maria acrescenta: “Temos vontade de voltar, sabemos que a emigração é uma experiência por tempo determinado, mas não chega ter vontade, temos de sentir que existem perspectivas”. 

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